abril 29, 2014

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Coisas que deviam fazer-nos querer sempre viver (filhos à parte): o momento em que a Primavera se torna em Verão; o cheiro das camas acabadas de fazer; o abraço não-julgador dos nossos pais; poder enfiar os pés na areia e boiar entre as ondas; ouvir música nova; o prazer dos deveres cumpridos; uma mesa cheia de amigos; estantes cheias de livros que queremos ler; conduzir de janelas abertas; uma boa noite de sono; flores frescas todas as semanas; a sabedoria dos nossos avós; o trabalho que se confunde com o prazer; os irmãos de quem sentimos falta; viagens de carro pela Europa; o prazer de fazer alguma coisa boa por alguém; dar e receber segundas oportunidades; voltar a casa depois do trabalho; a nossa liberdade; dias inteiros sem ligar a televisão; manter plantas vivas; receber e enviar cartas; construir uma memória; ter razão; a gentileza dos outros; ser capaz de aprender; a sensação de nervoso miudinho; uma(s) pessoa(s) que nos ame exactamente como somos; mercados de manhã; fruta acabada de colher; mergulhar numa piscina; fazer nascer algo das nossas mãos; pessoas com tempo para ouvir; sopa da pedra; todos os bairros de Lisboa; deixar de fumar/roer as unhas; dançar sem pensar nos outros; filmes tão bonitos que acabamos a chorar; a possibilidade infinita de sermos melhores; poder escolher; a sensação de pertença; beber café; as chegadas nos aeroportos; o silêncio das casas durante a manhã; fazer um bolo; pessoas com princípios; atingir objectivos; festas de Verão; não depender de números; fotografias de sítios longínquos; salas de concertos; boas relações de trabalho; a casa arrumada; chefes que não são robots; a paisagem alentejana; tardes de calor; programas de culinária; acordar cedo; fazer mixtapes; sonhar acordada; escrever.
 
(Espero nunca precisar de me lembrar que há muitas razões boas para viver. Há dias soube que uma pessoa conhecida tinha aparecido morta, aparentemente por suicídio e tenho pensado muito no que é preciso para alguém considerar a morte como alternativa. Não quero julgar ninguém e muito menos posso imaginar o que é necessário para desencadear um acontecimento tão dramático. Mas caramba, há tanta coisa para nos ajudar a acordar todos os dias, mesmo os dias maus em que não queremos ver ninguém! Que possa ter encontrado a paz de espírito que provavelmente lhe faltava, é o meu sincero desejo.)

2 comentários:

Patrícia disse...

O problema está mesmo no estado de espírito, é qualquer coisa interior maior que não permite ver e experimentar muitas dessas razões que apontas com o seu devido valor. Deixa-se de sentir prazer seja no que for, na vida em geral... Ainda assim, não imagino que tipo de sofrimento pode provocar uma decisão tão definitiva.
Que nunca nos falte o equilíbrio e a sensibilidade q.b. que nos deixa aproveitar, ter prazer e não esquecer de todos os motivos por que vale a pena acordar todos os dias.

Helena Barreta disse...

Deve ser mesmo muito triste pensar-se e concretizar-se que o melhor é pôr termo à vida, o desespero e a coragem que têm de ter.

Bom fim de semana