janeiro 29, 2015

[quase]

Confesso que neste momento não sei em que estádio da exaustão me encontro. Dez dias desde que escrevi a última vez e ainda não acabámos a mudança! E se pensar que só já temos dois dias até ao final do mês, então só me apetece chorar muito.

O primeiro problema desta mudança é que não planeámos nada. Não organizámos caixas, não criámos etiquetas, não fizemos planos. Tivemos que nos dividir entre limpar e mobilar a casa nova (que longe ainda estamos do fim!) e desmobilar e limpar a casa antiga. Lembro-me quando viemos para o Luxemburgo e de como fomos organizados, tudo bem empacotado e sinalizado, a mala da nossa carrinha incrivelmente arrumada. E agora isto... enfim. Tivemos quatro braços amigos neste fim de semana que basicamente nos fizeram quase a mudança toda (tendo em conta que carregaram os maiores pesos) e sentimo-nos incrivelmente sortudos em termos este amigos para ajudar. Não é mesmo para todos!

O segundo problema desta mudança é a saúde dos dois adultos que se mudam: eu, grávida de oito meses, incapaz de carregar grandes pesos, sem fôlego com meia dúzia de degraus (raios partam este antigo terceiro andar, olá baixinho primeiro andar!), cheia de dores nos rins e nas costas e bacia - podre, portanto; o marido, às voltas com um problema crónico nas costas que nem a fisioterapia tem resolvido, sofrendo tanto como eu. Em resumo, duas almas a quem a idade faz questão de lembrar que as coisas já não são como antes.

O terceiro problema desta mudança é o tempo. Nunca tinha pensado nisso mas mudarmo-nos enquanto está a nevar é uma porcaria e o mesmo se passa com a chuva. Não basta já a enormidade de cartão e plásticos que temos espalhados pela casa, ainda há que acrescentar os pés que chegam encharcados da rua (à conta disto, já enfiei um par de botas no lixo), o sal que se espalha por toda a casa e o exercício de equilibrismo que é carregar com sacos, caixotes e móveis pelo gelo. Depois as casas estão geladas e é preciso aquecer primeiro antes de as mãos conseguirem fazer qualquer movimento que seja. Para a próxima, ou contratamos alguém (que se lixe o dinheiro e vivam as nossas costas!) ou só nos aventuramos no Verão.

Ontem foi a primeira vez que dormimos na nossa casa, mesmo no meio do caos, dos móveis por montar, do cheiro a Ikea. Todos dormimos bem, sem estranhar os novos quartos, as novas camas, os diferentes ruídos. E hoje acordámos e tomámos o pequeno-almoço enquanto olhávamos para o jardim cheio de neve. Nem tudo é mau e eu vejo todos os dias a nossa casa a tomar forma debaixo das minhas mãos, que procuram os sítios certos para as nossas coisas, que carregam cartão e mais cartão para a garagem, que esfregam todas as superficies que se deixam esfregar. Estão a ser as duas semanas mais cansativas da minha vida mas prometi a mim mesma que quando isto acabar não vou sair do sofá até à gaiata nascer. A ver se consigo que não venha antes do tempo...

janeiro 19, 2015

Déménager


A minha primeira reacção foi muito simples: nem pensar! Mudar de casa e principalmente comprar uma casa pareciam-me duas ideias absurdas e assustadoras, francamente. A primeira coisa que me ocorreu foi Vou ficar aqui presa para sempre. e confesso que acho que devo ter chorado só de pensar nisso. Era um compromisso demasiado sério e obrigava-nos a considerar continuar aqui sem data de regresso.

Mas depois vieram os outros argumentos. Primeiro, uma filha. Acho que não há argumento mais forte do que a família que está a crescer, obrigando-nos a rever o espaço que temos e a decidir se podemos continuar assim ou se precisamos de mais. Depois, o mercado imobiliário do Luxemburgo, que é um caso sério e que nos fez encontrar um duplex a um preço razoável exactamente onde queríamos viver e que podemos vender com alguma margem de lucro, se necessário for. Depois também apareceu o senhorio, regressado do Brasil, sem saber o que ia fazer no futuro e sem grande vontade de nos arranjar mais arrumação aqui em casa (mas impecável em todas as melhorias que lhe fomos propondo durante estes quases três anos). E finalmente a ideia de ter uma casa grande, com uma garagem, uma cave e,essa é que é essa!, um pequeno jardim!

Vi este apartamento num site imobiliário mas não acho que andasse verdadeiramente à procura. Mas o que é certo é que as imagens não me saíam da cabeça e nem sequer conhecia a sua composição total. Dia após dia, via-me a cozinhar naquela cozinha cheia de luz e imaginava um quarto sem a tralha que hoje temos aqui e, estranhamente, sentia-me em casa. Não consigo realmente explicar a sensação de ver apenas imagens e sentir que era o apartamento perfeito para nós. Resolvemos marcar uma visita. Numa tarde escura, visitámos o apartamento e tive vontade de dizer que ficávamos com ele naquele momento. Não vimos mais nenhum nem procurámos mais: sabíamos que tínhamos encontrado uma pérola e decidimos avançar.

Bancos, agências imobiliárias; fotocópias, projectos de compra; muitas contas feitas, muitos cenários experimentados, todos os dias a pensar no raio do apartamento. Tudo entregue e as noites sem dormir a pensar que o banco não nos aceitava o empréstimo. Numa semana, o banco aceitou! Respirei de alívio e tratámos de garantir que mais ninguém estava na luta pela casa. Mais noites em claro à espera da escritura que nunca mais era marcada e os dias a pensar no raio do apartamento. Até à semana passada, em que passámos a ser donos do único apartamento que vimos mas que era e é tudo o que nós podíamos desejar. Tem um pedaço de relva e um cerejeira e podemos fazer barbecue no (inexistente) Verão e o miúdo pode correr lá um bocado e eu posso sentar-me lá com a miúda quando o tempo melhorar, a ler e a ela a apanhar ar! Tem espaço para arrumar tudo o que acumulámos e muito mais! Tem espaço para receber visitas e para poder ter louça bonita e para ter até um escritório! 

