julho 29, 2010

So this is goodbye

Estou há uns três dias a arrumar a minha secretária. Já deitei os manuais e a papelada fora, já recuperei todas as variedades de chá que ficam para o Inverno, já devolvi todo o economato que não me fez falta e já deitei as guloseimas fora. Só me resta amanhã arrumar a mascote no saco e sair.

Amanhã a esta hora eu serei apenas mais uma desempregada, um fim que já se tinha anunciado há um ano mas no qual nunca quis acreditar até há uns meses atrás. Saio desta empresa de cabeça erguida, consciente de que fiz sempre o meu melhor, mesmo nos momentos mais difíceis e em todas as alturas que escolheram para me desiludir um pouco mais. Saio mais experiente mas também mais cínica e deixo para trás, quem sabe arrumada nalguma gaveta do side desk, parte da ingenuidade com que entrei aqui em 2006. Acumulei conhecimento sem preço, empinei formações em gestão, aprendi a contar com a inevitabilidade das pessoas mas nunca, nunca deixei de me surpreender. Viajei em negócios algumas vezes, vi-me obrigada a mentir e a ser mais transparente, avaliei e fui avaliada, subi a pulso numa cadeia hierárquica predominantemente horizontal. Nos últimos anos, passei indiscutivelmente mais horas com esta equipa do que com a minha família e amigos e por isso aprendi a conhecê-los e a diferenciar o trato entre eles: apanhei-lhes as manhas, adivinhava-lhe as tristezas mas nunca consegui que falassem de tudo e foi essa a minha grande derrota.

Daqui a umas horas, estarei livre mas desempregada e isso assusta-me, embora tenha passado os últimos meses a convencer-me que não. Sei que estou ansiosa porque ultimamente custa-me a respirar cada vez que atravesso a fronteira imaginária que separa este escritório do desemprego e já nem o ar condicionado me vale. No fundo, sei que, se só puder contar comigo neste futuro incerto, não estarei mal apoiada. Sei que arregaço as mangas para o que for preciso, sei que não páro de investir em mim e que, livre de toda esta pressão, serei uma mãe mais presente para o Vicente que está quase aí. Mas é duro na mesma e é, acima de tudo, muito frustrante saber que tudo o que fiz até agora não me segurou lugar nenhum. Mas se calhar não é bem desemprego, são férias. E se calhar não serão tempos mortos, que as dissertações não se escrevem sozinhas. Só que custa muito fechar esta porta e ando à procura duma maneira de não hesitar amanhã. Quando ouvir a porta bater, terei na mão uma liberdade infinita e não sei o que hei-de fazer com ela.

julho 26, 2010

O Vicente passeou pela Regaleira e banhou-se no Magoito!


O meu motorista e companheiro de passeio continua de máquina em punho.

Se há coisa que este Verão aprendi a agradecer foi o facto do meu pai ter insistido para comprar um carro com ar condicionado. Não é que o use sempre mas, em dias como o de hoje (41º na zona de Lisboa?! Mas ao que isto já chegou...), já me é completamente indispensável.

A verdade é que o nosso programa não foi grande ideia mas apenas por uma razão: eu sou uma mulher grávida de sete meses e tenho os meus meios de locomoção severamente afectados. Se me querem ver sem fôlego, é darem-me uns poucos lances de escadas ou uma subida mais acentuada e pronto, o facto de ter que respirar por dois afecta-me um bocado. Ora, posto isto, passear pela quinta da Regaleira e dar um mergulho no Magoito constituem um programa maravilhoso, especialmente quando estão uns 25º e se está no pico de forma. Adorei passar este dia fora de casa, mesmo com as temperaturas assassinas mas, chegada agora ao final do dia, estou quase incapaz de me mexer e desesperada por uma massagem na zona dos rins. O bebé Vicente porta-se muito bem nestes passeios e só dá sinais de actividade quando a mãe se senta a descansar um pouco. Acho que está crescido porque os movimentos na barriga da mãe mudaram bastante e são mais arrastados agora.

(Eu disse mesmo sete meses?! Bem, em alternativa posso pensar que faltam 71 dias. Ou até mesmo 10 semanas e um dia. Estou indecisa entre pensar que o tempo passa sem eu dar conta e lamentar-me do que ainda falta para vir...)

julho 24, 2010

Fazer ouvir a nossa voz

O meu cartão vermelho foi fotografado por ele.

