O meu desencanto crescente com as redes sociais levou-me recentemente a concluir que tudo o que eu quero ser, neste momento, é neutra. Por um lado, temos as pessoas que se indignam com as coisas mais absurdas (José Cid e Trás-os-Montes, Henrique Raposo e o Alentejo, o gorila abatido para salvar uma criança... and so on, and so on), partindo mesmo para os insultos e até para as ameaças de ofensas corporais. Parece que vivem para estes momentos, para cuspir todo o fel que vão acumulando sabe-se lá como, para demonstrar uma superioridade virtual sem qualquer valor, para exorcizarem os demónios do seu quotidiano. Imagino a raiva que lhes corre nas veias enquanto escrevem os comentários agressivos, desprovidos de qualquer bom senso, convencidos de que agora vale tudo e tudo implica ameaçar de morte até a família dos implicados e todo o tipo de impropérios em nome da liberdade de expressão. Não há qualquer discussão construtiva, pensada e repensada, não existe consideração pelos interlocutores, não há civismo nem respeito pela ortografia: há apenas a agressão gratuita, o sangue que ferve por tudo e por nada, o tempo perdido com fait divers, enquanto o Mundo continua a acontecer lá fora. Toda a gente sabe que as caixas de comentários internet fora são um caso de estudo, tal é o tamanho do ódio, do desprezo e da falta de empatia de quem por lá paira. Muitas vezes, preciso de deixar de ler comentários para acabar com o mal-estar que a falta de humanidade me provoca.
Mas também há o lado oposto, o lados dos yes-men e yes-women. Aquelas pessoas que concordam com tudo e que precisam comentar a dizer que têm a mesma peça de roupa ou que já foram ao mesmo restaurante, como se isso fosse importante para a sua validação. Quero acreditar que não escrevo para gerar esse tipo de consenso oco, fabricado - antes, quero apenas partilhar ideias, materializar o que me muitas vezes me atormenta/alegra, cristalizar momentos tão diversos da minha vida. De qualquer maneira, não tenho esse público e não sou esse modelo de pessoa. E não aguento tanta gente a perguntar de onde é o casaco e onde é que se comprou a louça e onde é que podem encontrar o mesmo papel de parede. Parece que hoje algumas pessoas perderam a capacidade de pensar por si, de partir à descoberta das coisas que os fazem felizes, de procurar lojas de decoração e vagas de emprego, de arriscarem a ter gosto pessoal.
Tenho cada vez menos vontade de opinar sobre qualquer coisa. Por um lado, não quero reagir intempestivamente, acusar e esquecer-me de que nem sempre conhecemos as razões dos outros. Quero pensar e ponderar as minhas reacções, quero trabalhar na minha empatia e lembrar-me que um dia também me pode acontecer a mim. Não quero ser injusta nem arrastar outras pessoas para o lamaçal das críticas sem fundamento. Também não quero saber onde compraram a saia, a mala e o caderno - posso apreciá-los, elogiá-los mas não preciso que sejam meus. É claro que meço as minhas palavras e muitas vezes não escrevo tão livremente porque sei que há um público que me lê mas também não quero ser escrava desse público. Não quero ser exemplo para ninguém (bem, talvez para os meus filhos) nem quero precisar dos outros para me sentir válida. Sinto-me num momento importante das redes sociais, num cruzamento em que devo escolher entre partilhar abertamente e limitar essa partilha e cada vez pendo mais para esse encerramento sobre mim mesma. Porque estou cansada dos justiceiros sociais que não lutam pelas causas fora da internet e se indignam azedos, com a sua falta de humor. E também dos seguidores cegos, para quem um estranho é um modelo de virtudes e de perfeição. Dá para criarmos a Suiça da internet?