dezembro 29, 2006

Chegámos ao fim da canção...

Este foi um ano incrível e em que, pela primeira vez, os momentos bons superaram em muito os momentos maus ou péssimos. Houve um salto profissional (pequeno, é certo, mas depois disso vem o Mundo), houve uma casa nova a que hoje já chamo minha e tanta gente nova a cruzar-me o caminho. A febre de deixar Portugal acalmou, pequenas coisas começaram a fazer sentido e foi um bom ano em termos de crescimento pessoal. Se este ano que aí vem me trouxer tantas surpresas, então vai valer a pena de certeza não ter medo de avançar.

Há uns anos atrás, numa viagem a propósito da passagem de ano, deixaram-me uma marca. Um amigo lançou para o ar que devemos deixar para trás tudo o que não nos deixa feliz e fazê-lo, por exemplo, de uma forma simbólica: apagando todas as mensagens que temos no telefone. Porque, eu não sei vocês, mas a mim dá-me sempre uma nostalgia estúpida quando tento apagar alguma. Como se o não apagar pudesse trazer aquele momento exacto de volta. Como se se pudesse sentir a mesma coisa de maneira totalmente idêntica e repetir a sensação uma e outra vez, até a mensagem esgotar o seu sentido. Desde aí limpo a minha caixa de entrada e também a minha caixa de saída, garantindo que não levo passado para o ano que vem aí. E mais uma vez vou apagar tudo, a custo, eu sei. Tudo o que tiver que ser guardado ficará apenas na memória, onde só eu posso vasculhar e onde posso calma ou atabalhoadamente guardar as recordações.

Portanto, entrarei no novo ano como uma folha em branco, como se estivesse num qualquer estádio de inocência ou de castidade. Estou pronta a reescrever tudo, rasurar, rabiscar, rascunhar ou escrever a tinta permanente. E é esta receptividade e disponibilidade para o futuro que desejo a todos. Um Feliz Ano de 2007, em branco, com o caderno meio cheio ou com o caderno escrito até ao fim. Quero ser e desejo que sejam felizes!

dezembro 28, 2006

Casa (fazemos de conta)




Às vezes esqueço-me de como é bom voltar.

(Combinar tudo à pressa. Sair para as noites geladas sem saber muito bem onde aterrar. Lanchar na véspera de Natal, perto da fonte. Falar de coisas sérias como quem está a brincar. Não falar do que se deve falar. Chegar a casa a cheirar ao fumo dos vossos cigarros. Sair só porque sim. Enfiar-me na cama às cinco da manhã de uma terça-feira. Entrar em todas as capelinhas para tentar fingir que ainda não são horas. Levar a casa os que precisam. Deixar para trás o que ainda se aguentam. Escrever um pedaço de música popular. Descansar e distrair a minha cabeça nesse vosso ombro colectivo. Se não voltarmos hoje, voltaremos amanhã.)

Fotos autoria [T]

dezembro 24, 2006

Season Greetings



As manas Maurícias desejam a todos um Natal muito feliz. Façam o favor de serem felizes, onde, como ou com quem for. E nada de abusar nos Mon Cherri (blhearc!) ou nos Ferrero Rocher (blhearc!).

dezembro 22, 2006




Hoje ainda não tinha anoitecido completamente quando atravessei o Jardim da Estrela. Como sempre, e quando cheguei ao portão de saída, fiquei esmagada pela Basílica: estas dimensões sempre me impressionaram um bocado. É um medo assim irreal e inexplicável que sinto destas obras em tamanho XXL, como o são também os eólitos espalhados por aí e dos quais sinto mesmo terror.Enquanto caminhava às escuras pelo jardim ocorreu-me que ontem foi o dia do Solstício de Inverno, o que me alegrou - os dias começam a partir de ontem a ser mais compridos, a noite chega sempre mais tarde. E ia jurar que hoje mesmo já se sentia a diferença.


No capítulo obrigatório do Natal as coisas estão quase encerradas. Todo este stress, esta profusão de luzes pelas ruas, Pais Natais a trepar na janela (OK, enforcar o Pai Natal afinal tinha piada, tinhas razão), concursos de Natal, prendas singelas e menos singelas, bolos em doses industriais e proibidas, zangas com quem mais gosto (sempre obrigatórias e ainda longe de terminar porque a noite da Consoada ainda vai longe...) esgotaram parte do meu (pouquíssimo) espírito de Natal. Salvam-se as coisas que fazemos com as nossas mãos e que esperamos sejam apreciadas, as coisas que vamos podendo retribuir (sempre em quantidade insuficiente), os desejos de quem não dizia uma palavra há muito. Se estes 4/5 dias que vou passar a casa não me trouxerem paz de espírito, então não sei o que mais vai consegui-lo. E se eu já normalmente não me sinto embuída deste fenómeno festivo, sem um bocadinho de descanso as coisas pioram - e solta-se, quem sabe, a psicopata em potência que existe em mim. Portanto, vamos lá a acalmar todos: esta jovem precisa de tempo para não fazer nada e para não pensar em ninguém - a não ser eu.


E depois as horas não passam. Este é o quarto fim de semana consecutivo em Lisboa e isso não está de forma nenhuma a contribuir positivamente para este princípio de neurose. Lembro-me quando estava em Berlim e uma semana antes do Natal me sentia a sufocar e só pensava em sair de casa a correr, tropeçar na neve, mergulhar no Spree mas correr até Portugal. Num só fôlego. E como sentia que a cidade que também amava me tinha estendido uma jaula à volta e me obrigava a amá-la ainda mais, esgotando-me e sugando-me o amor que lhe tinha. Lembro-me do suspiro gigante que dei quando aterrei na Portela e como tinha desejo de absorver tudo de novo, tudo outra vez. Agora são só duzentos quilómetros que me separam de Casa e a sensação é semelhante. Porque a minha Casa também me desinquieta: matava-me se lá ficasse sempre mas é um pedaço meu sempre que lá não estou.


Por isso, com Natal ou sem ele, lá vou de viagem, de malas e presentes às costas, montada em 57 cavalos que amanhã vou chamar de renas. E não sei vocês mas depois deste texto todo carregado de ansiedade eu exijo que seja Natal. Uff.

(Hoje o espírito de Natal vai resumir-se a umas cervejas e um concerto dos X-Wife. Pode ser que amanhã o Pai Natal me consiga acordar a tempo para trabalhar.)

dezembro 20, 2006

A sabedoria popular é uma coisa muito bonita e muito acertada também. E eu gosto dela, porque normalmente não me deixa ficar mal. Desta vez, o provérbio que se materializou perante mim foi o brilhante 'Não há duas sem três.' ou, numa versão que prefiro, 'À terceira canta o galo'.