Por norma, não sou mulher de fazer campanhas nem de querer impor as minhas convicções a outras pessoas. Gosto de discutir, é certo, mas normalmente fico-me por aí. Só que desta vez apetece-me mesmo falar sobre isto, nem que seja porque me parece cada vez mais absurdo que isto continue a acontecer em pleno século XXI.

Esta é a forma que encontrei para expressar a repulsa que sinto pelos casos de violência doméstica, quer se manifestem física ou apenas psicologicamente, sobre homens ou (mais frequentemente) sobre mulheres e crianças. Não há nenhuma relação nem nenhum laço de parentesco que justifique a aceitação e o encobrimento de actos de violência ou de humilhação. Nem mesmo filhos, especialmente não os filhos. Para mim, uma relação só funciona realmente quando ambas as partes se respeitam mutuamente e têm suficiente auto-estima para aceitarem (ou debaterem) as suas diferenças e trabalharem em conjunto para que elas desapareçam. Acho triste que todos nós conheçamos alguns casos destes, muitas vezes mesmo no nosso círculo de amizade mais próximo e que, de alguma forma e por variadíssimas razões, optemos por manter o silêncio.

A violência verbal, as traições sucessivas nunca devem ser toleradas. Sei do que falo porque já o senti na pele. Nos padrões ditos normais, aquilo que vivi não seria considerado abuso - antes, era visto como uma prerrogativa do homem à qual a mulher comum deveria sujeitar-se. Há padrões nestes comportamentos mas o importante é que a mulher consiga isolá-los, compreender as suas implicações e compreender que a vida não precisa ser assim. Felizmente, nunca me vi envolvida em nenhuma cena de violência de qualquer tipo mas acho que hoje é seguro dizer que, a acontecer, nunca a iria tolerar uma segunda vez. Toda a gente merece melhor do que uma personalidade abusadora, sem qualquer excepção e respeito na sua relação com os outros. É por isso que acredito que as vítimas devem falar: com linhas de apoio, familiares, amigos ou profissionais de saúde - não interessa com quem, desde que compreendam que não há nada que as possa obrigar a suportar a dor. Nunca precisei deste tipo de ajuda mas posso garantir - só depois de recusar a humilhação é que comecei a viver. E desde aí... Bem, sou muito mais pessoa que até então. Se é vítima de violência doméstica ou conhece alguém que seja, por favor fale. Ninguém tem o direito de abafar a nossa voz.

julho 22, 2010

Viver a três (e não, não se fala aqui de threesomes!)

Acho que, com a idade, me tornei bastante mais observadora. Gosto de ver, gosto de assistir à vida em silêncio, mesmo que isso possa ser algumas vezes confundido com voyeurismo. E o nosso curso pré-parto é obviamente um sítio privilegiado para estes momentos de observação, especialmente no que a casais (inexperientes) diz respeito. Esta semana, falámos sobre métodos naturais de alívio da dor durante o trabalho de parto e os maridos/namorados/companheiros foram convidados a praticar massagens nas grávidas com um relaxante som ambiente, à meia luz. Foi muito bom ver os olhares embevecidos dos homens, derretendo-se com a mãe do seu filho/filha exercitando as ancas sobre uma daquelas bolas de pilates. O que realmente me comoveu foi a sensação de que há famílias efectivamente a crescer ali, que medos e responsabilidades são partilhados, que a gravidez é ali vivida como um glorioso momento a dois.

É por saber que este companheirismo e esta dedicação não são dados adquiridos que estes momentos me comovem. Imaginar que há homens que não se envolvem na gravidez das companheiras, que recusam ajudá-las e compreender as diferentes fases da gestação, que se afastam deliberadamente para evitarem chatices dói-me. Eu sei que se estivesse sozinha nunca poderia desfrutar desta fase da minha vida na sua plenitude nem muitas vezes teria força para suportar as contrariedades. E quer dizer, um filho é feito por duas pessoas. Se aconteceu na pior altura ou na altura menos esperada, acho que a única coisa a fazer é comportar-nos à altura e fazer tudo para que o bebé que aí vem nasça com saúde e possa ser feliz.

É óbvio que eu estou ansiosa por ver e tocar e cheirar o meu filho. Conto os dias e muitas vezes sei até quantas horas faltam até à data prevista para o parto. Mas a verdade é que, cada vez que penso que vamos deixar de ser apenas um casal, dá-me uma saudade profunda deste momento que ainda estamos a viver. Não me importa a relativa perda de liberdade, nem a necessária cambalhota nos nosso hábitos: fico é com saudades de vivermos apenas um para o outro, capazes de ficarmos fechados em casa, sem vermos mais ninguém porque nos bastamos. Mas sei que quando um bebé chega a uma relação que funciona não é mais do que o prolongamento destes momentos felizes vividos a dois. E para namorar, já eu decidi, hei-de arranjar sempre tempo.

julho 19, 2010

A minha inimiga nº 1: a balança

O mais-que-tudo documentou o início da refeição*.

