julho 03, 2013

Portugal (visto de fora)

Não é por estar longe que deixo de acompanhar o que se passa no meu país. Continuamos a ter televisão portuguesa e, claro, o benefício da internet, que nos deixa escolher o que queremos saber. Não é por isso de estranhar que, depois dos últimos dias, sinta uma angústia bem maior que o costume quando penso em Portugal.

Percebo pouco de política e a verdade é que anos a assistir à troca de cadeiras em cargos públicos mancharam a maneira como eu olho para a classe política em Portugal. O escandaloso mundo dos favores que se fazem debaixo da mesa, o cargo que se oferece independentemente das qualificações ou da competência, a minoria que se continua a rir e a viver rodeada de luxos enquanto a maioria luta já um pouco desesperadamente por sobreviver, por se manter à tona, as decisões de bastidores e até a falta de soberania em governar um país que é nosso - tudo razões por não acreditar em nenhum candidato, nenhuma força partidária e limitar-me a escolher o mal menor. Enquanto estive em Portugal, cumpri os meus deveres cívicos e votei. Digo até mais, nunca votei em branco e agarrei-me sempre à esperança mais ínfima de que alguma coisa iria mudar. Mas não vai, sei-o há muito tempo.

Vejo três grandes problemas no Portugal de hoje, sem grande profundidade de análise, só a opinião de uma cidadão sobre o que vê no seu país: primeiro, a questão do cumprimento do memorando e as consequências que isso tem trazido a Portugal, que se vê hoje ainda mais atolado em dívidas do que quando foi pedida a ajuda; a falta de alternativas e também de coragem que a população demonstra ao escolher sempre mais do mesmo; e finalmente, a maneira promiscua e quase obscena como a sede de poder acaba com todo e qualquer desejo real de contribuir para um país melhor. Parece que ter poder significa automaticamente esquecer ideais, batalhas a travar, justiça social e o bem comum. Parece que ter poder só serve para enriquecer quem está no topo. É muito difícil acreditar no meu país e isso é triste porque deixei para trás os meus amigos, a minha família que continuam a sofrer as consequências do desnorte.

Desde ontem que a angústia é um bocadinho mais física, assim aquela sensação no estômago como se estivesse a cair sem o chão à vista, uma vertigem desconfortável. Eu vejo o país que escolhi para viver e não entendo como podem existir uma diferença tão abismal nas maneiras como a governação é entendida. Aqui não há corrupção? Se calhar há, não o posso confirmar nem desmentir. Mas deixo só um exemplo: há uns tempos atrás, li uma notícia num jornal nacional sobre as obras públicas. Dizia a notícia que em quinze grandes obras públicas, doze delas ficaram abaixo do orçamento inicialmente previsto. Doze delas! Alguém consegue imaginar isto em Portugal? Alguém consegue imaginar que não se favoreçam empresas de amigos e família, que se tente reduzir as despesas ao mínimo indispensável para terminar a obra, que se faça bom uso dos dinheiros públicos? Eu não conseguia, até sair de Portugal.

Se até ontem mantinha a ilusão (ténue, é certo) de regressar assim que possível a Portugal, acho que ontem caí de novo na realidade e sei que o meu lugar vai continuar a ser longe dali.

3 comentários:

Helena Barreta disse...

Em Portugal, entre outras coisas, há uma que me deixa sempre angustiada e "à toa" que é, o que a obras públicas diz respeito, quando o Tribunal de Contas vem informar que a obra X e Y custou mais 10, 20, 30 vezes mais do que estava previsto e não se passa mais nada, os responsáveis não são chamados a explicar o porquê de se ter gasto mais e siga, ficamos a saber o que já sabíamos, ou seja, que os responsáveis nunca são punidos. E na próxima obra faz-se o mesmo.

Ana disse...

Apesar da angústia de estares longe, de certeza que em alturas tão agitadas como estas em Portugal, também deves sentir um grande alívio por estares "livre" destas trapalhadas.

Posso sugerir um tema para um post? Como tem sido a (nova) vida social no Luxemburgo? Tens conseguido fazer novas amizades, sair com pessoas novas e criar ligações de amizade? Como é fazer isto do zero?

Continua com este fantástico blog :)

sofia disse...

ola. hoje por mero acaso vim parar ao seu blog. adorei.. fez-me pensar muito. estou em vias de ir para o lux (o meu marido vai este mês) e gostava de saber se podemos contatar por email, fb ou outra coisa.. beijinhos.
o meu mail é asbmesquita@gmail.com