Enfim, voltámos ao frio e ao cinzento do Luxemburgo. Estivemos uns dias em Portalegre e outros por Lisboa, a tentar meter em quinze dias tudo o que temos vontade de fazer no resto do ano. Uma conclusão óbvia de que já me devia ter apercebido há muito tempo? Não dá. É literalmente impossível ver toda a gente de quem sentimos saudades, ver quem conseguimos durante tempo suficiente, visitar todos os sítios que nos fazem falta, comer todas as coisas com que sonhamos no resto do ano, absorver todo o Sol que não vemos por aqui. Não conseguimos e isso torna estas viagens num momento um pouco frustrante. É como se, secretamente, tivéssemos a esperança de conseguir enfiar a nossa vida anterior num espaço de tempo tão curto, conseguindo satisfazer tudo e todos. Não é que passemos o ano inteiro à espera disto mas não podemos fingir que estas duas semanas são importantes para nós.
Nos primeiros cinco dias, parecia que não tínhamos saído do Luxemburgo: algum frio, nevoeiro cerrado e muita, muita chuva. Não dava para sair de casa, o miúdo estava a precisar de libertar energia, nós precisávamos de um bocado de ar fresco. O stress e a frustração de não podermos aproveitar o tempo como tínhamos imaginado acumulavam-se.
Mas depois o tempo mudou, o miúdo ficou com os avós em casa e nós fomos visitar a nossa Lisboa. Como ainda temos a nossa casa na Estrela, a sensação é a de que vamos para o nosso hotel privado, uma casa que está sempre livre, sempre à espera de nos receber outra vez. Como antes, ficar na nossa casa é tranquilizador e algo doloroso ao mesmo tempo. Há demasiadas memórias que ganhei naquele pequeno espaço desde o dia em que a comprei, há seis anos atrás. Passei lá muitos dias tristes mas muitos, muitos dias de serenidade, de descoberta e da tranquilidade de que me faltava. Acabámos a gostar dos nossos vizinhos, acabámos apaixonados pela rua e zona envolvente, acabámos por construir uma rotina que tentamos recriar sempre que voltamos. Só que não é bem a mesma coisa porque sabemos que tem, à partida os dias contados.
Foram dias muito bons: pudemos ir ao cinema a meio da tarde, comer uma sapateira em Sesimbra e um brunch na LX Factory, andar de eléctrico entre os Anjos e a Estrela, beber minis e comer picapau na tasca da nossa esquina, passear pela Arrábida e por Sintra, ver a família e (melhor) deixar que pudessem matar as saudades do Vicente com tempo, comer o suposto melhor hamburguer de Lisboa, andar pela Baixa e beber um copo na Bica, rever antigos colegas e bons amigos, sentir a temperatura da noite sem precisar de um casaco, ter o miúdo nos baloiços da Estrela, comer tremoços e frango assado, dormir a sesta ao som do eléctrico e dos sinos da basílica, maldizer o trânsito e louvar a beleza de Lisboa, respirar o Tejo e confirmar como agora a cidade está mais virada para ele. Só faltou tudo o resto e, mais importante, a sensação de poder fazer tudo isto quando nos apetecesse, sem voos pelo meio, sem temperaturas de congelar, sem a distância que nos separa do nosso país.
Continuo a gostar do Luxemburgo, que não restem dúvidas. Continuo certa que tomámos a melhor decisão, que as vantagens equilibram bem as desvantagens mas isso não significa que o meu coração não me diga que era em Lisboa que gostava de estar. Uma das perguntas que mais nos fizeram nestas duas semanas foi quando pensávamos voltar. Com toda a honestidade mas sem termos pensado muito nesse assunto, respondemos que não fazemos a mínima ideia. Não podemos dizer para o ano, daqui a cinco anos ou nunca - estas coisas vão-se decidindo ao sabor dos dias cinzentos aqui e do Verão tardio do lado de lá. Parece-me estranho mas querer voltar não significa necessariamente querer deixar tudo o que temos aqui e sabemos que se um dia isso acontecer vamos ter muitas saudades do que vivemos, construímos e aprendemos aqui. Se calhar o verdadeiro castigo é mesmo este, termos o coração dividido em dois, amar duas cidades e dois países e querer estar sempre onde não estamos. Vamos vivendo, enfim. E reconhecemos que somos felizardos por podermos viajar com esta regularidade - afinal de contas, o Mundo está mesmo aqui ao lado.