Há por aí quem diga que o Universo é um tipo que conspira baixinho e parece-me que desta vez, e para variar um bocado, se virou contra mim. Mas, da mesma maneira que me tira, este Universo também me dá. E eu já começo a achar que isto é tudo menos coincidência. Depois de A Naifa e dos Yo La Tengo, aqui a yours truly vai hoje pisar mais uma vez o território do Santiago Alquimista para poder (re)ver o delicado e contundente JP Simões. Portanto, temos que

Amargo de boca + Decisão errada= Bilhete para concerto

que, apesar de ser uma fórmula compensadora, já começa a irritar um bocadinho. Não, eu não sou pobre e mal agradecida: gostava era de acertar mais e ouvir menos. Em todo o caso, um abraço ao pessoal da Radar, que já deve achar que nós não fazemos mái'nada senão telefonar para eles. E vivam os bilhetes totalmente grátes: não resolvem embrulhadas mas sempre afagam o ego.

dezembro 18, 2006

E porque eu quero o vosso bem, amigos leitores...


... aqui deixo uma coisa que todos deviam experimentar: o Galão Alentejano da minha terra! Não só o leite é de primeiríssima qualidade mas estão também a promover o desenvolvimento do interior esquecido e ostracizado. A sério... Quem teve esta ideia de galão de levar para casa merece o meu mais sincero bem-haja. Gosto de pessoas com ideias.

dezembro 17, 2006

Estou sentada na minha cadeira cor de rosa, a tentar preparar o que falta do presépio que idealizámos para o trabalho. Desta vez tive sorte e fiquei com a tarefa que mais me agradava: colorir as figuras, já devidamente montadas com as nossas caras. E tive ainda mais sorte porque era exactamente o que precisava nesta altura: uns momentos sem pensar em mais nada, só a combinar as cores e tentar não ultrapassar os contornos. Porque às vezes as coisas nos saem fora do alcance e porque é tudo muito mais complicado na vida real, é bom apenas pintar. Sem mais nada, só ficar a olhar atentamente para as cores de que dispomos, conferir se o lápis está devidamente afiado, ter a certeza que não vamos borrar isto como borramos realmente tudo o resto. E vejam se não tive mesmo sorte: a mim foi destinado o papel de Anjo. Mas, francamente, não há nada de que me sinta mais distante neste momento. Mas como o espírito de Natal não se compadece da minha realidade, vou ficar agradecida e pintar tudo com muito muito cuidado - todo o cuidado que dispenso em tudo o resto.



dezembro 14, 2006

É Natal no restaurante Sevilhana e essas coisas assim.



Eu e o chefinho. O chefinho não aguenta o flash que as máquinas modernas disparam e vai daí, deixa-se estar de olho fechado para não se chatear. É a pessoa com quem mais me lembro de discutir (saudavelmente, entenda-se). Não há quase nenhum assunto em que não discordemos: a higiene dos restaurantes chineses, o democracia (!) em Cuba, a actividade física ou as letras dos Moonspell. Mesmo assim, damo-nos muito bem. Menos quando ele me arrasta para bares góticos decadentes ou para bares em que o heavy metal toca muito acima dos decibéis que os meus ouvidos aguentam.

Faço um brinde. Comigo brinda a malta da pesada. Esta é a malta com quem ganho bilhetes para concertos, a malta com quem se pode beber duas imperiais e dar outros tantos dedos de conversa, a malta que quer fazer compras e ir ginasticar e ver filmes exclusivamente para mulheres. Da esquerda para a direita temos os dois chefinhos da nossa equipa, uma alentejana do Gavião, um alentejano de Castro Verde e a menina mais picuinhas da sala. Fofos.




Ao jantar segue-se um mini-espectáculo de Flamenco. Eu não consigo ver mais nada quando começa a tocar aquela música. Nunca soube explicar porquê mas sempre fiquei hipnotizada pelas saias, leques, cabelos bem apanhados atrás, flores no cabelo e pele morena. Fico completamente seduzida pelos movimentos dos bailarinos e não permito a ninguém a interrupção deste momento. Ao som de algumas guitarras parece que fico com os olhos marejados: é um som carnal e trágico. Y olé!

(fotografias de minha autoria, à excepção da primeira, da autoria da C.)

dezembro 12, 2006

American Psycho II (revisitado)

Eu já sabia que o moço tinha problemas. Que era um tipo um pouco perturbado por uma experiência de vida algo invulgar. Que era uma pessoa que não se encaixava nas nossas definições de pessoa normal. E sabia que, acima de tudo, ele era um inadaptado. Muitas vezes nos tinha ocorrido que algo de muito grave tinha acontecido com este rapaz que o impossibilitava de se integrar, de agir com naturalidade. Muitas mais vezes ainda rimos dos factos que dispara para quem quer ouvir ('Vocês sabem que no Pólo Norte não é preciso existirem frigoríficos?' ou então 'Vocês sabem que existem três tipos de liberdades: a de expressão, a de pensamento e a de acção?'), da forma como sorve o chá todas as manhãs ou da total incapacidade de se concentrar nas instruções de trabalho.

E ontem, no jantar de Natal do nosso piso, o rapaz voltou a mostrar porque é que às vezes quase temos medo dele. No meio de 40 pessoas foi o único a beber vinho demais. Bebia-o como copos de água, dizia quem estava junto dele. Falou muito, a contrariar todos os dias em que trabalhou até agora. Gritou o meu nome muitas vezes, exigiu que fosse com ele para o Catacumbas (onde suspeito que, apesar de apregoar o contrário, nunca pôs pé). Tornou-se agressivo e saiu do jantar já a cambalear. Mas, para mim, tinha guardado a pérola da noite. Eu já estava no escuro, debaixo dos lençóis quando o telemóvel tocou. Não conhecendo o número, atendi porque pensei que alguém podia precisar de alguma coisa. Ele atendeu, gritando o meu nome mais uma vez e eu assustei-me. Quando eu perguntei o que queria, ele respondeu-me que tinha acabado de vomitar. E pediu-me que não sentíssemos a falta dele, a sua folga seria curta. Eu fiquei sem saber o que dizer e pedi-lhe para desligar. Desliguei eu. Debaixo do edredon, ri-me, desprevenida. Mas adormeci dividida por dois sentimentos: por um lado, incomodada com o acontecimento do tipo stalker; por outro, invadida pela pena de alguém a quem talvez doa apenas ser.

dezembro 10, 2006

American Psycho (ou a vontade de transgredir)


There is no catharsis. My punishment continues to elope me.

