abril 26, 2011

Dias difíceis - segunda parte

As provações continuam. No dia em que pai e mãe planeavam voltar ao trabalho e o bebé Vicente à creche, vimo-nos a caminho do hospital a meio da madrugada. Ele novamente com dificuldades respiratórias, nós incapazes de perceber o que temos feito de errado. Desconfiamos que esteja tudo relacionado com dois dentes que começam a aparecer timidamente, o que poderia explicar a sucessão de diagnósticos diferentes no espaço de algumas semanas. Tem sido uma luta e temos trabalhado para fazer os tratamentos certinhos, tudo a horas mas é um pouco frustrante, olhar para trás e sentir que o que fazemos pouco tem importado para a melhoria da saúde do bebé Vicente. Temos portanto mais três dias em casa a tentar curá-lo e pô-lo fino para que possa(mos) voltar à vida normal.

Hoje, num mail da minha mãe, li duas frases que fizeram todo o sentido: Só aprendemos a ser filhos depois de sermos pais e Só aprendemos a ser pais depois de sermos avós. Sentir que estou a falhar perante tantos desafios consecutivos tem sido desgastante. E tudo isto tem impacto no resto da minha vida, no resto das minhas relações. Por transferência, parece que tudo em que me sinto inútil ou inadaptada no papel de mãe passa também para o resto das minhas relações e mina aquilo que antes funcionava com normalidade. Que o primeiro filho acarreta doses industriais de falhanços, erros e aprendizagem eu já sabia: tenho-o sentido na pele desde o nascimento do Vicente. Mas que o impacto dessa inadaptação transbordasse para o resto da minha vida - para isso não estava definitivamente preparada. E todos os dias desejo que ele passe rapidamente à próxima etapa, como se isso fosse apagar os meus erros e acabar com as minhas preocupações. Mas sempre existirão mais, sempre mais: as tropelias depois de andar, o largar da fralda, a primeira escola, as primeiras más decisões... Assusto-me tanto com o que ainda aí vem que penso que é agora que preciso parar, inspirar profundamente e voltar a tomar conta da minha vida, sem deixar que o stress, o medo e a insegurança alterem radicalmente a minha forma de lidar com o Mundo. E eu, a pensar que era só vê-lo crescer, dou comigo a crescer duma forma completamente imposta e forçada. E neste momento só espero não ceder.

abril 20, 2011

Dias difíceis

Primeiro eram dias que depois se transformaram em semanas. Para começar, uma tosse como um velho fumador de setenta anos; depois, a verdadeira tosse de cão; e finalmente, a tosse mais seca que já lhe ouvi. Já devemos ser conhecidos lá nas urgências pediátricas: afinal, já são três visitas em duas ou três semanas. E não sei se tanta urgência é excesso de zelo mas a verdade é que é muito difícil arranjar uma consulta de pediatria num curto espaço de tempo.

Há duas noites que o bebé Vicente (e a sua mãe cansada) não dormia mais do que intervalos de dez minutos intercalados com algum choro e irritabilidade. Eu ia trabalhar sabe-se lá como, completamente de rastos por passar a noite a caminho do quarto dele, sempre a duvidar da minha capacidade de me levantar às seis e meia da manhã depois de noites de pesadelo. Pensávamos nós que eram os dentes, que só isso podia explicar o desconforto, o queixume constante mas afinal vai-se a ver e o bebé Vicente ontem entrou nas urgências já com dificuldades respiratórias. O diagnóstico? Bronquiolite, uma espécie de praga que já marcou muitos dos bebés que conheço.

Já somos profissionais dos aerossóis e vamos alargando a farmácia cá de casa. Agora que o Vicente começa a perder todas as defesas que juntou durante estes seis meses de amamentação, os pulmões dele pregam-nos esta partida. A educadora dele já nos tinha dito, há uns dias, que ele não parecia ele, que andava muito chocho e pouco sorridente mas nós pensávamos que era o tal resultado dos dentes. Agora, depois de saber o que ele tem, é um pouco assustador compreender que nem sempre conseguimos perceber quando ele tem dificuldades em respirar e é muito triste imaginar que passava as noites acordado com o esforço dos pulmões. As idas ao hospital são desesperantes: são imensas horas de espera entre triagem, radiografias e resultados finais; são demasiadas crianças aflitas, chorosas, febris no mesmo sítio e um conjunto de pais que vão buscar forças sabe-se lá onde para não perderem a paciência; são médicos fartos dos seus turnos, sem uma palavra de conforto, sem uma pinga de humanidade a funcionar em modo automático.

