setembro 29, 2018

Ao Vicente, que fez de mim mãe há oito anos atrás

Há oito anos atrás, neste dia, nascia o bebé Vicente. Eu tinha feito uma carrada de testes de gravidez para ter a certeza de que vinha mesmo aí um bebé, estava a rebentar de felicidade e de pânico simultaneamente. Tantas fantasias e expectativas, tanto tempo para fotografar a barriga que crescia e pensar em nomes e adivinhar-lhe as feições. Era meio dia e quatro do dia vinte e nove de Setembro de dois mil e dez e numa sala de partos no hospital CUF Descobertas chegava ao mundo Vicente Mauricio Tavares, puxado por um par de ventosas e já a dar provas das sua teimosia.

O Vicente foi filho único durante quase cinco anos. Nesse período, vivemos os dois (pai e mãe) centrados nesta pessoa pequenina que não gostava de dormir, que fazia as maiores birras (mal sabíamos o que o futuro nos reservava...) mas que era doce e mimoso, que brincava tão bem sozinho, enfileirando os carrinhos casa fora, que coloria com entusiasmo e fora das linhas, que gritava quando via tractores e moto-quatros, que já gostava de livros e detestava trovoadas. Durante cinco anos, todo o nosso afecto era dele, a nossa atenção não era dividida, estávamos ali ininterruptamente mas apoiar nas noites em que não dormia, quando estava doente, quando mudou de escola. Por ele chorei quando me soube à espera do segundo bebé: então e se não fosse capaz de sentir o mesmo amor? E como se sentiria o meu menino, a dividir o seu espaço com um outro bebé, sem que a nossa atenção fosse toda dele?

Fast forward para os dias de hoje: Vicente tem uma irmã e um irmão que olham para ele com muito amor e admiração. É teimoso como a mãe e só descansa quando consegue o que quer (ou quase, que nem sempre se pode ceder às vontades deles). Chora quando lhe passa pela cabeça que vamos morrer (já disse que não queria morrer porque deixaria de jogar futebol, deixaria de poder comer gelados ou deixaria de poder fazer cocó...) e acha que nunca vai querer sair da casa dos pais (Mãe, quero viver com vocês para sempre!, diz ele, ainda desconhecendo as mudanças que chegarão com quinze, dezasseis, dezoito anos...). Está indeciso entre ser futebolista e piloto (de qualquer coisa, o veículo ainda não está definido mas talvez seja um avião, para que possamos viajar com ele e onde nos vai preparar refeições especiais, segundo ele). Quer começar a falar Alemão comigo em casa, fala Luxemburguês perfeitamente, vai retomar agora o Francês e percebe a maior parte do Inglês que ouve por aí. Tem uma grande necessidade de aceitação e, por isso, nunca quer ter caracóis porque esse não é o cabelo fixe. Quer pertencer a alguma coisa e por isso diz Bom dia! a viva voz a todas as crianças que encontra no caminho da escola. Sabe o nome de todas, mesmo que elas nem desviem o olhar do caminho. O que mais o aborrece são as coisas previsíveis e que deve fazer todos os dias: lavar os dentes, tomar banho, arrumar a mochila. Quer participar nas tarefas da casa: quer lavar a louça, faz birra para cozinhar, gosta de arrancar ervas daninhas ou tratar da relva, limpa a mesa depois do jantar.

Às vezes dá-me vontade de gritar, como quando exclui um dos irmãos das brincadeiras ou quando deixa o saco do futebol cheio de roupa suja no meio do corredor. Às vezes dá-me vontade de chorar de tristeza, como quando nos contou que muitos meninos lhe bateram ao mesmo tempo ou como não compreende só ser violento não é compatível com ser amigo. Mas na maior parte das vezes só me enche o peito de Amor, como quando me olha nos olhos e eu me lembro que ele foi o meu primeiro bebé, quando repete que me adora, quando quis casar comigo, quando o vejo a aprender tanto e a ter ainda mais vontade de aprender. O meu menino faz oito anos e daqui a bocadinho tem barba e bigode mas há-de ser sempre a minha primeira pulguinha.



(porra, como é que já tenho um filho de oito anos?! Aaaahhhhh...)