(Tarde de Domingo passada a fingir que amanhã não é Segunda e que não tenho que acordar ainda o dia não nasceu e trabalhar outra vez. Escolho rever este filme em vez da normal comédia romântica que devemos ver numa tarde de Domingo. Compreendo mais uma vez o que me atrai tanto na personagem de Patrick Bateman: a sua frieza e a dor que sente por ser apenas um desalinhado; uma necessidade de satisfação que não consegue conter com os estímulos materiais; um total desprezo pelas mais primitivas emoções do ser humano; a classe e a elegância, mesmo quando ergue o machado com que vai torturar a próxima vítima. Não imagino uma pessoa assim. E é exactamente isso que mais me faz gostar dele.)

dezembro 09, 2006

Vou no carro a conduzir depressa, não gosto de chegar atrasada. Caem uns aguaceiros tímidos mas eu já os vejo como se fosse desabar o céu. Páro na descida das Amoreiras, páro na rotunda do Marquês, páro na Fontes Pereira de Melo, assim não dá, assim nunca vou chegar a horas. O meu estômago quer rebentar com tanto nervoso miudinho e estou a pensar, enquanto conduzo, que não, não posso ser uma pessoa normal. Estaciono o carro e chego à porta - tu não estás. Pensei que já não vinhas, que te tinhas arrependido, que nunca tinhas tido a intenção de vir. Desci as escadas e subi-as novamente e tu estavas lá, como tínhamos combinado. Sentas-te ao meu lado, no escuro. Eu já vi o filme mas acho que é bom vê-lo contigo. O estômago dá-me tréguas por uns instantes.

Entramos naquela cave velha e fumarenta. Eu bebo a minha cerveja depressa, tu desdobras-te em atenções para tanta gente. Não podemos falar porque a banda está a tocar e por isso encostamo-nos à parede, as minhas costas viradas para ti até que a música acaba. Conversamos, eu a tentar ser natural, tu a tentares perceber se eu era natural. Dentro de mim havia uma voz a dizer 'Banana!'. Quando saímos do táxi rimos com a dificuldade de expressão do taxista e a localização da rua da Palmeira.

Conduzes-me na noite em que não ias decidir nada. Onde entras há sempre alguém que te cumprimenta, há sempre alguém que te pisca um olho ou que fica espantado por te ver. Descemos a rua dos Poiais de São Bento, paramos para nos abrigarmos num parque de estacionamento, continuamos e entramos: tu esperas música electrónica, eu o rock. Ganhei. Não há espaço para dançarmos, apenas para estarmos muito juntos. Demasiado juntos, diria eu numa outra altura. Eu não imaginava, tu não sabias e as coisas precipitaram-se na mesma. Ocupamos parte do balcão, enquanto bebemos mais cerveja. Somos dos últimos a sair quando se acendem as luzes e ganhamos um sorriso cúmplice do empregado.

Ainda há tempo para a rua do Século, para o Conservatório, para o Clube Mercado. Já era tão tarde, eu já estava acordada há 24 horas mas não o sentia. Quando me deixaste à porta do carro gostava que o dia pudesse ser bem mais comprido. Acho que foi bom. E sei exactamente o que isso quer dizer.

dezembro 06, 2006

Blindness

I don't want a relationship.
I just want to be with you all the time. *

(E as vezes que já senti isto. Assim aquela cegueira de querer estar com uma pessoa até estarmos saturados. Uma vontade inexplicável de me sentar ao seu lado e nem sequer dizer nada. Uma vez perguntaram-me o que era isso de 'estar comigo' e eu não soube bem responder. É um estado em que o silêncio é suficiente e compensador. Desejar que esse momento em que estamos lado a lado se repita infinitamente, como uma máquina do tempo de um segundo, disparando flashes numa sequência perfeita que não deixa o momento acabar. O coração parece um cavalo, no estômago voam as borboletas que dão o nome à minha casa, a boca seca, o cérebro funciona apenas em modo embriaguez total. Mesmo depois de esgotado o silêncio ainda haver a vontade de ficar, só porque nos sabe bem, só porque cheiras bem e já não chega conseguir cheirar-te nos meus dedos. É o único estado que nos faz atirar de cabeça de todas as vezes, a única altura em que deixamos de ser nós a decidir e passamos apenas a obedecer(-lhe). Às cegas. As vezes que já me senti assim e as saudades que me dão. Às vezes.)

* maravilhosamente dito num dos episódios da L Word.

dezembro 04, 2006

You can have it all *

O jantar é o de segunda-feira, início de uma semana interrompida pela folga de amanhã. Hoje excedi-me, tomei coragem e respirei fundo: preparei uma enorme salada toscana com rúcola (será este o termo português?). O prato em si é apenas completado por frango com molho agridoce, não há mais lugares na mesa. Se há coisa que detesto mas detesto mesmo, assim com força e com os punhos cerrados e com olhos a soltarem faíscas miudinhas é comer sozinha. Acho que me lembro de poucas coisas tão deprimentes como sentar-me à mesa e não haver ninguém a sentar-se ao meu lado. Esta coisa da independência e da emancipação é muito gira mas porra, já vou começando a achar que seria a altura de não me emancipar sozinha. E com isto não falo apenas dos males do coração: bastava-me ter a minha pequenina aqui e a mesa tinha risadas parvas, a cozinha deixava de fazer eco.

Hoje declinei um amável convite para ir ver o Jorge Palma no casino de Lisboa. Que parva!, dirão alguns. Talvez mas eu tenho as minhas razões. Primeiro, e mesmo que isto pareça impensável a muito boa gente, eu não gosto de Jorge Palma. Uma coisa é admitir que o homem escreve bem que se farta e que tem ali uns poemas muito, muito catitas. Outra é gostar mesmo, assim gostar de quem saca os cds ou gostar ainda mais, gostar o suficiente para possuir a discografia integral do homem, tudo em original. Eu não gosto dele e pronto. Nem é por ele ser seboso e beber litros e litros de uísque antes dos concertos (bem, até ele sabe que só assim é que se atura a si próprio...). É mesmo porque ele é um ódio de estimação e isso não se explica, não é?

E depois há aquela questão de ter o ouvidinho cheio de música, também ela da boa. O concerto de sexta no Maria Matos deu a conhecer A Naifa a uma amiga holandesa. Ela saiu impressionada, eu nem tanto. É certo que eles são sempre bons e a voz da Mitó enche qualquer sala de espectáculo. Mas a sala era pequena, propícia a um concerto intimista e quase não existiu interacção com o público. Talvez apenas no final, quando nos foi pedido que acompanhássemos a 'Desfolhada', na habitual versão-em-jeito-de-encore, com palmas e com uns movimentos muito tímidos. O entusiasmo da minha amiga vai galgar fronteiras até à sua terra natal e eu fico contente - afinal, é uma forma muito indirecta de promover a (boa) música portuguesa. E ontem, para terminar a maré de sorte dos bilhetes, foi dia de ver os Yo La Tengo. O concerto foi uma belíssima surpresa, especialmente porque não conhecia a música deles com tanto pormenor. Ainda assim, e mesmo não podendo cantarolar os maiores hits tocados pelo trio eléctrico (mesmo figuradamente!), gostei mesmo do concerto. Os momentos dividiram-se entre os hilariantes, os absolutamente doces e os de descargas eléctricas brutais. Belíssima noite de Domingo, portanto.

E para terminar o dia em beleza lembrei-me que hoje celebrei os primeiros seis meses de trabalho nesta era. Há, pelo menos, mais seis meses frenéticos à minha frente, o que só me deixa exultante (pois, que a casa não se paga sozinha!). Agora que esta parte está assente, vamos então às outras?

* quer dizer, mais ou menos tudo.

novembro 30, 2006

E agora, de repente, tudo faz sentido.



