maio 30, 2014

Casa (s) *

Eu gostava de escrever um texto muito bonito e inspirado sobre a minha casa mas calha que não tenho apenas uma. Gostava que a minha casa fosse organizada, limpa e decorada como nas revistas e blogues da moda mas a que tenho agora está sempre a um curto passo do caos.

Primeiro existiu a casa de Portalegre. Existiu não, ainda existe e ainda bem. Não saberia o que fazer sem ela. Aliás, sem elas, que as casas das minhas avós são também as minhas casas. Entre as três, cresci, sempre com o gigante luxo de ficarem apenas a minutos umas das outras. Ao contrário de muita gente que conheci, sempre tive os meus avós na minha vida e não imagino como seria não os ter. Em cada uma delas, memórias tão doces quanto ríspidas: a minha avó a ralhar com o meu avô só porque sim, o meu outro avô a dizer-me que nunca mais poria os pés naquela casa se saísse naquele instante, os meus pais aturando a música em altos berros e os concertos que dei no quarto. Fiz-me pessoa em todas elas e delas sinto a falta. O meu medo, o meu grande medo de as ver desaparecer é perder também eu as origens e não ter mais razão para regressar ali. As minhas casas têm fotorgrafias minhas e da minha irmã nos móveis e nas paredes que começam a dar lugar às do meu filho. Deve ser a isso que chamam renovação.

E um dia, depois de passar por meia Lisboa, comprei uma casa num bairro que não conhecia. Tinha adorado o Alto do Pina, sofrido pela Praça do Chile, sonhado em Benfica, perdido o Norte na Penha de França, tinha-me isolado em Telheiras e acabei na Lapa. Que é hoje Estrela, ou qualquer coisa assim. Acabei na casa que desejei ter na primeira vez que a vi e disse ao senhor "Por favor, não coloque nenhum anúncio, eu fico com ela!" e ele acedeu. E ela tornou-se minha, num dia que lembro como cinzento na sede do banco, com vista sobre a Praça de Espanha, eu a enganar-me ao escrever o montante no cheque, envergonhada pela minha ingenuidade e nervosismo e de repente dona de uma casa! Um feito, pelo menos para mim. Um abrigo, uma toca num prédio quase a cair de velho, onde os meus vizinhos chamam o filho nas escadas para o jantar, onde se ouve gritar pelo Sporting e pelo Benfica com a mesma intensidade. É a minha casa, a mesma que viu a minha gravidez e o meu despedimento aos sete meses, onde o Verão era impiedoso mas onde o vento a fazer bailar as cortinas em tardes amenas tudo fazia esquecer. A minha casa, cujo cheiro me descansa assim que abro a porta, que vive agora fechada, sempre à minha espera na penumbra dos dias lisboetas que tanta falta me fazem.

E agora a minha casa luxemburguesa, onde ganhámos um quarto a sério e uma casa de banho onde cabe mais do que uma pessoa. A casa onde o meu filho me pediu pela primeira vez na sua curta vida para dormir e onde anseio chegar todos os dias. Não é uma casa de revista, não consigo fazer desaparecer todos os carros e tractores e autocarros da cozinha, casa de banho e sala. Há dias em que literalmente todos os pertences do miúdo estão espalhados no chão do quarto, como é o caso de hoje. Mas é o sítio onde me apetece estar nos meus dias livres e onde preciso deitar-me no tapete para que o miúdo faça de mim um cavalo, onde me deito e posso ver o céu, onde tento não matar algumas plantas.

Ter o coração assim dividido é custoso mas é impagável poder voltar a cada um destes cantos quando posso, quando as férias me deixam, quando o tempo chega para dizer olá. Acho que em cada uma delas sinto a falta das restantes e nelas ouço também os ecos do meu passado. Nelas posso caminhar às escuras sem tropeçar e regressar, se a vida me quiser empurrar assim.