Bem, eu gosto de comer. Aliás, desconfio sempre daquelas pessoas que não comem ou que dizem que não gostam de comer ou comem apenas por obrigação - fico sempre com a sensação de que não podem ser boas pessoas. Além disso, gosto muito do ditado que diz que Quem não é para comer não é para trabalhar, até porque já tive oportunidade de o comprovar variadíssimas vezes. Há uns anos, fui vista por uma nutricionista e só eu é que sei a disciplina que foi precisa para comer bem, satisfazer-me e ainda assim ficar em forma. 

A gravidez não estava a implicar grandes alterações nesse campo até aqui: obviamente estava mais gorda mas tinha sido uma evolução muito lenta e bem distribuída. Também ajudava o facto do bebé ainda não precisar de engordar, já que se se estava a formar lentamente. Mas agora enfim, o bebé está formado e vai começando a precisar acumular a gordura para que esteja pronto para enfrentar o mundo cá fora. E o meu apetite nem tem crescido exponencialmente, nem tenho sentido vontade de comer por dois. Mas a última visita à obstetra deixou-me bastante aborrecida (para não usar nada mais forte...) comigo mesma e com um certo receio dos meses que ainda me restam. A sete dias de trabalho de ficar finalmente livre e com demasiado tempo nas mãos, junto o meu apetite e tenho tudo para acontecer aqui outra desgraça - portanto, ainda bem que não tenho balança. Resta-me invejar aquelas grávidas quase em fim de tempo a quem cresceu apenas a barriga e maldizer o meu metabolismo lento. 

* levámos o amigo suiço e a namorada belga a comer neste restaurante e  nem o facto de ser exclusivamente vegetariano me fez cobiçar menos a comida: o serviço de buffet é maravilhoso, os sumos naturais são mesmo naturais e as sobremesas chegam para dividir por duas ou três pessoas. Peçam para ficar no terraço, se lá forem ;)

julho 14, 2010

Ser turista em Lisboa ♥

Aproveitando a visita de uns amigos suiços (e depois de experimentar as maravilhas da ineficiência da Loja do Cidadão), fizemos uma ronda por alguns sítios que estão na nossa lista dos must see. Levámo-los a beber uma ginja no Rossio, ritual que eu, pelas razões óbvias, dispensei. Passeámos pelo Chiado e subimos até ao Largo do Carmo para ver as vistas do elevador, misturados com hordas de espanhóis e alguns holandeses. Depois descemos até ao miradouro de Santa Catarina para sentir aquelas vibrações de final da tarde e terminámos a fazer metade do caminho de regresso a casa a pé e metade no 28, que isto de estar grávida não é doença mas dá cabo das articulações a uma pessoa.

Dizia eu à nossa amiga que muitas vezes tenho pena de não ser turista em Lisboa, especialmente nesta época do ano. É incrível a luz, o calor temperado com a brisa que sobe do Tejo, os dias que parecem nunca acabar, os petiscos para descobrir esplanadas fora, as ruas que vibram com as diferentes línguas dos turistas e os hotéis a doze euros por noite (!). Passamos os dias entre casa e trabalho, de metro, autocarro ou eléctrico sem prestar atenção, sem nos deixarmos maravilhar com os pormenores desta cidade. Mas pelo menos conseguimos passar algum do nosso fascínio a outros e pode ser que eles, como nós um dia, queiram muito voltar.

julho 08, 2010

Aprender a ser mãe (?)

Iniciámos ontem o nosso curso pré-parto neste centro aqui. Uma das primeiras coisas que me marcou foi o facto de, à excepção de um pai de vinte e nove anos, os restantes casais estavam todos pela casa dos trinta. Esta ideia de que cada vez somos jovens até mais tarde ou de que adiamos as responsabilidades até podermos está a atrasar-nos a parentalidade, as descobertas, as famílias. Eu não sou propriamente uma rapariga com pressa e nunca me passaria pela cabeça formar família só porque sim, mas vejo que temos andado a perder uma grande coisa!