Já dizia o outro que 'Sorte ao jogo, azar do...'. Hoje foi um dia assim. Ganha-se um bilhete para ver A Naifa amanhã, no Teatro Maria Matos, e ganha-se outro bilhete para ver os Yo La Tengo na Aula Magna, no Domingo. Eu, que nunca participo em nada porque acho que estou condenada à partida, excedi-me. E até meti um boletim no Euromilhões para ver se isto é sorte ou apenas coincidência. Daqui retiro uma lição valente e prometo que, um dia destes, volto a arriscar. Mas desta vez mesmo mesmo a sério.

Fotos emprestadas daqui e daqui.

novembro 29, 2006

Thank God it's Christmas


Já caiu a noite há muito tempo. Não está frio mas já sabe bem fechar o casaco até acima. Costuma-se dizer que as sortes estão contra nós. Pelo menos contra mim estão.

Hoje foi dia de jantar de Natal da empresa, antecedido por uma maravilhosa palestra sobre o crescimento da mesma pelo nossos chefes ingleses. Acho que me consigo lembrar de poucas coisas tão aborrecidas e tão perigosamente sonolentas como esta apresentação sobre o crescimento da empresa. Diz que fazemos biliões de pounds, que planeamos crescer muito nos tempos que se avizinham, que já estamos em terceiro lugar no mercado inglês. É tudo muito bonito e muito entusiasmante. Quer dizer, seria, se ao menos sentíssemos nas nossas contas bancárias o reflexo desse crescimento massivo. Não sentindo, resta-nos aproveitar a happy hour patrocinada pelo bolso de cada um dos oradores naquele hotel citadino para beber tantas Carlsbergs quantas somos capazes de aguentar, sem antes dar cabo da nossa preciosa bexiga.

Depois há o jantar de Natal na Trindade. Há um salão daqueles só para nós e bebida que chega a rodos a todas as mesas. Ninguém pergunta com quem estamos, somos apenas parte daquelas mesas já previamente nomeadas (T-Mobile, E-Plus, TMN, Talk Talk ou outros bonitos nomes que tais) e em que, absurdamente, distribuíram as pesssoas de todos os departamentos. A mim, e como a sorte nunca me abandonou, calha-me uma mesa de 10 pessoas em que não conheço absolutamente ninguém, o que, sabendo de antemão o meu feitio anti-social, só podia resultar em muitos copos de imperiais e copinhos de vinho para disfarçar o (tremendo) mau estar. Não satisfeitos, entregam prémios inesperados, distinguindo as pessoas que mais contribuíram para o sucesso dos departamentos. Nem sequer sabia que existiam, quanto mais esperar ganhar. Mas depois de me segredarem que tinha morrido na praia, apeteceu-me gritar: não importa o que faças a mais, não interessa o que pões de ti num projecto ou as tuas contribuições para o seu desenvolvimento. Vais sempre perder para alguém que... enfim, que ganhou na tua vez.

Sento-me na paragem sozinha. Apetece-me mesmo chorar mas presumo que já seja um bocadinho do alcóol a querer sair. Prometo a mim mesma que nada disto interessa, que hoje mesmo vou deixar de me preocupar. Mas imediatamente sei que só vou conseguir fingir até às sete da manhã, hora em que volto a trabalhar. O eléctrico chega e eu subo. Ainda bem que é Natal e há luzes nas ruas. Vou-me deitar a pensar em milagres de Natal e naqueles olhos castanhos sentados na mesa errada. Um dia destes sou eu que ganho o prémio e é ele que está sentado à minha frente. E aí sim, é Natal.

novembro 26, 2006



A noite está muito fria. Quando na Serra da Estrela começam a cair as primeiras neves, os nossos ossos são os primeiros a ressentir-se. Na minha terra, a meteorologia sempre foi e sempre será feita de contrastes - é uma cidade com personalidade, com carisma. No Verão sufocamos com os vapores da interioridade, no Inverno entra-nos o frio pelas frestas das portas, congelando tudo. Não passeio as vezes suficientes para saber se as luzes de Natal estão acesas há muito. Hoje elas estão acesas para ninguém. Para ninguém, a não sermos nós, que caminhamos sem pressa.

Peço um gin tónico. Sei que não gosto de gin tónico mas peço porque me apetece forçar-me a fazer qualquer coisa. Peço-o porque me apetece o glamour que não vem servido num copo de imperial. O gin tónico revela-se, é uma espécie de epifania. Depois do meu vêm mais gins tónicos. As damas do jet set olham para os nossos copos, nós estamos sentadas no balcão e elas na mesa. Elas querem o que nós temos. Elas querem todas gin tónico. O empregado pisca-me o olho, enquanto me diz que os delas não são preparados com o mesmo amor. Amor de barman, hã?, sabes o que quero dizer. A mim já me apetece bebê-los de palhinha, assim como quem bebe um refresco.

Fecho o casaco e pego no chapéu de chuva que trouxe sem necessidade. Andamos uns metros, subimos aquelas ruas tortas e estreitas e despedimo-nos, que eu tenho que continuar a subir. Já vou em modo piloto automático, as pernas já sabem o que fazer. Está muito frio e o ar está tão denso que a respiração começa a pesar. Não sei se estou a andar depressa ou se estou a molengar, só ouço o eco dos meus passos na estrada. Quando entro em casa já o sono tomou conta das pernas e dos braços e do resto do corpo todo. Dispo-me à pressa e enfio-me debaixo do edredon. Hoje bebi gins tónicos e dormi tranquilamente.

novembro 25, 2006

O senhor Fonseca*

Todas as pessoas que insistem em negar a capacidade criativa e performativa do David Fonseca deviam, obrigatoriamente, ter assistido ao concerto da quinta-feira. Para se desenganarem, para se deixarem esmagar por ele, para rirem com ele como não esperavam rir-se. Todas essas pessoas se deviam ter arrepiado quando ele cantou 'Song to the siren' de Tim Buckley ou 'When you hit the floor' de sua autoria. Todos deviam ter ido para se derreterem com o piano e voz da menina ex-Atomic Bees. Com uma voz límpida e ampla ou com um sussurro arrancado ao fundo de si, o senhor Fonseca espantou uma plateia. A mim não, que sempre lhe senti ali uma magiazinha.

[fotos naturalmente más, gentilmente cedidas pelo telemóvel cessante]


* como foi carinhosamente tratado por umas miúdas da plateia.

novembro 23, 2006

(PS:) You rock my world.