* que é exactamente o tema da Granta que fui hoje, finalmente, levantar aos correios.

maio 28, 2014

Não estamos nunca a salvo

Um destes dias tive um sonho horrível, do qual despertei completamente angustiada e com um gigante sentimento de culpa. Estava num complexo de piscinas imaginário, explorando e visitando, e ao chegar a um segundo ou terceiro andar, não sei precisar, o miúdo empoleirou-se (se este verbo não existe, acabei de o inventar) num varandim e caiu, em direcção a uma piscina demasiado rasa. É claro que eu, de cabeça perdida e consciente da enorme falta de atenção que tinha provocado o acidente, saí dali a gritar, voando nas escadas, para encontrar o meu filho vivo, magoado mas vivo. A dor que eu senti durante esse dia, essa, foi bem real e não ficou no sonho como eu queria.

Já tinha tido outros sonhos assim (o sonho que o perco por uma pura negligência de segundos deve ser até recorrente) e sofro muito, mesmo sabendo que não passa de algo que o meu inconsciente fabricou a partir dos meus medos. É que eu sou aquele tipo de mãe que sofre apenas por pensar no que pode acontecer ao nosso filho. Acho que todos os dias vemos/lemos/ouvimos histórias mirabolantes e assustadoras do que acontece a crianças ou mesmo adultos por esse mundo fora. Nos últimos tempos, lembro exemplos (esta, esta, esta ou esta histórias) da total falta de respeito pelos direitos humanos e da silenciosa impunidade que vivemos hoje. Estes pesadelos não são exclusivos de um continente ou civilização, não escolhem idades mas ainda tendem para passar-se maioritariamente com o sexo feminino. A nossa passividade (autoridades, profissionais de educação, família, amigos) é gritante e é impossível saber destes casos sem que se nos dê um nó no estômago e fiquemos literalmente nauseados. E eu, confesso, tenho muita dificuldade em aceitar os motivos religiosos, passionais, irracionais que levam esta gente a viver assim. Pior: custa-me entender que actos destes se façam por pura diversão, por falta de soluções e divergências de opinião. Esta aleatoriedade de motivos ainda me fazem temer mais pelo nosso futuro. É preciso viver com a consciência de que podemos vir a estar precisamente no olho do furacão sem saber como aí chegámos.

Quando eu olho para o nosso filho, tenho apenas um enorme desejo: que se possa cumprir e realizar como ser humano, vivendo e aproveitando ao máximo, consciente de si e dos outros, respeitando todas as formas de vida, todas as opiniões, todas as escolhas alheias. Que possa fazê-lo em paz, num ambiente que promova o desenvolvimento saudável e pleno das suas capacidades, em que estimule e seja estimulado pelo valor inestimável que têm as pessoas ao nosso redor. Que possa escolher o seu próprio caminho e que nós possamos sempre ajudá-lo. Não o trouxe para este mundo, em que ser menor ainda é uma desvantagem, em que ser mulher ainda é uma fraqueza, em que o dinheiro ainda fala mais alto do que a justiça. Nestes momentos, tenho vontade de o apertar e colocá-lo numa redoma onde ninguém lhe possa fazer mal, nem mesmo eu com as minhas negligências sonhadas. Falta muita humanidade por aí.

maio 21, 2014

Contra uma certa ditadura da imagem


Já o escrevi aqui muitas vezes sob as mais variadas formas: não acredito que o que vestimos nos define na totalidade e com o detalhe necessário. Digo isto na vertente profissional da coisa: se a roupa/calçado/acessórios são uma imagem fiel ou não da nossa personalidade, isso já são outros quinhentos.

Lembro-me vezes sem conta da conversa que tive uma vez com um amigo, há muitos anos atrás e ainda antes de começar a trabalhar. Indignada, eu assegurava-lhe que nunca iria mudar a minha maneira de vestir ou ceder a códigos de dress code impostos onde quer que fosse. Ele, por seu lado, não defendia esta obrigação mas reconhecia que somos obrigados a fazer muitas cedências na vida e esta era apenas uma de somenos importância. No primeiro emprego que tive, tudo bem: não existia nenhum código definido e cada um trabalhava como bem lhe apetecia. O nível de responsabilidade ou de complexidade das tarefas? Perto de zero. Depois de mudar a primeira vez de emprego, as coisas foram quase sempre piorando, também na medida proporcional do grau de responsabilidade dos cargos que ocupei. Até chegar aqui e agora, onde a imagem é, talvez, mais importante que nunca.

