Três cromos do Euro 2016 entre os tapetes do carro. Um boletim de vacinas e uma bola de borracha dentro da mala. O desenho tosco de um tubarão a sorrir como protecção de ecran. A trotinete quase à porta da rua. A árvore genealógica com colagens e fotografias mal cortadas à porta de casa.
Há uns tempos atrás (o que me parece hoje uma eternidade, diga-se de passagem), fui criticada porque o meu blog tinha deixado de falar sobre aventuras, dores do coração, amores não correspondidos para me dedicar mais ao filho que me tinha acabado de nascer. Na altura, fiquei triste porque queria continuar a ser a mesma rapariga livre que podia sair para concertos ou encerrar-se em casa, podia viajar sozinha, sofrendo ou florescendo de amor. Fiquei triste porque alguém me estava simplesmente a fazer ver que eu tinha mudado, uma ideia a que eu parecia simplesmente estar a resistir.
De há uns tempos para cá, aceitei finalmente que não posso (nem quero) ser a mesma pessoa que começou a escrever este blogue. Detesto a ideia de me tornar apenas numa mãe mas acho que é saudável admitir que os meus filhos são uma parte (muito, muito) importante da minha vida sem que isso anule a pessoa que eu quero ser e para a qual tenho trabalhado muito. Não quero ser a mulher que se deixa atropelar pelos caprichos dos meus filhos: quero poder fazer-lhes muitas vontades, ao mesmo tempo que quero fazer o mesmo por mim. E pelo meu marido, claro. Quero ter tempo para brincar deitada no chão e para beber um copo de vinho, para pintar páginas intermináveis de livros de colorir e acompanhar as séries de que mais gosto, levá-los aos aniversários dos amigos e levá-los a ver o Mundo, inventar jogos infantis e conversar com outros adultos. Não quero que um dia os meus filhos saiam de casa e eu fique mais vazia do que é suposto ficar.
Eu tenho lutado por manter este equilíbrio, embora já tenha percebido que enquanto os filhos forem pequenos, ele será mais ténue. Mas não posso evitar vê-los em todo o lado porque eles têm esta maneira subtil de se insinuar em todas as coisas, de deixar pequenas lembranças nos sítios mais inusitados, de ter conversas de que me lembro e vou rindo ao longo do dia. No outro dia, começou uma trovoada e a primeira coisa em que pensei foi que o Vicente tem medo e em como gostava de estar com ele para o tranquilizar. Uma pessoa pode lá escolher quando não quer ser Mãe ou quando precisa de tempo sozinha - os filhos estão em todo o lado e sempre quando menos se espera.
E é quando penso que, daqui a não muito tempo, eles não vão querer estar tanto conosco (como todas as crianças, diria eu) que decido: abraçá-los é aqui e agora, fazer-lhe cócegas não pode esperar, as suas ideias inocentes mas criativas transformam-se na melhor conversa. Temos todos tempo de nos voltarmos para dentro à procura de quem somos. Por isso, permito-me que eles invadam a minha vida, todas as assolhadas da nossa casa, os meus pensamentos, o carro e mais a mala. Um dia volto a ser só eu mas há-de ser sem me arrepender de ter sido mãe a toda a hora.
4 comentários:
Havemos de ser Mães sempre, e ainda bem!
Beijinhos grandes 3x4
FVC
Querida, ter filhos pequenos é assim, estão sempre por todo o lado, desde o risco na parede aos brinquedos por toda a parte...
Goza-os bem pois, logo, logo estão a deixar um lugar vazio na mesa!
Bjis
D
Só para dizer que descobri o blog esta manhã e já li mil coisas, desde o começo da vida do Vicente à ida para o Luxemburgo e estou maravilhada. Tão bom descobrir blogs novos, cheios de vida, de experiências, de coisas boas para descobrir. E que bem que escreves (pode ser por tu?)! Comovi-me verdadeiramente com imensas coisas que fui lendo. Desejo que tudo continue a correr bem e estarei, certamente, deste lado para acompanhar tudo o que há de vir.
Beijinhos, queridas F e professora Dalma :)
Obrigada M pelo comentário e ainda bem que continuas por aqui. Espero que ainda tenhas muito mais a acompanhar nesta história que se vai escrevendo com o tempo :)(e por tu, sim, sempre que posso e a ocasião o permite!)
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