Quando penso na forma como devem ter escolhido este presente, fico contente por saber que gostam de mim. Os meus colegas ofereceram-me, no aniversário, um bilhete para ver o David Fonseca, coisa que muito me alegrou. Hoje é o dia de me sentar na Aula Magna e esperar uma noite inolvidável, entre tantas recordações e esperanças futuras.

novembro 22, 2006

Ode à vida moderna

Levantas-te e ainda o Sol não desceu sobre nós.
Descobres na cozinha alguma coisa que o estômago possa aguentar.
Sais de casa numa manhã fria e juntas-te aos estranhos a caminho do trabalho.
Fazes sempre a viagem ao som de música, dias inteiros a fio a ouvir o mesmo álbum.
Trabalhas/és explorado/não fazes nenhum durante uma manhã cinzenta.
Divertes-te ou chateias-te ou ignoras os teus colegas.
Abres o saco e o almoço é o mesmo que comeste ao jantar.
Descansas durante minutos na sala comum do emprego quando o que mais querias era dormitar na tua cama.
Trabalhas/és explorado/não fazes nenhum durante uma tarde cinzenta.
Acabas o dia e enfias-te nessa sala de tortura moderna que é um autocarro/metro/engarrafamento em hora de ponta.
Entras finalmente em casa. Sabe-te bem.
Quando queres dedicar-te aos deveres tens sono.
Quando queres dedicar-te aos prazeres tens preguiça.
Ouves as mesmas palavras de todos os dias, enquanto cozinhas o jantar/almoço.
Lês em silêncio o que consegues antes de cederes à hora (pouco) tardia.
A casa não faz eco mas é como se fizesse. Adormeces.

Obrigada vida moderna, por nos deixares (quase sempre) saber exactamente o que vem a seguir.

novembro 19, 2006



Talvez se deva ao facto de já fazer isto à nove anos consecutivos mas estas viagens a casa já se tornam penosas. Se, por um lado, são momentos muito propícios a pôr os pensamentos em ordem, por outro são um poço de stress e irritações. Nem sequer está em questão deixar de viajar assim ao fim de semana - mas há dias em que o teletransporte não era assim tão má ideia...

Primeiro eram os autocarros da Rodoviária. Eram viagens intermináveis mas baratas. No início, ainda existia assim uma emoção que nos fazia falar e estar excitados por podermos estar sozinhos em Lisboa. Com o passar do tempo, as viagens começaram a fazer-se de maneira mais silenciosa (para alguns, porque para outros era sempre motivo de festa). Eu arranjava sempre uma maneira de ir entretida, quer fosse com música ou com alguma coisa para ler. Esquivava-me às conversas de ocasião com aqueles conhecidos sempre com tanta coisa para dizer ou garantia que escolhia bem o/a companheiro/a de viagem. Recordo especialmente as viagens feitas no expresso das oito e quarenta e cinco da manhã, nas manhãs mais frias e cinzentas, em que passava a viagem a ver a geada a levantar, o gado já a pastar bem cedo e os primeiros raios de sol a ferirem-me os olhos.

Depois, ocasionalmente, ainda tentámos os comboios. Eram, talvez , o meio de transporte mais barato e mais confortável (bem, a noção de conforto vai mudando) mas, em contrapartida, ofereciam maiores desvantagens. A estação fica a onze quilómetros da cidade (será que alguém esperava que a cidade se estendesse até lá?), o que implica um pai disponível ou mais um bilhete de autocarro. Os transbordos faziam-se em Abrantes e no Entroncamento, o que dava sempre origem a entrarmos no comboio errado e sair de lá, de malas penduradas assim que percebíamos. E depois havia aquela parte do percurso (Chança-Mata-Crato, que coisa mais musical!), em que o comboio andava tão devagar que podíamos sair, colher fruta nalguma árvore à beira da linha e voltar a entrar. Ou então os rebanhos de ovelhas que se atravessavam à frente da locomotiva, que colhia três ou quatro. Havia a automotora, mais velha que qualquer pessoa a viajar naquele comboio e que levava os passageiros ao fim da linha, na Beirã.

E hoje, sou eu e o meu carro. São quase ciquenta euros de gasolina para ir e voltar porque nem sempre se arranja alguém para partilhar a viagem. E são quase três horas a tentar não soltar todas as asneiras que sabemos, a tentar não gritar e insultar todos os condutores que se arriscam e que arriscam a minha vida ao mesmo tempo. São muitos minutos a insultar quem vem a menos de ciquenta à hora onde se pode andar a noventa, a ver como todos os homens se sentem ameaçados quando são ultrapassados por um Panda. Um dia destes prometo que tiro um curso qualquer para me sentar sossegadinha ao volante, sem stressar e sem achar que está tudo louco. Até lá, páro o carro a semana inteira e esqueço-me da falta de civismo na estrada. Até à próxima viagem.

novembro 15, 2006

All is full of love


A filha do meu chefe chama-se Eva e desenhou isto para mim. Não foi a pedido meu, porque nem sequer a vi ainda. Levei uns rebuçados de ovos feitos pela minha avó, distribuí pela malta. O meu chefe gostou bastante e levou mais para casa, onde os ofereceu à Eva. E ela gostou tanto que tomou a iniciativa e pegou nos lápis de cor para me oferecer isto. O gesto, a espontaneidade, o inesperado... Nem sei o que me fez gostar mais dele. Gosto especialmente da Eva se ter desenhado de rebuçado na boca!

Depois disto, o post anterior merecia ser apagado. Vai ser, pelo menos, esquecido :)

novembro 13, 2006

Da tristeza


Ela pergunta-lhe

Achas que a tristeza já está dentro de nós quando nascemos?

Ele responde-lhe, docemente

Sim, acho que já nasce conosco. E só nós é que podemos mudar a nossa tristeza. *


Muitas vezes estive imersa na minha própria tristeza. Tempos houve em que passava os dias literalmente enfiada na cama, a sentir-me miserável durante horas infinitas, a tentar remendar (erradamente) todos os erros que não conseguia evitar. Noutros tempos, sentia apenas a dor de não saber para onde exactamente estava a caminhar e tentava não ceder aos ataques de pânico. Muitas vezes sentei-me perto duma janela, a tentar perceber onde tinha errado, a afundar-me cada vez mais na pena que tinha de mim mesma. A melancolia ainda me ataca muitas vezes: parte de mim revive momentos passados (as expressões, as mãos, as palavras doces, escritas e ditas), outra parte sofre com a inquietação de não saber o que vem aí.

Quantas vezes nos forçamos a ouvir a música mais triste que temos, a canção mais deprimente e que nos fala mais ao coração? Quantos filmes fomos ver e acabámos por sermos nós a sofrer no ecran, por sermos nós os abandonados e os esquecidos? Eu sei que o continuarei a fazer. [porque gosto] Mas agora também sei que há mais do que a tristeza. E, mesmo tendo ela nascido comigo (como com toda a gente, ainda que em doses diferentes), eu sei que há outras coisas que me fazem feliz. E nem sequer precisei de saltar de uma ponte.