O bebé Vicente não pode ir para a creche porque precisa de descansar muito e fazer a medicação toda certinha. É claro que me sabe muito bem ficar com ele, cuidar dele para ver as melhorias em primeira mão. Mas não consigo evitar pensar: num país em crise, as mães trabalhadoras não são bem vistas, são apenas fardos para as empresas e, de repente, subiu-me um medo do futuro que só as palavras tranquilizantes do meu chefe puderam apaziguar. A maior parte das minhas colegas são mais novas do que eu, raparigas em fase namoradeira, ainda sem pensar em ter filhos e não consigo deixar de pensar em como isso as coloca em vantagem. Resta-me esforçar-me no regresso para compensar este tempo porque realmente não há nada a fazer: é o meu filho que precisa de mim. E mesmo estando muito choroso e impaciente, tem as melhores bochechas do Mundo e o sorriso envergonhado mais fofo que existe. Espero que tudo passe depressa. Não, mais depressa ainda.

abril 13, 2011

Vinte e quatro meses ♥


Já são vinte e quatro meses mas podíamos contar os restantes vinte anos que já passaram desde que nos conhecemos. Há vinte e quatro meses atrás, eu andava ainda um pouco perdida, a ver os trinta chegar sem conseguir encontrar alguém de quem gostar a sério e que sentisse o mesmo por mim. Para dizer a verdade, eu já tinha perdido a esperança de encontrar a minha metade, ficando-me sempre por casos inconsequentes e vazios de significado - na minha cabeça, carregavam sempre uma ponta de esperança mas, agora que olho para trás, sei reconhecer o disparate daquilo tudo.

Há vinte e quatro meses que me sinto a pessoa com mais sorte no mundo e há dias em que me lembro, incrédula, da sorte que tive em encontrar (finalmente) a minha pessoa preferida. Encontrar não é bem a palavra, porque afinal já passam duas décadas desde que nos conhecemos e isto não é mais do que uma prova que aquilo que queremos está muitas vezes debaixo do nosso nariz e nós, complicados por natureza, insistimos em ignorar os sinais. São vinte e quatro meses de um projecto comum que surgiu naturalmente, sem ser discutido, um caminho de objectivos alinhados. Discutimos muitas vezes, zangamo-nos outras tantas mas no final sabemos que é isto que queremos. São vinte e quatro meses e um filho que nos veio encher de alegria, mesmo sabendo que não estamos a fazer nada pelo livro (namoro -> casamento -> bebés!), continuando namorados por tempo indeterminado, ainda pouco treinados para arranjarmos tempo para os dois. Uma noite, quando estava grávida, tive subitamente um ataque de saudades do casal que éramos na altura, apenas duas pessoas inseparáveis, ainda a aprender a viver juntas depois de muitos meses de distância.

Gostava que a nossa história desse um bocadinho de esperança a quem já se cansou de esperar ou a quem já está tão desiludido que deixou de acreditar num grande amor. Não somos perfeitos, longe disso. Mas gostamos tanto um do outro, encontrámos a pessoa que nos acelera a pulsação ao mesmo tempo que nos transmite a maior segurança do mundo, que acredito que esta sorte se possa replicar. Eu precisei de vinte e nove anos para chegar aqui, ok? Esta sensação de segurança infinita faz tudo valer a pena. E depois é esperar que os vinte e quatro meses se repitam muitas, muitas mais vezes.

♥ x 1250 + 12 + 3300

abril 05, 2011

Sweet tooth

Se há mudança que a gravidez operou em mim, foi esta: fiquei gulosa! Antes do Vicente, preferia mil vezes uma boa empada ou um rissol de camarão a qualquer coisa que fosse doce. O meu bolo preferido era o queque (há lá coisa mais seca e sem graça?) e só ficava realmente entusiasmada com uma bifana ou outro petisco do género. Continuo sem ser grande apreciadora de chocolate (um quadradinho chega-me perfeitamente) mas comecei a interessar-me muito por gelados e crepes, por queijadas de leite e, na prática, qualquer coisa que seja doce. Lembro-me que durante a gravidez comi uma daquelas pirâmides de chocolate por puro capricho mas com um persistente sentimento de culpa. Só que tinha sempre aquela desculpa que, se não comesse o que me apetecia, o bebé nascia com cara disso (!). Vai daí, este fim de semana estive na Feira da Doçaria Conventual e descobri que até consigo comer umas coisinhas com amêndoa e com muitos ovos. Não me bastavam já as alterações naturais que vieram com a gravidez, agora tinha que ainda gostar de coisas cheias de açúcar. Vou tentando substituir isto por fruta mas enfim, nem sempre consigo refrear esta vontade ;)

abril 04, 2011

Sobre o maravilhoso mês de Maio



(Os bilhetes tinham sido enviados no dia dezoito e deviam ter chegado um dia útil depois. Andavam perdidos em alguma estação de correios desde então, enquanto eu apresentava uma reclamação e maldizia o dia em que tinha decidido esta forma de envio. Já tinha perdido a esperança e fazia sérias contas para tentar perceber se poderia comprá-los uma segunda vez - certamente não poderia. O meu vizinho recebeu-os hoje e fez questão de os guardar e entregar. Eu fiquei radiante porque parece que afinal nem tudo são complicações por resolver e embrulhadas onde não tenho qualquer responsabilidade. Às vezes tenho azar mas também me esqueço muitas coisas se resolvem quando menos esperamos. Em Maio, terei (teremos) duas noites muito felizes e isso é tudo. Enquanto isso, vou-me preparando para aquele tipo de beleza que acabará por me fazer chorar.)