maio 21, 2014

Contra uma certa ditadura da imagem


Já o escrevi aqui muitas vezes sob as mais variadas formas: não acredito que o que vestimos nos define na totalidade e com o detalhe necessário. Digo isto na vertente profissional da coisa: se a roupa/calçado/acessórios são uma imagem fiel ou não da nossa personalidade, isso já são outros quinhentos.

Lembro-me vezes sem conta da conversa que tive uma vez com um amigo, há muitos anos atrás e ainda antes de começar a trabalhar. Indignada, eu assegurava-lhe que nunca iria mudar a minha maneira de vestir ou ceder a códigos de dress code impostos onde quer que fosse. Ele, por seu lado, não defendia esta obrigação mas reconhecia que somos obrigados a fazer muitas cedências na vida e esta era apenas uma de somenos importância. No primeiro emprego que tive, tudo bem: não existia nenhum código definido e cada um trabalhava como bem lhe apetecia. O nível de responsabilidade ou de complexidade das tarefas? Perto de zero. Depois de mudar a primeira vez de emprego, as coisas foram quase sempre piorando, também na medida proporcional do grau de responsabilidade dos cargos que ocupei. Até chegar aqui e agora, onde a imagem é, talvez, mais importante que nunca.

Não vou ser hipócrita: entendo que quem tem contacto directo com clientes deve ser o cartão de apresentação vivo da empresa, nem mais nem menos. Deve cuidar-se, não descurar a higiene, ter uma imagem sóbria e ir ao encontro dos padrões da empresa que representa. Tudo certo, até aqui. O que eu não consigo aceitar ou sequer compreender é que essa imagem seja igual para todos os funcionários de todas as empresas, que se espere um determinado conjunto de roupa e acessórios que é comummente aceite por todos. É um acordo tácito, à excepção das empresas que o definem na totalidade (sei de empresas onde se define a altura exacta das saias, o tipo de acessórios que podem/devem usar-se, por isso pouco me admiro), é supostamente entendido por quem entra nesse mundo.

Eu tenho um ou dois problemas neste campo. Não tenho/uso acessórios nenhuns (embora muitas vezes me apeteça investir nisso), sou péssima com maquilhagem (que uso só para disfarçar o aspecto macilento que me trouxe a vida no Norte), não suporto saltos altos (não é uma questão estética, quem me dera alongar as pernas assim) e não sou mulher de decotes ou saias curtas. Um conjunto que, para quem faz o que eu faço, pode ser letal. Já decidi há uns tempos que não vou preocupar-me com isto e que vou sempre fazer o melhor para que as minhas qualidades possam falar mais alto do que a minha imagem. Se quero ser um trambolho? Claro que não, mas não posso aceitar que seja um par de sapatos ou um colar estratégico a definir-me profissionalmente. Além disso, acredito mesmo que é uma mais valia para a empresa ter alguém que se mantém fiel às suas convicções sem desafiar ou prejudicar a sua imagem: demonstra abertura de espírito e igualdade no tratamento dos seus funcionários. 

Por isso, os meus melhores amigos agora são estes sapatinhos prateados que me apetece calçar todos os dias. Dão um bocadinho de glamour à minha rotina luxemburguesa e eu não tive que aprender a andar com eles. E continuo a dizer: viva a diversidade! Continuemos a trabalhar para não julgarmos os livros pelas suas capas.

1 comentário:

Lia Gloria disse...

Estamos empatadas! Eu também não sou mulher de saltos, maquiagens, adereços, ornamentos, e também recuso-me a obedecer ditaduras de moda. Conforto é tudo.
Mas sim, as vezes precisamos ceder.
Meus filhos cobram-me um cuidado maior com a aparência. Enquanto eram pequenos, não opinavam. Agora, maiores, já opinam.

bjs