junho 22, 2013

Caçadora de memórias


 

 Tenho um grande defeito (entre outros) que é anular-me um pouco quando estou perto de pessoas que fazem uma coisa muito bem. Eu explico: se estou ao pé de uma pessoa com outra língua mãe e que eu até domino também, tendo a não falar muito porque sei que nunca estarei ao seu nível e precisarei de inúmeras correcções.

Isto aconteceu-me com o meu marido, um belíssimo fotógrafo amador que, além da prática, também domina a teoria mas no fundo se interessa mais por documentar o mundo à sua volta do que pelos preciosismos técnicos. Ele instalou-se na minha vida e de repente, para mim, ele era o gajo das fotografias. Na minha cabeça, não fazia nenhum sentido ser eu a fotografar, já que ele o fazia tão melhor que eu.

Isto continua a ser verdade e eu continuo a admirar a facilidade como saca todos os dias a melhor imagem da vida que construímos os três mas eu continuo a querer fotografar. Tenho o melhor professor a meu lado (ainda que a sua paciência seja muitas vezes pequenina, pequenina) para o caso de me surgirem dúvidas, tenho os meus olhos e as minhas mãos (que não sendo perfeitos, traduzem pelo menos aquilo que eu vejo) e tenho um projecto chamado Vicente.

Um projecto? Sim, pode chamar-se assim. Lembro-me dos álbuns que os meus pais fizeram para mim e para a minha irmã, até dos caracóis que me guardaram num envelope, das memórias que ainda hoje estão na nossa casa e quero fazer qualquer coisa parecida ao Vicente. Quero contar a história dele, quero que ele saiba como passava tão rapidamente duma birra por querer ver desenhos animados para um abraço cheio de ternura, enquanto me dava palmadinhas nas costas. E já o faço virtualmente mas quero que ele tenha alguma coisa em que possa tocar, páginas que possa folhear e onde descubra como gostava de carros, aviões e comboios, fotografias onde recorde os caracóis indomáveis que não sabemos de quem herdou (da avó materna ou de um tio materno, talvez). Quero construir-lhe uma memória física: a virtual também está muito bem mas a satisfação de poder ter as memórias debaixo do braço é diferente.

Se ele vai gostar ou dar valor a isto? Não sei mas acho que sim. Se não quando for um adolescente em plena idade do armário, pelo menos quando for um jovem adulto e quiser, naturalmente, perceber como chegou até ali. Faço isto para/por ele mas também para minha satisfação pessoal. A três meses de ter um filho com três anos, pergunto-me onde se enfiaram estes meses todos, onde está aquela sensação de pânico dos primeiros tempos, onde ficarão as gracinhas que aprende todos os dias. Não me chega que me fique na minha cabeça, preciso guardar tudo isto da forma mais palpável que conseguir. E por isso hei-de fotografar outra vez.

1 comentário:

Helena Barreta disse...

Fiz e continuo a fazer, em formato de livro, uma fotobiografia do meu filho. Chamo-lhe fotobiografia desportiva, anoto as datas dos torneios, os adversários, os resultados dos encontros, as fotos, as curiosidades e demais peripécias que surjam.

Por vezes reconheço traços da fisionomia de alguns atletas que connosco se cruzam nos torneios e alguns nomes soam-me familiares, tiro as teimas socorrendo-me dos meus livros.