Não vou ser hipócrita: entendo que quem tem contacto directo com clientes deve ser o cartão de apresentação vivo da empresa, nem mais nem menos. Deve cuidar-se, não descurar a higiene, ter uma imagem sóbria e ir ao encontro dos padrões da empresa que representa. Tudo certo, até aqui. O que eu não consigo aceitar ou sequer compreender é que essa imagem seja igual para todos os funcionários de todas as empresas, que se espere um determinado conjunto de roupa e acessórios que é comummente aceite por todos. É um acordo tácito, à excepção das empresas que o definem na totalidade (sei de empresas onde se define a altura exacta das saias, o tipo de acessórios que podem/devem usar-se, por isso pouco me admiro), é supostamente entendido por quem entra nesse mundo.

Eu tenho um ou dois problemas neste campo. Não tenho/uso acessórios nenhuns (embora muitas vezes me apeteça investir nisso), sou péssima com maquilhagem (que uso só para disfarçar o aspecto macilento que me trouxe a vida no Norte), não suporto saltos altos (não é uma questão estética, quem me dera alongar as pernas assim) e não sou mulher de decotes ou saias curtas. Um conjunto que, para quem faz o que eu faço, pode ser letal. Já decidi há uns tempos que não vou preocupar-me com isto e que vou sempre fazer o melhor para que as minhas qualidades possam falar mais alto do que a minha imagem. Se quero ser um trambolho? Claro que não, mas não posso aceitar que seja um par de sapatos ou um colar estratégico a definir-me profissionalmente. Além disso, acredito mesmo que é uma mais valia para a empresa ter alguém que se mantém fiel às suas convicções sem desafiar ou prejudicar a sua imagem: demonstra abertura de espírito e igualdade no tratamento dos seus funcionários. 

Por isso, os meus melhores amigos agora são estes sapatinhos prateados que me apetece calçar todos os dias. Dão um bocadinho de glamour à minha rotina luxemburguesa e eu não tive que aprender a andar com eles. E continuo a dizer: viva a diversidade! Continuemos a trabalhar para não julgarmos os livros pelas suas capas.

maio 20, 2014

(ainda sobre os Estados Unidos...)

É impossível não ficar impressionada com os Estados Unidos. Se pensar dois segundos, grande parte nas minhas referências musicais, cinematográficas, literárias giram à volta deste país tão livre e tão impossivelmente controlado desde que tenho recordações. Goste-se ou não, concorde-se ou não mas ele lá está: as brownstones das séries onde a malta se senta antes de entrar em casa, os ícones arquitectónicos e históricos mais ou menos recentes, o Woody Allen a filmar a ponte de Brooklyn, as tipas do Sexo e da Cidade saltando entre restaurantes mais ou menos exclusivos, os blogs que recentemente aprendi a adorar, os camiões imponentes, as banheiras pela estrada fora. Tudo isto na única língua que, na minha confusa cabeça, faz tanto ou ainda mais sentido que o Português. É uma enorme sensação de alívio e segurança sabermos de antemão que vamos visitar um país onde compreendemos e podemos fazer compreender.

Também seria mentir se dissesse que não tinha ideias feitas sobre muitas coisas: as pessoas, a comida, a segurança. Se posso dizer que fui surpreeendida em algumas coisas, noutras a nossa percepção está totalmente correcta. Tinha a ideia em Nova Iorque que toda a gente seria impossivelmente antipática, sem tempo para dedicar a estranhos ou sequer sorrir. Não podia estar mais enganada: muitas vezes fomos ajudados por alguém que, espontaneamente e topando a nossa desorientação temporária, se dirigia a nós oferecendo ajuda.Ficámos com boas memórias neste campo.

