As coisas continuam a apertar. Depois de ler estes três artigos sobre a emigração aqui no Luxemburgo, deparo-me simultaneamente com histórias de miséria e com a nossa imensa sorte.
Segundo os artigos, os portugueses são já 21% da força de trabalho activa aqui. O maior problema desta percentagem é que os portugueses constituem também 75% da mão de obra não qualificada no Luxemburgo. No outro dia, falávamos com o pediatra do Vicente (luxemburguês, como a maior parte dos funcionários públicos) e ele dizia-nos que a lista de pacientes desse dia era quase na sua totalidade de nacionalidade portuguesa, acrescentando que se começava a ver cada vez mais a chegada de portugueses com qualificações. Só que a verdade é que os portugueses aqui ainda continuam a ser a mulher da limpeza e o pedreiro para toda a obra.
Vivendo algumas vezes no limiar da pobreza, falando pouco mais do que o português, dependendo da boa vontade da família e com insuficiente acompanhamento da escolaridade dos filhos, este português típico prolonga o estereótipo que os estigmatiza aqui. Viver aqui não é fácil: o senhorio só arrenda se o inquilino tiver um contrato de trabalho, a comuna só aceita a inscrição e carta de residência se houver um contrato de arrendamento, o patrão muitas vezes esquece-se desse contrato de trabalho. Há muitos preconceitos em relação aos estrangeiros e especialmente em relação aos portugueses (ao pai do Vicente perguntaram, na segurança social, quantas mulher tinha, naquilo que eu entendi como uma clara provocação e intencional demonstração de ignorância), muito em parte consequência de quem opta por vir: poucas qualificações, nenhuma aptidão para línguas estrangeiras, uma comunidade em números impressionantes por todo o país.
Ler estes relatos de pobreza, de falhanço, de inadaptação deixa-me triste. É claro que concordo com a ideia que a ida para outro país deve, nos dias que correm, ser pensada com extrema cautela. As anteriores vagas de emigração viram países capazes de absorver todos estes trabalhadores pouco qualificados, indiferenciados mas hoje essas posições estão já preenchidas e o crescimento nestes países da Europa Central começa também a abrandar. Além disso, os portugueses enfrentam a concorrência dificílima do frontaliers (os habitantes dos países vizinhos que são, regra geral, altamente qualificados e dominam duas das línguas oficiais) e dos emigrantes de Leste que ainda buscam a sua sorte aqui. É um combate quase desleal. Numa reunião de trabalho na semana passada, por exemplo, contei doze pessoas na sala e onze nacionalidades diferentes mas falamos de pessoas com alguma/bastante formação superior e que falam pelo menos uma combinação de três línguas.
Fazer uma viagem até aqui com mulher e filhos, sem contrato de trabalho e sem sequer um sítio onde ficar é uma aventura perigosa que quase garantidamente acaba em desastre. Ouvem-se já relatos de enfermeiros, advogados e psicólogos que vêm à aventura mas que, apesar das suas qualificações, esbarram nas línguas estrangeiras que todos pedem. Eu sei que é difícil viver em Portugal mas ainda mais difícil é vir gastar os últimos cêntimos em vão e ter que partir com a ajuda da Caritas. O Luxemburgo dos Mercedes em Agosto e das vivendas arrancadas a ferros já acabou. Resta um país cada vez mais exigente, à procura de mão de obra qualificada. O ministro da Imigração luxemburguês já mandou o recado ao nosso Primeiro Ministro: a emigração como acto de desespero não deve ser incentivada. Há lições que demoram a aprender.
1 comentário:
Que realidade tão triste.
Há pouco tempo vi uma reportagem na televisão sobre portugueses que emigraram para países europeus, principalmente para Inglaterra, sem contrato de trabalho, sem referências, nada, estavam a viver na rua e da caridade de alguns portugueses, pois nem dinheiro têm para regressar.
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