* citação muito livre de Dans Paris

novembro 09, 2006

Home *


* é onde o coração está. Mas também é onde há um corredor por onde nos passeamos, orgulhosos. E onde há luzes no tecto, a lembrar revistas de decoração. E é um sítio pelo qual nos vamos apaixonando lentamente, como todos os (grandes) amores que já tivemos.

novembro 08, 2006

Think twice cuz' you gotta long way 2 go *


Estou sentada no meu sofá, acompanhada por um café servido nas chávenas que, com enorme bom gosto, me ofereceram pelo aniversário/inauguração da mansão. Baixei o som da televisão, constantemente ligada na MTV, na esperança de uma surpresa, um vídeo mais antigo, qualquer coisa que não seja do hip-hop ou que não tenha demasiada carne à mostra. [Em vão.] Estou a pensar que talvez não tenha sido a melhor maneira de me fazer anunciar aqui - ter os vizinhos a bater-me à porta à meia-noite de ontem: a vizinha de baixo tinha uma queda de água maravilhosa no quarto de arrumações com nascente na minha casa. E estou a desejar cair na cama hoje para não mais acordar. E especialmente não acordar com as vozes irritadas dos vizinhos, que além disso debitam palavrões a uma velocidade invejável.

Olho para a borra do café no fundo da chávena e espero ver qualquer coisa de revelador, qualquer coisa que me vai surpreender e deixar a pensar. Não vejo nada. Os olhos começam a ficar preguiçosos e moles. Combato esta urgência em deitar-me mas com muito pouca vontade: a habituação ao café já não o deixa fazer efeito. Na MTV continuam a rodar as mesmas músicas fabricadas em série. Lembro-me que tenho que passar no cartório, que tenho que ir ver o Dans Paris e que tenho que tirar medidas em casa para os últimos retoques. Há alguém que canta não te deixes encantar por quem nunca se encantará de ti. Eu sorrio, pois claro. É uma pena isso não ser tão fácil como eu agora levantar-me e enfiar-me debaixo do edredon.

* ou o perigo de ver demasiada MTV.

novembro 06, 2006

São vinte e sete...


e não se está nada mal.

novembro 05, 2006

Meine Stadt



Há um ano atrás, estava com a minha irmã em Berlim. Aproveitei um fim de semana livre para mostrar-lhe a minha cidade preferida e, simultaneamente, comemorar os meus anos. Não é que eu pense nisso todos os dias mas de vez em quando dá-me assim um daqueles ataques de saudades. Não sei se já desisti de morar lá um dia ou se estou apenas a fazer uma pausa nessa minha vontade.

A horas de me juntar ao clube dos vinte e sete, penso que chegar aos trinta já não me assusta assim tanto. A minha madrinha uma vez disse-me que aos trinta estava quase a chegar ao seu melhor. Não sei se é realmente assim mas sei que hoje gosto mais de mim. E, como dizia o anúncio, se eu não gostar de mim quem gostará?

Gostava ainda mais de mim se a esta hora estivesse sentada num café turco, a acabar um dönner e a preparar-me para ir dançar numa sessão de Karrera Klub. Mas enfim, já não é nada mau ter dançado como se estivesse possuída ontem no Lux e estar prestes a sair para um filmezinho, para depois regressar ao conforto da mansão da Lapa.

Até já. Quando voltar estarei um ano mais velha.

novembro 04, 2006

São onze e meia da manhã e eu já atingi os objectivos do dia inteiro, o que devia equivaler a dizer Ok pessoal, já trabalhei o que tinha a trabalhar, vou mas é voltar à caminha. Mas, obviamente, as coisas não funcionam assim. Também é verdade que podia fazer ronha até às quatro da tarde, que ninguém ia notar. Mas isso também não faz parte dos planos porque seria demasiado aborrecido. Não trouxe almoço, o dia está uma autêntica bosta e mal consigo abrir os olhos com o sono. Comi à frente do computador, os (poucos) colegas só querem ouvir Monster Magnet e Ozzy Osbourne.

Enfiei os phones nos ouvidos e sinto-me como se estivesse protegida numa redoma: sossegada. Com música a isolar-me do resto do mundo feio, tenho tempo para estar sozinha comigo. Olho para o Ipod e leio 'Soft and melting'. A reacção instantânea é pensar num beijo. E eis que me encontro a desejar beijar alguém durante um fim de semana inteirinho de seguida. Assim como aquelas pessoas que tentam bater recordes mas sem querer bater recorde nenhum. Só a sentir outra boca na minha boca. E eis também que descubro que já não sei o que estou a escrever, já perdi o fio ao raciocínio. Volto-me para o trabalho. Ter demasiado tempo nas mãos deixa-me sem saber para onde ir.

novembro 02, 2006

Work in progress



Aqui não há formigas. Não preciso ter nojo do que pode estar atrás do fogão. Não preciso empurrar as gavetas perras até não conseguir mais. Aqui o colchão não tem manchas não identificáveis. Aqui não divido espaço nenhum com estranhos. Há um jogo de estratégia para conseguir arrumar todas as mercearias. Há espaços tão pequenos quanto acolhedores. Aqui há silêncio de noite, nas ruas há gente do bairro, há lojas que resistem. Estacionar é difícil mas há sempre um buraquinho para mim. Sou eu que escolho a mobília e sou eu que pago os novos contratos. Ainda há muito espaço para ocupar, muita fotografia para colar na parede. Há uma história inteirinha para começar a construir.

Muito prazer, é a minha casa.

outubro 29, 2006

Os últimos dias antes do resto da minha vida





E agora, para contrastar com as semanas de interminável tédio e insuportável inactividade, aparece-me assim uma para me lembrar do que é andar mesmo de rastos. Nem tudo é negro, ainda assim.

Na quarta, as gordas aparecem para me resgatar. Chegam e já vêm cheias de sacos de supermercado e vontade de cozinhar. É a minha deixa para me deixar estar recostada no sofá e esperar que elas dominem as lides culinárias. Comemos, entre as últimas novidades do jet set nacional e os mais recentes reality shows, já que uma das gordas é assistente de produção. Além de não prepararem um prato pouco calórico, ainda me conseguem arrastar pa uma gelataria. E comer uma banana split, o melhor gelado de sempre. Em mesas e cadeiras em forma de gelados, porque elas fizeram questão. E eu a pensar Lá se vão as horas no ginásio. Suspiro.

Na quinta chego ao trabalho e deparo-me com o melhor cenário de sempre: ninguém estava no sexto piso. Nem a mosca que teima em ficar por ali. Não havia lutas pelo ar condicionado, nem estávamos a ouvir a mesma estação de rádio de todos os dias, nem havia uma impressora constantemente a acusar falta de papel. Lembrei-me como é raro estar em silêncio hoje em dia e aproveitei. Durante dois minutos, p'raí.

Depois entro no fim de semana com música e com música da boa, ainda por cima. Fomos até ao Santiago Alquimista ver os Linda Martini e bem, grande concertaço! Só foi pena concluir, mais uma vez, que sou demasiado baixa para quaisquer actividades musicais ou que impliquem espectadores desordenados. Mas foi impagável ver aquela gente toda a cantar o Amor Combate em uníssono. E depois houve a dose ideal de improvisação e de feedback, com o vocalista a insistir em fazer-nos passar uma mensagem de amor. Houve um encontro completamente condenado a não existir (demasiado ruído = comunicação inexistente) mas deu para sacudir o stress acumulado em quantidades industriais.

