Já fui e já vim. Foi tão rápido mas pela primeira vez sinto que consegui aproveitar os dias da melhor maneira. Vi céu azul em quantidades generosas, o casario de Lisboa de vários ângulos possíveis, a margem Sul debaixo de uma névoa fininha, o meu jardim, a nossa casa. Mas o que trouxe mesmo de bom foi saber que as pessoas, mesmo longe, continuam a gostar de nós.
Ir embora tem muitas desvantagens, já as debati tantas vezes, já as pensei outras tantas e mais virão por aí - não posso contê-las. Mas trouxe-me a surpresa que é ver, uma e outra vez, que as pessoas ainda perdem um pouco do seu tempo a ver-me, a escutar-me, ainda me convidam, combinam, esperam, mesmo quando as visitas são de fugida (sempre...). Sinto-me intensamente viva sempre que regresso: afinal vou a casa, afinal repito os mesmos caminhos e rotinas, inspiro Lisboa tão fundo quanto posso, perco-me a imaginar o que seria se ali tivesse continuado. Não continuei e por isso vivo todos os regressos com uma antecipação nervosa, uma excitação que posso disfarçar mas não evitar, absolutamente certa do bem que estar lá me vai fazer.
Mas partir também tem essa parte mais triste: essa ideia de que, como estamos longe, vamos passar a ser dispensáveis, secundários, intermitentes e ausentes. Tenho sorte, temos sorte porque a gente continua a querer-nos bem. Nós saímos e vivemos concentrados na nossa vida para não nos magoarmos mais, espreitando quem ficou sempre com a alegria de ver quem a gente gosta, com o entusiasmo de ir sabendo as coisas mesmo sem nos beijarmos e abraçarmos, sem nos tornarmos mesmo reais. Porque aqui, longe, somos apenas a ideia de quem fomos no nosso país. Estamos distantes, deixamos de existir um bocadinho porque fomos nós que saímos, fomos nós que escolhemos partir. E então voltar é bom porque sentimos que nos perdoaram essa falta, a maior falta que é não estar.
Não posso realmente explicar como foi bom regressar, comer peixe grelhado numa ruela da Baixa, esperar em vão pelo eléctrico, explicar à minha vizinha porque raio agora vamos aparecendo por ali, conhecer pessoas que fazem felizes outras pessoas a quem queremos bem, conversar à frente de uma cerveja e de um rolo de salsicha, sentar-me mesmo à beira do Tejo e ficar até achar que se calhar estava a começar uma insolação, receber abraços, ver barrigas crescidas e outras que querem crescer, escutar a minha gente. São as pequenas coisas que contam, é esta imensa sensação de paz quando os dias são cheios e acabam em beleza e damos voltas intermináveis à procura de um lugar de estacionamento à porta de casa. É que dá para viver longe, dá para a gente se adaptar e aceitar uma nova vida, dá até para se começar a flirtar com outro país - só não dá para fingir que estamos completos sem tudo o resto. Sem vocês.
2 comentários:
tenho pena em não te ter encontrado, mas fico ainda mais feliz porque afinal estiveste sempre bem acompanhada e foste "cheia " desta cidade. Tem piada que te queria precisamente falar nos regressos e numa conversa que no outro dia apanhei, de alguém que queria regressar mas tinha medo que isso significasse falhar. Ir e vir é apenas uma viagem, uma passagem. O importante é estarmos onde nos sintamos em casa. De todas as pessoas que conheço e que emigraram tu és a única que continua a carregar esta cidade e as suas memórias dum modo tão intenso e saudoso . Pode não querer dizer nada, mas pergunto-me sempre: ainda falta muito? ;-)
beijos, muitos
Para a próxima vens visitar-nos tb. Em casa, na rua, em qualquer canto! :D E mesmo de fugida conta! Beijinhos a todos
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