fevereiro 21, 2011

Uma espécie de luto

É assim que me encontro desde Sexta-feira: como uma carpideira silenciosa, a chorar um luto que ainda não começou. Até à semana passada, eu não tinha grandes esperanças de encontrar logo um emprego, especialmente sabendo como o mercado está e como a crise se tem alastrado a todos os sectores. Pensava que ia demorar o seu tempo e estava já há muito preparada para ficar com o bebé Vicente até que ele fizesse um ano. Tinha assumido o compromisso de procurar emprego mas sem grandes expectativas e certamente sem grandes pressas. Assim, garantia que ia sondando o mercado, ao mesmo tempo que via o meu bebé a crescer e que cumpria com os meus deveres.

Mas a semana passada veio baralhar todas as minhas contas e as coisas precipitaram-se de tal forma que todos os meus planos ou, pelo menos, os meus desejos, foram por água abaixo. Não estou em posição de recusar uma oferta de emprego tão razoável e com tantas promessas de futuro, ninguém está. E além disso, a simples perspectiva de me ver livre da Segurança Social faria com que aceitasse o emprego, sem contemplações. E então eu disse Sim, sem pensar muito bem no que isso iria realmente significar para a nossa relação mãe-filho. E custa-me mas era a única coisa a fazer.

Mas depois bateu-me tudo o resto: não tinha (tenho) ninguém que fique com o Vicente. E mesmo que tivesse, nunca ia ser a mesma coisa. Quantas vezes lhe mudariam a fralda? Como lhe dariam o almoço? O que fariam quando lhe dói a barriga? Como o iriam entreter? E, finalmente, percebi que vou ter que abrir mão de todas estas coisas, vou ter que aceitar que haverão outras mãos a pegar-lhe ao colo e que outra pessoa o há-de alimentar e sucumbi ao medo terrível de ser substituída por outra "mãe". Já chorei muito. Já chorei e sei que ainda mais lágrimas hão-de vir porque esta dor de o ter que partilhar é imensa e, por muito que saiba que é necessária e até saudável, não estava preparada para uma ferida tão profunda. Eu, a que andava a dizer que precisava de voltar ao Mundo; eu, a que queria voltar a ter bocadinhos para ler e ouvir música; eu, a que estava cansada de quase nunca ver ninguém tinha-me transformado rapidamente em alguém que queria exactamente o contrário.

Como todas as mães (e pais), morro de medo do sítio onde ele ficará porque, na verdade, nunca poderemos saber como ele é tratado. E imagino que a próxima semana seja de muita, muita dor que hei-de tentar disfarçar no emprego sob pena de não corresponder ao que esperavam de mim. Ser uma mãe que trabalha faz doer mas só porque no fundo queria guardá-lo para sempre perto de mim. E eu não posso ser egoísta nem irracional, impedindo o bebé Vicente de crescer e conhecer outro Mundo. Mas quando abrir mão dele, quando o entregar e passar o primeiro dia fora, hei-de chorar essa nossa distância em silêncio porque ele nunca mais será só meu. E catorze meses de (quase) exclusividade, acreditem, custam a acabar.

4 comentários:

joão b. disse...

é a primeira separação. quando ele começar a querer ir para santos com 13 anos, aí é que vai ser!

Gaivota disse...

O meu tinha 17 meses e doeu muito. Dói sempre.

Um beijinho de força.

Helena Barreta disse...

De certo que as pessoas em quem vai confiar o seu bebé são merecedoras dessa responsabilidade e vão fazer tudo para minimizar, junto do bebé Vicente, a sua falta.

Esta mudança é dolorosa, sim, mas para os pais, o Vicente vai, com certeza, gostar de quem dele cuidar, não é a mesma coisa do que estar em casa sozinho consigo e receber os seus cuidados, mas se tem de ser. O Vicente não vai transferir para outra o que sente por si e vai ser uma alegria quando a vir, ao final do dia.

Coragem para enfrentar os dias que aí vêm.

Beijinhos

Anónimo disse...

Marisa, dp de te ler acho que eu, na tua idade, devia ser uma mãe muito desnaturada! É verdade que no tempo da minha filha só tinhamos um mês para nós, depois, outras preocupações maiores (pai na Guiné) nem dava tempo para pensar em nada senão nos cuidades essênciais e na esperança do fim de semana. Foram tempos duros, não tanto por ter de deixar a P. no infantário mas mais por saber que à noite estariamos as duas sózinhas!
Coragem, isso passa e tal como alguém disse anteriormente o sorriso com que o Vicente te vai receber à tua chegada compensará a tristeza da manhã!Beijinho da a tua professora
D.