A comida é outro estereótipo: é geral pensar em doses industriais de comida rápida por todo o lado. Não tive, neste tempo que passámos lá, nenhuma experiência em que a quantidade tenha sido manifestamente exagerada mas posso afirmar que a comida (mesmo a que se intitula menos rápida) é tudo menos saudável: muitos fritos, muitos molhos espessos de sabor indefinível, bastante gordura. Há zonas em que não existem alternativas (perto do hotel onde ficámos, por exemplo, onde as escolhas quase não passavam do chili ou do hamburguer nas suas muitas variações. Em Miami também é um pouco assim, apenas com a vantagem que a cozinha cubana tem muita expressão. Mas é carne e molho com fartura.

Já a segurança... Bem, é tudo aquilo que imaginamos e ainda mais. Desde o embarque ainda em Lisboa, onde a área de espera foi primeiro evacuada para depois revistarem uma lista de passageiros escolhidos a dedo (adivinhem quem teve que abrir a mala...), as impressões digitais e a fotografia tiradas à chegada no aeroporto, as atracções com redobrados controlos de segurança e raios x e revistas... Eu estou bem familiarizada com os acontecimentos (já não tão) recentes mas será que ninguém vê nisto um bocadinho de paranóia? Nesse aspecto, a Europa está a anos luz do que se faz lá mas a verdade é que nunca sofremos um ataque da dimensão do onze de Setembro. Enfim, continuo a achar que aquelas cabecinhas pensam demasiado.

O que eu achei cómico e mesmo um pouco ofensivo é o tom das recomendações. Nas lojas, por exemplo, lê-se "You break, you pay" e nos hoteis qualquer coisa como "You puff, you pay!". Se compararmos com o estilo europeu, este é talvez mais paternalista mas pelo menos mais delicado, sendo mais normal ler "Please do not touch the cups" ou "This is a non-smoking room". Enfim, estilos, eu cá continuo a preferir o tom cordial e delicado aqui das nossas bandas. São gostos!

Mas aquilo que mais me fascina nos Estados Unidos (e o que seguramente me vai fazer voltar) é a sua diversidade, são os seus parques naturais e estradas desertas, são os arranha céus que desafiam as alturas e as pequenas cidades de beira de estrada, as praias imensas da costa Oeste, os extensos campos de cereais, os climas temperado e tropical num só país. Faziam-nos falta muitos dias de férias (e correspondente pocket money) para poder ver tudo com a calma e a atenção que um país destes merece. Até lá, como em tudo, vamos continuar a sonhar com destinos longínquos.

maio 19, 2014

Nova Iorque e Florida (pelos meus olhos*)


* eu não sou a fotógrafa da relação, está claro. Mas isso não me impede de ter uma visão sobre aquilo que vivemos nestas duas últimas semanas.

maio 12, 2014

Dias 7, 8, 9 e 10: este calor é terapêutico!

Miami, Key West... Ainda agora chegámos e já estamos de regresso. Tenho pena e não tenho, tal é a confusão de sentimentos que aqui vai.

Estes últimos dias eram exactamente o que estávamos a precisar: calor tropical, praias com muito espaço para respirar, Sol a rodos, muita água por todo o lado, chinelos nos pés e fato de banho sempre à mão. A visita não estava planeada como qualquer coisa cultural ou de interesse histórico ou arquitectónico: tínhamos escolhido esta parte da viagem para descansar, para parar e respirar, para apanhar Sol e deixarmos para trás aquele tom de pele macilento a que o Luxemburgo nos obriga. Dentro deste espírito, conseguimos exactamente o que queríamos e regressamos com uma corzinha já muito aceitável.

