Queria chegar lá hoje.Ou queria estar lá já. Enfiava-me pelas ruas que já conheço tão bem e perdia-me debaixo daquele céu cinzento, debaixo dos toldos das Laden. Queria tanto poder sentar-me num comboio, cheio de bicicletas e gente suja e gente que também deixou tudo para trás. Sentava-me num café, pedia uma imitação barata dum galão e escolhia a mesa junto à montra, só porque assim era mais fácil não ver o tempo passar. Fechava os olhos e deixava-me estar, a pensar como um dia aquilo também podia ser meu. Podia enfiar a cabeça no Spree e lavar a minha alma, expulsar o desasossego e espalhar a dor pelo rio. Podia estar lá, a pensar como já lá tinha sonhado mas que ainda vou deitar muitas vezes a cabeça debaixo daquele céu. Desligava a cabeça da língua à minha volta, perdia-me mais dentro de mim e era só eu, entregue à minha vontade, como nunca pensei que poderia ser. Queria que fosse hoje mas talvez consiga dormir até chegar lá.
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