fevereiro 18, 2014

(e para contrariar o positivismo do post anterior...)

Isto já me passa, eu bem sei. Dorme-se sobre o assunto, dão-se umas voltas na cama, desperta-se para um dia menos cinzento e isto esquece-se mas hoje não.

Hoje sinto que não tenho o que preciso para este emprego. Hoje sinto que a coisa que mais desejo, profissionalmente falando, é não ter de falar com ninguém, estar num escritório sozinha com os meus botões, a fazer uma tarefa qualquer monótona e nada creativa. Não quero ser diplomática nem tolerante nem quero inventar desculpas nem justificações para quem não faz a sua parte, mesmo sabendo que disso dependem os outros. Não quero explicar nada nem tolerar a indisposição justificada, não quero mentir nem esperar pelos outros.

Em dias como estes, lembro-me como às vezes sonhava com um monte que estava à venda no caminho entre o Vimieiro e Pavia, tinha piscina e tudo e nem se via da estrada. Havia de me dedicar às tarefas da casa, plantava um bocado de vinha e uns hectares de cereais, criava galinhas, patos e coelhos e tinha um canteiro gigante de ervas aromáticas que nunca haviam de murchar. Nos tempos mortos, sentava-me debaixo do alpendre ou contemplava as searas a perder de vista deitada numa rede de pano. Escrevia sempre que o calor me desse uma trégua e recebia pessoas em casa apenas para pagar as despesas. Não sonhava com marido nem com filhos porque pensava que ia ficar sozinha para sempre. E sozinha para sempre não era nada mau, especialmente se compararmos com as pessoas com quem nos cruzamos todos os dias, especialmente aquelas que parece que estão no nosso caminho só para dificultar.

Eu estou tão farta de pessoas que o melhor que me acontecia agora era poder trabalhar exclusivamente a partir de casa, desenvolver assim a minha rede de contactos, tirar partido das novas tecnologias. Manter o contacto humano no mínimo possível e sendo especialmente clara nas minhas intenções, necessidades e pedidos. Ou então dava-me uma coisa e deixava este mundo para trás e dedicava-me a qualquer coisa onde o critério de recrutamento fosse deve falar o menos possível ou então não pode gostar de trabalhar com outros ou mesmo encorajamos o trabalho eremita e totalmente independente. Há gente muito boa por aí. Eu sei, eu já vi, eu já trabalhei com ela. Mas o Sartre é que tinha razão quando dizia que o inferno são os outros. Com os meus próprios defeitos e limitações dou-me eu muito bem. E sei que os tenhos (defeitos e limitações) mas há duas coisas de que não me podem acusar: de não tentar sempre fazer o melhor que posso e de ter uma ética profissional desbardalhada. 

E era isto. Até sair do escritório não penso que o azedume me vá passar, vou ser uma e outra vez confrontada com o mundo em que escolhi desenvolver a minha actividade profissional. De livre e espontânea vontade, diga-se, mas sempre na esperança de encontrar almas com as mesmas inquietações. Chego à conclusão de que não há muitas: ou desistiram de tentar ou cederam a sua postura a troco de alguma compensação imediata. Raios partam ter de ganhar dinheiro para viver.

5 comentários:

Helena Barreta disse...

Ai, um Monte no Alentejo, gostava tanto de ter um. Ou melhor, o que eu gostava era ter possibilidades financeiras para poder viver no campo e fazer o que me apetecesse e ao sabor da natureza das estações do ano.

Sofia Ramalho disse...

olá nunca tinha comentado mas leio-te sempre que posso...cheguei a este blog a pesquisar sobre emigrar para o Luxemburgo e fiquei desde aí...
bom, só para dizer que te percebo peeeerfeitamente e tão bem...q fartura q tenho de pessoas...penso tantas vezes que as únicas pessoas para as quais tenho paciência e prazer me estar é o meu marido e os meus filhos, porque de resto.... e sim, não é bonito de se ouvir e dizer mas é a realidade...e sim, não há muitas almas inquietas,ou há e estão caladas...não é fácil de ser entendido por isso senti necessidade de o partilhar contigo. Não és a única!!

Andorinha disse...

Há coisa de duas semanas a minha chefe disse-me: you are not a team player. You like people, but you don't like being at the office, working together, you prefer to fly solo.
E eu toda contente: olha que fixe, uma gaja que me entende!! E a minha chefe nova que está ao lado diz: I really like you, I'd wish you'd come to the office more often...
#$%&) foi o que me passou pela cabeça.
Quem lê o meu blog, ninguém diria, ah? :) Compreendidissima, e isso nao faz de ti má pessoa nem má colega - o meu colega de casa é igual a mim e perguntou-me no outro dia se eu achava q ele tinha mau feitio ou era má pessoa.

M. disse...

É bom saber que não sou a única, é um facto!

São dias menos bons mas na realidade acho que gostava de um dia experimentar este isolamento (profissional) para tentar entender se me deixaria mais ou menos realizada.

E realmente não me sinto pior pessoa por isso, acho que não somos obrigados a gostar de pessoas. Não sei se isto é a velhice já mas tenho cada vez menos pachorra para aturar certas pessoas.

Andorinha disse...

Eu falo por chat, email e telefone com pessoas, mas não as tenho penduradas na minha mesa e se não as quiser ver, não vejo. Mais realizada do que me sinto é impossível, a sério. Se algum dia puderes experimentar, vais ver que adoras.
Nao é a velhice, mas a idade faz com que sejamos menos pacientes, eu pessoalmente não aturo coisas que aturava há 10 anos atrás. Tb já não me aflijo com o que me acontece como há 10 anos atrás, ganhei mais segurança e mais paz.
Na semana passada fui a rosnar a uma reuniao na sexta, mas o resto da semana passei-a em casa e as pessoas perguntam-me como é que aguento sem ver pessoas. Eu vejo pessoas, vejo as pessoas que eu quero ver, nao aquelas que sou obrigada a engolir.
Isto de trabalhar de casa começou no dia em q expliquei à minha chefe q era mais produtivo trabalhar a partir de casa de manha em vez de perder 1 hora no trânsito, perdia 15 minutos. E assim foi. Depois disso já mudei de cidade e casa e em vez de voltar ao escritório de manhã, passei a estar as tardes tb em casa... como quem não quer a coisa... e agora consegui convencê-los (e suei, ouve, suei mtooo) q se posso trabalhar a partir de casa na holanda e ser competente, pq nao deixar-me trabalhar de... Lisboa e continuar a ser competente? Prometi q vinha uma semana por mês à holanda, mas o resto era de lá, e em Junho começa o meu fandango. Imagino q nao possas fazer isto agora, mas da-lhe tempo e devagariiiinho, pedacinho a pedacinho.... pode ser que consigas :) Boa sorte!