Descobrimos durante a apresentação que fizemos e parece que alguém não ficou muito contente por nós também irmos ter um Vicente [vá lá, pessoas que não nos conhecem de parte nenhuma, com as quais muito provavelmente nunca nos iremos cruzar, qual é o problema de gostarmos do mesmo nome?]. De resto, foi relativamente interessante partilhar as nossas expectativas com pessoas na mesma situação, embora o sentimento de ansiedade fosse geral. E, como se eu não tivesse já uma dissertação de mestrado em que pensar, ainda temos umas duzentas páginas de material para acompanhar o curso. Planeio ler tudo mas não consigo evitar pensar que no tempo da minha mãe este tipo de acompanhamento tão próximo não se fazia e os bebés nasciam na mesma. Parece que se perde um pouco da magia quando se quer saber tudo e estar preparado para tudo, como se um bebé não fosse em si uma absoluta surpresa.

A parte alta da noite foi a sala escura onde nos iniciámos nas virtudes da correcta respiração e das suas vantagens para o parto. Guiados pela enfermeira, mães e pais relaxavam, tentando visualizar o seu bebé quando o estômago do pai do Vicente resolveu acabar-nos com o que existia de concentração! Havemos de treinar mais em casa, a ver se conseguimos também controlar-lhe as entranhas!

julho 05, 2010

Sabem aquela coisa dele ser o melhor do Mundo?

É igualmente válida para o exagero. A vontade de agradar e de me encher de melancia tem destas coisas. Eu adoro, é óbvio.

julho 04, 2010

Fazer pelos outros

Na passada Sexta-feira fomos jantar com mais umas oitenta pessoas que são, no mínimo, inspiradoras. A ideia é convivermos um bocado e, simultaneamente, ajudar uma instituição que se encontre com mais dificuldades. Esta foi a primeira acção do RT Action e a instituição escolhida foi a Ajuda de Berço, para a qual os comensais eram convidados a levar comida, produtos de higiene e limpeza ou produtos farmacêuticos. A ideia é levar um pouco mais além os peditórios nacionais ou a boa vontade espontânea e conhecer pessoas empenhadas e determinadas em fazer a diferença. Muitas destas pessoas estão presentes em várias redes sociais e houve inclusivamente figuras públicas que se quiseram juntar ao evento. Ficamos à espera de um novo evento e aproveitamos para espalhar a notícia: ajudar enquanto convivemos nunca é demais!

julho 02, 2010

Com licença, que se vai desabafar.

Eu hoje vinha aqui escrever um post inteiro dedicado à forma como odeio pessoas no geral. Acho que a culpada é esta minha situação no trabalho: apenas obrigada a trabalhar três dias por semana (obrigada pelo crédito de horas, pessoas que inventaram os despedimentos colectivos!) mas cansada de vir apenas por obrigação, tendo que fazer as mesmas recomendações todos os dias, lembrando as pessoas das mesmas responsabilidades todas as santas manhãs. Estou incrivelmente farta das pessoas que me tentam fazer passar por parva, especialmente depois de quatro anos de percurso profissional lado a lado, sem respeitarem hierarquias nem colegas. E eu sei que toda a gente está cansada e apenas deseja que chegue depressa o dia trinta e um para se poder fazer à vida mas caramba, era preciso dificultar as coisas até no final? Depois de terminar a escola e eu não ter rigorosamente mais nenhuma obrigação pendente, pensei que fosse possível relaxar e levar estes últimos dias com tranquilidade mas não, parece que ainda não é desta.

E depois, que dizer das pessoas nos transportes públicos que reclamam comigo porque eu não pedi o lugar das grávidas? E tentam que as restantes passageiras condenem com esta barbaridade e me passem na hora um atestado de negligência? Ou o que fazer com as pessoas que tentam passar-me à frente nas caixas de supermercado, mesmo quando não existe nenhuma caixa prioritária e depois conseguem fingir que não me viram? Caramba, eu estou grande! E também gostava de saber o que dizer quando a pedicure a acabar o seu curso faz questão de me contar daquela vez em que estava na sanita a fazer um teste de gravidez, enquanto o marido a pressionava ao telefone.

Não, peço desculpa, mas não gosto de pessoas. Não sou eremita porque não me deixam e lido muito bem com as pessoas que me designam de anti-social. E todos os dias é mais difícil acreditar nessa treta de que sou muito boa a trabalhar em equipa porque neste momento já não tenho pachorra para a equipa que me calhou em sorte e, depois de quatro anos, quero apenas um pouco de distância. Provavelmente, isto passa-me assim que soarem as seis horas e eu puder pensar em mais quatro dias longe desta secretária. Mas, até lá, eu odeio pessoas. Espero que o gaiato seja imune à minha má disposição.