Podia ficar horas nisto mas tenho as costas partidas de uma mudança que vai ser longa e lenta, ou não estivesse eu grávida de trinta e três semanas. Entre limpar aqui e ali e ir mudando a tralha aos soluços, têm sido dias difíceis. As costas não aguentam mas eu não desisto e vou fazendo devagarinho. Neste momento, tenho o caos dos dois lados mas esta semana (com ajuda de bons amigos) espero que possamos pôr um bocadinho de ordem nisto. E daqui a duas semanas talvez eu possa já descansar na casa mais bonita e sossegada, ao mesmo tempo que a miúda descansa aqui no seu T0 cada vez mais apertado. Desejem-nos sorte e saúde para podermos trabalhar, que é o que é preciso!

janeiro 13, 2015

Desacelerar


É hoje o primeiro dia. A licença começa hoje e, se tudo correr bem, vai durar até ao início do próximo ano. Nas últimas semanas, já me arrastava para o trabalho, especialmente porque durante a época festiva o trabalho não era muito e o cansaço já começava a custar. Era desaconselhado viajar mas mesmo assim, sempre que subia ao primeiro andar, já os meus pés se arrastavam e toda a gente sentia que o meu ritmo não era o mesmo. Há quem pense que agora comecei as férias, esquecendo-se que daqui a umas semanas recomeço o emprego mais importante da minha vida, agora a dobrar: ser mãe.

Hoje é o primeiro dia e sei que ainda me vai custar a habituar à mudança. Não preciso ter um despertador ligado porque não tenho que ir trabalhar. Tenho que ter cuidado com as horas porque o miúdo precisa de ir para a escola, claro, mas não preciso mais de cronometrar o tempo e chatear-me com ele a cada dois minutos porque só faz as coisas quando lhe apetece. Ainda não o levo a pé porque não começou realmente a amanhecer quando saímos de casa mas sinto que em breve também isso vai mudar e podemos os dois respirar o ar gelado da manhã até à escola. Tenho o silêncio desta casa todo para mim. Tenho todo o tempo para tratar da louça, da roupa, para arrumar e deitar fora, para ler, escrever e ouvir música, para me estender no sofá sem fazer nada se é isso que realmente me apetece. Pelo menos durante dois meses, antes da miúda chegar.

Tenho um ou dois planos para este tempo mas o resto pretendo ocupar sem pressa e sem regras. Hei-de lavar a roupa dela, hei-de reler alguns capítulos sobre recém-nascidos só para me avivar a memória e pouco mais. Para trás, ficam as semanas de trabalho, as responsabilidades que tratei de passar o mais extensivamente possível, uma certa insatisfação. E agora começa mais um capítulo na nossa vida, agora sim, mesmo a sério e eu sinto-me capaz de tudo. Só um bocadinho mais devagar.

janeiro 06, 2015

Contagem decrescente número um!

Daqui a umas horas faltarão apenas três dias inteiros de trabalho para entrar definitivamente na licença de maternidade, Até agora, posso confirmar que tem vindo a ser a semana mais lenta e insuportável da minha vida profissional: a maioria dos clientes ainda está de férias, as we speak, porque em Espanha se celebram os Reis hoje e portanto não há grande coisa a fazer. Não há nada para fazer, na verdade. Mas eu venho estoicamente, dia após dia, sentar-me nesta cadeira que me dá cabo dos ossos da bacia e arranjo coisas para me entreter durante estas horas. Revejo ad nauseam os temas pendentes que vou deixar para trás para me certificar que não me esqueço de nada, procuro outros que, por alguma razão, me tenha esquecido de incluir na lista, preparo as minhas despedidas mas nunca mais é Sexta.

A licença de maternidade aqui no Luxemburgo é interessante e insuficiente ao mesmo tempo: se por um lado começa dois meses antes da data prevista do parto, o que permite à mãe descansar, organizar-se e aproveitar uns misecordiosos dias de sossego, por outro termina dois meses depois do parto (três se a mãe amamentar), o que é assustadoramente insuficiente. Quem é que, no seu perfeito juízo, pode separar-se de um bebé de três meses para voltar a trabalhar? Portugal, neste aspecto, não está tão mau. A única coisa que ameniza isto é a existência do que eles chamam o congé parental, com a duração de seis meses (se se deixar de trabalhar totalmente) ou de um ano (se se trabalhar a tempo parcial). Portanto, os seis meses somados aos três da licença inicial, sempre dão para acompanhar mais o bebé. O problema? Durante esse período, ganha-se apenas o equivalente ao ordenado mínimo, o que torna a coisa muito menos atraente. Aquela ideia de que nos países mais a Norte a maternidade/paternidade são promovidos a sério perdeu um bocadinho o encanto para mim.

Às trinta e uma semanas, ainda não me deu aquele ímpeto de arranjar o ninho, não tenho a mala feita e ainda não comecei a lavar a roupa da miúda. Mas tenho tudo na minha cabeça e espero que a partir da próxima semana possa começar finalmente a mentalizar-me que vou ser mãe pela segunda vez e que as noites tranquilas vão acabar e que posso estar mais calma desta vez mas cada filho é um filho e sabemos lá o que vamos encontrar desta vez! Por agora, a minha concentração está em conseguir terminar esta semana sem enlouquecer ou morrer de tédio e em conseguir que nada, mas mesmo nada, me tire o sono.