Esta que vos escreve hoje é uma mãe cansada e envergonhada de sofrer horrores com estas transições. É uma mãe que ouve os conselhos dos outros, que abana a cabeça afirmativamente quando pensa o miúdo vai safar-se, eles adaptam-se melhor que nós, ele nem vai dar por nada, ele vai adorar estar com outras crianças e depois que passa a noite inteira a acordar e a pensar nisto tudo outra vez. É uma mãe que sabe que é assim que tem que ser, que precisa (também ela) de voltar ao activo, que este é o curso natural das coisas e que só pode ser um belíssimo sinal estar a acontecer assim mas depois só tem vontade de chorar e apanhar dois autocarros para o ir buscar a meio da manhã ou pelo menos espreitar e ver se ele está realmente bem.
O bebé Vicente voltou hoje a uma creche. É um sítio onde não se fala Português, o que me manteve acordada esta noite. E se ele entrasse em pânico por não reconhecer nenhuma palavra? E se a educadora não percebesse se ele tinha fome ou se morria de sede? E, agora que já é tão crescido, se ele pensasse que nós o tínhamos abandonado ali, sem referências nenhumas, ainda sem nenhuma âncora àquela realidade, sem conhecer bebés nem funcionárias? A minha metade racional insistia em dizer-me que a adaptação havia de ser canja mas ao mesmo tempo pensava na educadora que nos recebeu e nos contou que a sua filha chorou todos os dias de creche durante os primeiros seis meses! E se entregá-lo nas mãos de estranhos em Portugal me custou muito, mais me custou fazê-lo aqui, não por algum preconceito mas porque me parece que aqui ele é muito mais indefeso. Mas ele precisava de ir, nós precisávamos que ele fosse para que a vida possa (ainda a custo) voltar verdadeiramente ao normal.
Pela hora de almoço, as notícias eram as melhores: ele não tinha dado trabalho nenhum, tinha comido muito bem e estava a dormir. Eu encolhi os ombros porque, apesar de já esperar que assim fosse, tinha sentido esta angústia e ansiedade em vão. E se muitas vezes ele me fez a cabeça em água aqui em casa, desobedecendo a tudo e nunca desistindo de tentar, espalhando livros e caixas pela casa fora, tentando mexer em garrafas de vidro, no aquecimento e nos tachos, ligando e desligando a televisão um milhar de vezes, hoje só me lembrei de o ver a correr, despachado, de livro na mão e pedindo para eu o sentar no sofá para lermos juntos. E agora só quero ouvir a chave na porta e abraçá-lo com força. Ainda estou para perceber como se pode gostar tanto de um homenzinho pequenino.
3 comentários:
Eu sei que vai tudo correr bem...E daqui a pouco temos um homenzinho pequenino a falar francês! :D *beijinhos com saudades
Marisa, tenta ser menos ansiosa porque todos sabem que a ansiedade das mães se propaga aos filhos ou pelo menos é o que os livros dizem!
Sabes isso também acontece porque o Vicente é o primeiro!
"by the way" hoje o meu 3º, o André faz 32 e digo-te que foi o bebé mais amoroso de criar e isso muito provavelmente porque foi o 3º!!
Descontrai-te querida e se não o consegues naturalmente arranja uma "pilulazinha" que te ajude pois mãe nervosa não ajuda nada, mesmo que lhe reconheçamos que tem todos os motivos para isso...
Beijinhos da tua professora
Não tem que se envergonhar dos seus sentimentos. Os seus receios, quanto ao desconhecimento da língua francesa pelo Vicente, são, para mim, legítimos.
O primeiro dia ter corrido bem é um bom sinal e um forte indicador que o Vicente gostou de lá estar.
Um beijinho
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