E hoje houve uma dose cavalar de IKEA, dose essa que não acabou com as minhas visitas lá. Um conselho: NÃO vão ao IKEA aos fins de semana. Mas OK, isto já toda a gente deve saber. Mesmo assim, NÃO vão. Há pessoas a quem a entrada em certos sítios não deveria ser permitida. Eu, claro, não sou uma delas.

outubro 27, 2006

E agora para algo verdadeiramente inédito *



Estas combinações que se fazem com os serviços de que mais precisamos sempre me deixaram desesperada. Desta vez foi a água. Disseram-nos que passavam cá entre as dezoito e as vinte e duas horas. São quase vinte e nada, como aliás seria de esperar. Sem uma cadeira, banco, mesa ou cama, sujamos as calças no pó branco que cobre todo o chão. Não há nada que possamos fazer, não podemos usar a casa de banho mas pelo menos temos electricidade. Não há nenhuma garantia de que realmente apareçam, penso eu, enquanto olho para as minhas mãos manchadas também do pó branco. Não sei, acho que isso realmente já não me importa. Ela está sentada à minha frente a tentar ocupar-se com o jornal e eu olho pela janela neste fim de tarde (quase) de Verão. Não chegam mas eu já consegui chegar até aqui. E palpita-me que é para ficar.

* a postar directamente da minha futura mansão na Lapa.

outubro 24, 2006

Let's get physical

Hoje é que foi. Hoje juntei-me a um ginásio exclusivamente frequentado por mulheres, o que só por si já é um tópico que me faria rir durante bastante tempo. E já há tanto tempo não mexia uma palha, umazinha sequer, que agora estou mesmo em dificuldades a escrever este post.

A ideia de um ginásio para mulheres é boa. Mas também é má. É boa porque não estamos expostas aos olhares masculinos. Se estamos num ginásio é porque, em princípio, não estamos satisfeitos com o nosso corpo e portanto é um alívio não ter que me passear frente a espelhos e espelhos e, ainda por cima, elementos do sexo masculino numa altura em que estou com um nível de vulnerabilidade perigoso. Mas, ao mesmo tempo, estamos só entre mulheres. E isso significa que estamos sujeitas a olhares ainda mais minuciosos, a procurar todos os defeitos, ah! aquela é sem dúvida mais gorda do que eu. Os balneários são um problema, também. Ainda só passou um dia e já estou farta da mulher que trabalhou em Milão e que manda vir o queijo de lá e que só come sopa como a de lá.

Depois houve também a situação embaraçosa das medidas. Ali estava eu, com a minha amiga ao lado, a ser medida por tudo quanto era lado, vamos lá ver a anca, aqui na parte mais larga!. E a minha amiga a ver e eu a pisar a balança e a fechar os olhos, a fingir que nem via o ponteiro a subir, a subir. E depois, para tornar tudo ainda mais embaraçoso, assistir às medidas da amiga e ver que... bem, somos diferentes. Não há como fugir a isto tudo: já não é só a ideia de não ser atraente ao olho masculino que me amedronta. Agora já tenho um certo pudor em olhar-me ao espelho, já é difícil olhar e fingir que está tudo bem.

Depois há a parte do banho. Não sei porquê mas as mulheres são tão mais púdicas. Os homens levantam-se nús duma cama, passeiam-se nús pela casa, não se sentem intimidados pela presença de outro homem. O que eu sinto nos homens é que as situações de balneário são quase naturais. Mas para nós há todo o ritual de tentar parecer natural mas rápida, para que possamos parecer à vontade mas reservadas. E tomar banho e vestir muito rapidamente para tapar as imperfeições porque já é mau o suficiente vermo-nos ao espelho, quanto mais partilhar isso com estranhos. Ou então sou só eu, não tem nada a ver com o nosso género.

E agora é suar. Suar desalmadamente, ensopar a t-shirt e a toalha, sentir os músculos a ceder, sofrer muito enquanto faço os alongamentos. E passear-me em frente aos espelhos daqui a uns meses largos e sorrir discretamente.

outubro 21, 2006



Hoje é Sábado. Portanto, é dia de eu me tratar (especialmente) bem. O que implica



cozinhar o meu Berliner Wok*. Cortar minuciosamente os ingredientes, abrir uma garrafa de vinho enquanto preparo tudo, ficar satisfeita com o resultado. E ter tempo, principalmente ter tempo para isto tudo sem pensar no que tenho que fazer a seguir.

* em memória da minha cidade preferida. Porque foi lá que tomei o gosto à cozinha e foi lá que comprei o primeiro wok e porque tenho saudades de mil e uma coisas. Especialmente do turco que vendia os legumes frescos na Wrangelstr. E de coisas que davam para muitos mais posts.
E eis que, quando pensava que o azar já me tinha abandonado, ele regressa sob forma de falha no sistema no trabalho! Depois de ontem só ter trabalhado as três primeiras horas da manhã, a coisa repete-se na manhã de Sábado. E meus amigos, garanto-vos que não trabalhar é, neste caso, uma coisa demasiado violenta para o meu gosto.

Ontem, apesar de ter trabalhado apenas das oito às onze, só saí do trabalho às três e meia. E isto porque chegaram à conclusão de que não valia a pena esperar mais. Quer dizer, isto depois de esperarmos quase cinco horas. Cinco horas de passear pelo sexto piso, ler o jornal aos bocadinhos e almoçar mais cedo à força. Depois ainda houve tempo de uma consulta de medicina do trabalho (com a médica mais bruta e mal educada de sempre) e de festejar o aniversário dum colega de trabalho com bolo de brigadeiro. Daqui, passa-se pelo ginásio e combinam-se os preços e as modalidades. Vou mandar o pneu (e o bolo de brigadeiro) às urtigas e fazer a vontade à médica.

Levantei-me hoje às seis horas e quarenta e cinco minutos da madrugada. Hoje é sábado e não me levantei para ir ao mercado ou para ir correr ou para ir à praia ou para ir fazer qualquer porra de actividade que me apetecesse mesmo mesmo. Entrei no carro e ainda era de noite. Cheguei ao trabalho e ainda era de noite. E quando cheguei, dou com o sexto piso quase vazio, apenas uma colega de trabalho que pensava que se tinham esquecido dela. O sistema não funciona. O quê? O sistema não funciona. Acho que não ouvi bem. Pois, o sistema não funciona mesmo e não fazemos ideia se sequer vai funcionar. É sábado e eu estou num sexto piso da rua Latino Coelho a escrever isto. Não estou na cama, não estou em casa, não estou a chegar duma noitada. E o mais estúpido disto tudo é que até é bom: queixo-me mas acho que não ia querer passar a manhã a anhar na cama. Agora queixo-me, agora não. Agora queixo-me, agora não. Ai.

outubro 19, 2006

La Dauphine


i'm not surprised at all and really, why should i be?/see nothing wrong/see nothing wrong/so sick and tired of all these pictures of me/completely wrong/totally wrong*

[Saí do metro e começou a chover. Era uma chuva muito miudinha, não conseguia decidir se abria ou não o chapéu. Fiz o caminho para casa devagar, o calor debaixo do casaco, completamente embriagada pelo cinema. Não sei realmente se o filme foi bom ou se estava abaixo das expectativas. Mas sei que gostei. Se calhar porque ela escreve, com as suas imagens, uma espécie de poesia urbana e moderna, uma poesia da solidão. A minha casa era hoje o Palácio de Versalhes: um sítio imenso, onde uma miúda tenta não ceder. Às vezes é bom estar sozinha. Noutras custa-me estar .]