Miami Beach é muito interessante, especialmente pela sua mistura arquitectónica entre o moderno e a Arte Deco mas é apenas isso. É uma estância balnear cheia de brasileiros e latinos, com praias longas e tranquilas, onde as pessoas não se acotovelam nas toallhas. A água? Bem, vai ser difícil recuperarmo-nos desta temperatura, a não ser que voltemos à zona do Caribe em breve. A água do Algarve é gelada quando comparada com esta e então nem vale a pena comparar com a costa Vicentina. Estivemos dentro de água até termos os dedos encarquilhados para depois secarmos sem precisar da toalha. Não sei se é sempre costume mas foram dias de muito vento, a que nos acostumámos bem e que nos ajudaram a enfrentar o calor.

Depois tínhamos planeado a viagem às Florida Keys, uma sucessão de pequenas ilhas ligadas pela auto-estrada número 1 e alternando entre vistas deslumbrantes de mar de ambos os lados ou da vegetação luxuriante que esconde outros pequenos paraísos. Em Key West, encontrámos um calor sufocante, uma pequena multidão à porta da casa do Hemingway e o ponto mais a Sul dos Estados Unidos. Cuba fica apenas a 90 milhas desta ilha e a influência sente-se bastante bem também aqui. Aproveitámos para comprar uns charutos, sentir o ambiente que se vivia por aqui nos anos 50, olhar o mar. No regresso, parámos no Bahia Honda Park, um parque natural maravilhoso com praias tranquilas e escondidas, onde as palmeiras que balançavam e os pelicanos que sobrevoavam a zona eram os únicos sons que podíamos ouvir. Foi muito bom, ir decidindo pelo caminho onde queríamos tomar banho, sem planos nem nenhumas obrigações.

E agora é aquele período doloroso, em que começamos a recordar que não, a nossa vida não é assim, que não podemos esperar este calor back home, que há obrigações e deveres a cumprir, que há uma rotina à nossa espera. Mas a parte boa é saber que o abraço do nosso filho está cada vez mais perto e para essa vida sim, eu quero voltar! Até já!

maio 07, 2014

Dias 4, 5 e 6: I love New York mas preciso de descansar!

Nova Iorque, Nova Iorque... És gigantesca e agitada mas eu gosto de ti. Costumam fazer a vocês mesmo aquela pergunta de viagem "Será que eu conseguiria viver aqui?"? Eu costumo e a minha resposta é sim, claro que sim. Embora ache uma cidade um pouco sufocante para quem tem filhos, pelo menos imagino-me a viver aqui e a levar o Vicente ao Central Park e ao Brooklyn Bridge Park aos fins de semanas. Mas vamos por partes.

Tínhamos uma ideia bastante clara do que queríamos ver e, mesmo não tendo feito planos definitivos antes de começar, conseguimos ver tudo a que nos tínhamos proposto. Nestes dias, aproveitámos para subir ao Top of the Rock (uma emoção estar perto dos cenários de uma das minhas séries favoritas, o 30 Rock), onde a agitação era incomparavelmente menor do que no Empire State Building. As vistas são igualmente maravilhosas e ventosas e até consegui manter-me calma, apesar das vertigens. Visitámos o MoMa, o Met e o American Natural History Museum e isto foi muito emocionante. Consegui ver ao vivo e sem mil pessoas à volta o meu quadro preferido de todos os tempos ( A noite estrelada, do Van Gogh) e muitos outros que povoavam meu imaginário há muitos anos. Apesar de termos visitado os museus no fim de semana, não havia assim taaaanta gente que desencorajasse a visita. Tudo está bem organizado e bem, os americanos tendem a dar demasiadas instruções e a manter tudo sobre (demasiado) controlo, por isso nunca esperámos muito em nada do que vimos.

Passeámos pelo Central Park (como não!) e durante esse bocadinho eu ia pensando mais e mais no Vicente, enquanto via as famílias em pleno piquenique ou os miúdos com os velerido telecomandados no lago. Eu sei que foi a melhor decisão que tomámos (ele ainda é pequeno e não ia aproveitar grande coisa) mas não consigo evitar pensar muitas vezes nele e sentir-me um bocadinho egoísta por não o ter trazido. Mas depressa me passava o pensamento: bastou-me ver, por exemplo, a birra monumental de uma miúda da idade do Vicente no MoMa e no desespero estampado na cara dos pais para me lembrarue tinha tomado a decisão certa!

