O dia de ontem teve duas efemérides para mim. Fez exactamente um ano que deixei de trabalhar para entrar na licença de maternidade e também que assinámos, no notário, o contrato com que comprámos o nosso apartamento.
A distância que já vai de lá até aqui! Eu tinha acabado de deixar de trabalhar e pensava, com grande prazer, no que era ter um ano inteiro sem escritório pela minha frente. É certo que já me arrastava em vez de andar mas o simples facto de me poder resguardar durante tantos meses era suficiente para me deixar menos ansiosa. Não tinha verdadeiros planos mas sabia que ia gostar de estar em casa, cuidar da miúda e das coisas domésticas. Enganei-me e não me enganei.
Nesse dia, pude finalmente tomar o pequeno-almoço com alguma calma antes de sair para o notário. O caminho era curto e fi-lo de autocarro, não me lembro bem porquê. Encontrámo-nos à porta e, descobrimos depois, já estávamos uma hora atrasados: a secretária havia enviado a hora errada para nós e não nos conseguiu avisar a tempo. Lá dentro, os antigos donos do apartamento já nos esperavam, talvez um pouco ansiosos, mas felizes por venderem a casa. O tipo da agência imobiliária disse-nos que queriam o dinheiro para investir em Espanha. Eu só pensava que devia ser um investimento e tanto!
O notário era um homem dos seus sessenta e tal anos, muito bem posto, natural da Alsácia, cheio de pequenas anedotas sobre assinaturas de escrituras e sobre a vida em geral. Depois dos antigos donos saírem, ainda ficámos com ele um bom bocado a rever os documentos todos e a ouvir as histórias que tinha para contar. Já tínhamos a cabeça no nosso lote mas teria sido desagradável apenas pedir-lhe para se apressar. Ficámos e ouvimos.
Saímos, um molho intrigante de chaves num pequeno saco de cartão, e dirigimo-nos quase de imediato para a nossa casa. Pensar nisso, na nossa casa, parecia uma coisa irreal. Eu, que tanto tinha lutado contra a ideia de ter uma casa aqui, estava de repente radiante, ao pensar em tudo o que ainda havia por fazer. Passeei-me pela casa vazia, a tentar sentir-lhe o pulso mas na verdade já me sentia a viver ali desde a primeira e única (!) visita que fizemos antes da compra. Voltar para a casa antiga com a cabeça na nova foi uma tortura. Só pensava em soluções para podermos mudar-nos o mais rapidamente possível, ontem já era demasiado tarde!
Apetece-me dizer Possa, para onde foi este ano inteiro? mas sei exactamente como o tempo custou a passer, apesar de agora me parecer que foi tudo demasiado rápido. Parece que já vivo nesta casa há anos, encontrei o meu sítio mesmo ali. Às vezes vêm-me à memória as imagens das infinitas caixas do Ikea que descarregaram numa manhã gelada de Janeiro pela janela do quarto dos miúdos. Ou as imagens dum marido a montar móveis atrás de móveis e a dizer que tinha achado a sua vocação. E a imagem do miúdo a dormir na sua cama, a primeira a ficar pronta. E as imagens da nossa sala, sem uma peça de mobiliário ou decoração, a não ser a televisão que me tinham deixado no chão. E lembro-me de ter muito frio porque nevava e o aquecimento precisava (ele mesmo) de tempo para aquecer e eu tinha a barriga do tamanho dum balão!
Ontem era dia de celebrar mas entrei em casa quase à meia noite e a minha gente já dormia. Guardemos para depois a celebração não só do tecto sobre as nossas cabeças, mas especialmente dum sítio a que chamamos nosso.
1 comentário:
Marisa, merecem parabéns por tudo o que alcançaram neste ano, e volto a renovar os votos de um Feliz 2016!
Enviar um comentário