*apaixonada (outra vez)

outubro 16, 2006

25-dele-25

Está no meu Top 3 de pessoas favoritas de sempre. Acumula funções: é irmã e melhor amiga. Quando estou com ela sinto que é sempre bom nunca termos crescido. E quando estou sem ela sinto falta das milhares de vezes que nos rimos das coisas mais estúpidas de sempre. E, mesmo não gostando de beijinhos e abracinhos, hoje era dia deles. Ela sabe que eu lhos dava! E tem a maior das sortes: continua a parecer que tem 17 anos, apesar de hoje completar um quarto de século. Parabéns à Pita :)

outubro 15, 2006

Arrepio bom



All your secret wishes could right now be coming true.

[E saudades tardias.]

outubro 12, 2006

O estranho caso da conspiração dos utentes do Metro contra a minha pessoa

Não sou nem nunca fui grande fã dos transportes públicos de Lisboa. Pelo andar das coisas, acho que nunca vou conseguir sê-lo. Há pessoas que podem evitá-los e preferem usar o carro e enfrentar filas intermináveis e condutores irascíveis - tudo para não terem que suportar a feroz agitação entre os utentes de transportes públicos. Mas eu não quero ceder e muito menos tenho uma carteira cheia de notas que possa desperdiçar em intermináveis talões de parquímetros. Mas todos os dias sofro horrores quando entro na mesma carruagem e vejo as mesmas pessoas e saio no mesmo sítio.

A minha madrinha dizia que não usava os transportes públicos porque o cheiro das pessoas a repugnava. E portanto pagava mais para não as cheirar. Como eu não sou rica, pago antes o Metro 30 dias e, calhando, lá vou debaixo do sovaco dum trolha depois de 8 horas de cimento e inúmeras médias despejadas num golo. Ou então sentada ao lado duma mulher a dias, que passou o dia com as mãos mergulhadas em lexívia, depois arranjou o peixe à patroa e a seguir ainda lhe descascou umas quantas cebolas. Mas a esta gente uma pessoa perdoa: é gente que suou para alimentar a canalha lá de casa. Quantos de nós não chegámos já ao fim do dia com um leve aroma a eau du suvaque? Depois há os velhos que a) ou cheiram muito mal b) ou são sebosos c) ou contam pela enésima vez todas as suas operações e dinheiro gasto em hospitais e como isto tudo é uma vergonha. Mas a esse mal também já me habituei.

Esta semana os utentes resolveram fazer-me a vida especialmente negra. Ou isso ou então era tudo parte duma gigantesca conspiração cósmica contra moi. Num dia foi o estúpido músico intelectual que, com o seu instrumento à costas, falava ao telemóvel. Perdão, ele não falava: ele usava aquele tom de voz especialmente indicado para toda a gente nesse metro, todas as carruagens umas atrás da outras, saber o que se estava a passar. Que tinham que receber uma indemnização choruda (esta expressão usada até à saturação total...), que a cultura neste país andava pelas portas da morte. A minha escolha era ouvir isto ou rebentar com os tímpanos, levantando o som do ipod. Ouvi-o, claro. Depois foi a mulher (nem sequer vou falar do aspecto dela) que resolveu cortar as unhas à minha frente. Assim. Como se fosse a coisa mais natural no mundo e sem pensar na unhas que saltavam para todo o lado. Um autêntico nojo. Noutro dia, encontrei um amigo de um ex-namorado. Não há coisa pior de disfarçar, olhar para o lado, fingir que não se viu a outra pessoa (coisas que ambos fizemos) e depois acabar na mesma carruagem cheia, quase colados um ao outro. Ter que beijá-lo, então estás bom?, fazer conversa durante mais tempo do que o suportável. Não é que não se goste da pessoa mas a única coisa a ligar-nos já se foi: não há nada que me/lhe interesse, nada que possamos mesmo partilhar. Odeio esta espécie de hipocrisia e, no entanto, cedo.

E depois, hoje, a cereja em cima do bolo. As pessoas pensam que, lá porque se vai de phones nos ouvidos, não ouvimos nada do que dizem mesmo ao nosso lado. Assim, entram dois homens (também não comento o aspecto nojento... ups, já comentei) que ficam mesmo ao meu lado, porque a carruagem vai a abarrotar. Vejo que olharam atentamente para mim mas não ligo. A música acaba e ouço um dizer '...epá, lá isso era. Aqui tinhas fruta para todo o ano!'. Esta foi a fase um, em que me comecei a enojar. Depois, quando o volume de pessoas aliviou, colocaram-se cada um de seu (meu) lado. Um deles começou a fixar-me atentamente: primeiro a cara, depois só as mamas. E depois a cara outra vez, como se eu fosse dizer-lhe 'Sim, possui-me já aqui'. Não aguentei: pedi licença a outras pessoas e fui para o meio da carruagem. Quando ele saiu, lançou-me um olhar como se eu tivesse que pedir desculpa. E eu só a pensar que, no dia em que me sair o Euromilhões, declaro abertamente que não gosto de pessoas. E mudo-me para um sítio onde não tenha que as aturar.

outubro 08, 2006

Irmãos Catita, CAE Portalegre





(fotos com autoria de moi e de Teresa Paula, excepto na foto de grupo, autoria do feliz aniversariante)

A noite chegou como quem não quer a coisa: não se fez anunciar, não estava planeada, nada. Chegámos tarde mas eles chegaram mais tarde ainda, a testarem a paciência dos espectadores. Manuel João passeava-se pela audiência, entre os gritos de 'Candidato!' e de 'Beirão!' que eram disparados de todos os lados. Tocaram muito tempo, um concerto dividido em duas partes, com direito a um intervalo para refrescar gargantas. Houve a asneirada do costume, os dizeres fortes para agitar as massas, a piadola de quinta categoria (como é sempre seu apanágio). Consegui a proeza (com ajuda, é certo) de tirar perto de 250 fotografias numa noite, o que já diz muito sobre a qualidade de muitas delas. O aniversariante teve direito a uma fotografia com os artistas (aqui, o momento exacto em que o gajo da esquerda lhe diz '30 anos? Tás acabado!') e nós tivemos direito a incomodar muita gente com os flashes disparados a torto e a direito. A cerveja acabou, o sumo de limão que acompanha o Bacardi também mas a boa vontade fez com que se bebesse sempre outra coisa qualquer. Havia Vespas por todo o lado e nenhum frio na rua.

Foi bom e o resto é conversa.