Embarcámos num cruzeiro muito bonito e longo (os meus pés agradeceram mil vezes!) à volta da ilha de Manhattan, que pudemos ver em todo o seu esplendor a partir do East River e do Hudson. Tínhamos decidido não ir à Estátua da Liberdade mas passámos suficientemente perto para fotografá-la e sentir aquele apertozinho no coração de quando se está finalmente frente a algo que povoa há muito as nossas memórias. Eu pude ver que o tamanho da ilha é muito superior ao que eu tinha na cabeça e o guia tinha tantas, tantas curiosidades na manga que era impossível não sorrir. Almoçámos em Chinatown e comemos a sobremesa em Little Italy, passeámos por essas ruas cheias de movimentação e onde mal se fala inglês para depois voltarmos ao centro nevrálgico da cidade.

Se gostei? A-do-rei! Fiquei fã de Nova Iorque, dos seus transportes públicos funcionais, das buzinadelas a toda a hora, da gente que corre sempre para qualquer lado. Mas agora, neste exacto momento, o que me faz falta é repouso e relaxamento, é pés sem sapatos e um carro à porta que nos leve à praia mais próxima. É por isso que faltam poucos minutos para embarcarmos para segunda parte da viagem...

maio 04, 2014

Dia 3: preciso de uns pés novos!

Há dois impactos físicos a sofrer en Nova Iorque, um que já esperava e outro do qual nem me tinha lembrado: os pés podem ficar destruídos de tanto andar e o pescoço dorido de tanto olhar para cima. Tenho o pescoço muito são, os pés é que nem por isso.

Saímos do hotel às sete da manhã e apanhámos o autocarro para a cidade. Antes tínhamos saboreado o pior pequeno-almoço de hotel, que os testemunhos dizem ser muito aceitável para o standard americano. Eu tenho tido oportunidade de tomar uns pequenos-almoços por aí e vêm duas considerações à cabeça: tenho saudades dos hotéis espanhóis e, se isto é representativo do que comem os americanos comuns, então explica-se muita coisa!

O autocarro não demorou mais de quinze, vinte minutos até à cidade, deixando-nos em plena Times Square. Era muito cedo e as ruas estavam quase vazias, o que não aconteceu definitivamente no nosso regresso. Guiados pelo skyline da cidade, decidimos visitar o Empire State Building que podíamos ver de Times Square. A quantidade de gente e de controlo (malas verificadas à entrada e detector de metais) eram impressionantes mas as filas nunca pararam de andar. Ainda subimos 6 andares a pé até ao observatório do octagésimo sexto piso, onde a grandiosidade e familiaridade da vista sobre Nova Iorque é incrível. O número de turistas e de pais que deixam as crianças desprotegidas também mas tudo está bem quando acaba bem.

Descemos até ai edifício Flat Iron, tão esguio e bonito ao vivo como o tínhamos imaginado. Daí, descemos a Broadway até ao mercado de Union Square, onde nos enfiámos pela primeira vez no metro. Eu já sabia que era escuro, que era já velho, especialmente se o comparamos com o de cidades como Lisboa, mas não estava era preparada para o ruído ensurdecedor! Como é que esta malta pode usar o metro diariamente e não ficar surda é um mistério para mim. Saímos mesmo antes da ponte de Brooklyn e uau, foi empolgante vê-la dos vários ângulos possíveis e atravessá-la a pé. Não sei porque tenho esta ideia tão romanticizada da ponte mas senti-me feliz por poder pisá-la.

Almoçámos em pleno Brooklyn Bridge Park, com uma vista soberba sobre o chamado Manhattan Skyline, vendo os táxis aquáticos no rio Hudson, os helicópteros em constante movimento turístico, a ponte de Manhattan à direita e a estátua da Liberdade ao fundo. Tínhamos decidido que tentaríamos comer comida de rua sempre que possível. Já tínhamos comido o belo do cachorro quente e ao almoço decidimo-nos por um burrito gourmet (afinal a moda não é só portuguesa...) delicioso. Típica comida americana, if you know what I mean. Mais uns minutos para respirar e ala procurar o metro para a cidade outra vez.

Passeámos por Battery Park já sob a ameaça de alguns pingos de chuva que afinal se contiveram e esperaram que chegássemos ao hotel. Pudemos sentir o impacto da história demasiado recente e catastrófica no memorial do onze de Setembro: eu imaginava aquela gente toda a procurar abrigo nas ruas e prédios adjacentes, as torres a caírem, o horror demasiado que parece ainda quente nas nossas cabeças. Ainda demos um salto à biblioteca de Nova Iorque e à grande Central Station, cenário de tantos amantes que se despedem, gente que foge da cidade ou simplesmente volta a casa. E depois a benção do autocarro de regresso, rebentados com um dia inteiro na cidade que não dorme (mas come, compra e consome televisão avidamente), a chuva a começar quando chegávamos ao hotel. Acho que cumprimos as expectativas para um primeiro dia, embora eu não saiba se os pés aguentaram um segundo! Pelo menos o jetlag acalmou :)

maio 03, 2014

Dias 1 e 2: Lisboa ao Sol e um jetlag do catano

São quatro e quarenta da manhã e o meu marido dorme tranquilamente. Mas na minha cabeça já são as dez e quarenta de Lisboa ou mesmo as onze e quarenta do Luxemburgo e por isso dormir, tá quieto!

No nosso primeiro dia de férias, e depois de termos entregue o miúdo às mãos capazes dos avós, enfiámo-nos num eléctrico, misturando-nos com a gigante vaga de turistas e subimos até à Graça. Turistas por todos os lados, em grupos ou casais, de tuk tuk ou segway, magotes de turistas na Praça do Comércio rendidos à sua grandiosidade ou na Ribeira das Naus absorvendo o magnífico Sol de Lisboa. Depois de respirarmos fundo no miradouro da Senhora do Monte, descemos tudo a pé: Graça, Portas do Sol, miradouro de Santa Luzia, Sé, Baixa. Já cheirava a sardinha, já se viam sacos de caracóis nas montras, os turistas compravam garrafas de água e chapéus de palha, eu acabei com um galo de Barcelos na mochila. Finalmente, no largo de Camões bebemos três copos de branco fresquinho, enquanto víamos as modas passar. Acabámos a noite no teatro da Trindade, a ver as 8 Mulheres (muito, muito boa! Garanto que se vão divertir!) e já passava da meia noite quando voltámos a entrar em casa. O nível de saudades tinha já baixado consideravelmente.

E agora são quase cinco da manhã e eu acordei em Secaucus, New Jersey muito antes do despertador. Tínhamos alugado um apartamento em Brooklyn, estávamos felicíssimos com a escolha até nos acabarem com o sono há um mês atrás. A dona, aparentemente ucraniana, cancelou-nos a reserva sob o pretexto de ter de regressar ao país para auxiliar a família, já não havia Brooklyn para ninguém. Ficámos incrédulos mas decidimos agir de imediato e resolvemos escolher o preço e comodidade sobre a localização cool e aqui estamos em Secaucus. É um sítio feio mas a apenas quatro quilómetros do nosso verdadeiro destino, a inconfundível Nova Iorque, com comércio e restauração à volta e que cumpre um princípio: apenas viremos cá dormir!

Lentamente espero que se faça dia ou que o despertador toque para apanharmos o autocarro e sermos esmagados pelos arranha céus, agitação e referências cinematográficas. Estar aqui é como entrar para dentro de um episódio da Girls, por exemplo, e é uma sensação muito estranha, esta de vermos materializados os cenários de tanto filme e tanta série que vimos em nossa casa. Da nossa janela, vejo outros hoteis que parecem ainda dormir mas imagino que haja tanta gente como eu por aí fora, desejando a reposição interna dos fusos horários.