Toda a gente sabe (ou se não sabe, fica a saber) que eu não quero ficar no Luxemburgo para sempre. Não há nada que eu queira com mais força ou mais expectativa do que voltar a Portugal, com tudo o que de bom e de mau isso possa significar para nós. É mais forte do que eu, este chamamento da terra, esta vontade de poder voltar a viver no meu país, falando a minha língua, não fazendo parte de uma minoria, com os meus filhos perto do resto da família, a aprenderem coisas sobre Portugal... Podia enumerar as vantagens durante largas horas.
Mas querer voltar para Portugal não é o mesmo que querer fugir do Luxemburgo, nem sequer significa que há alguma coisa que este país não tenha feito por nós. O grande, grande defeito do Luxemburgo, para mim, é que não é Portugal e é tudo. São as pequenas coisas que fazem espécie: ter que procurar como se diz ranho em Francês antes de uma consulta médica; não encontrar em lado algum verdadeiro pão alentejano; raspar o gelo do carro nas manhãs mais frias; ainda estar a compreender como funcionam os impostos; amar a organização mas ficar triste com a falta de espontaneidade. Se algum dia deixarmos o Luxemburgo, será sempre com muita saudade e com um profundo agradecimento pelos tempos estáveis, seguros e por tudo o que conseguimos alcançar enquanto aqui estivemos.
Mas depois há coisas que me fazem ter pena de ir embora. Como por exemplo o gesto para o qual fomos convocados. A comuna onde vivemos (o equivalente à câmara municipal portuguesa) convidou-nos a plantar uma árvore em honra da nossa filha, nascida em 2015. Todas as famílias desta comuna com filhos nascidos neste ano são convidados a fazer o mesmo, sendo que a comuna irá também descerrar uma placa com os nomes das crianças para memória futura. Quando li o convite, só me apetecia chorar. Eu sei, eu sei, as pessoas vão dizer que são as hormonas. Mas não são apenas elas: é também a constatação que, por muito que regressemos e voltemos a construir a nossa vida noutro lado, a vida da minha filha estará sempre ligada a este país. O cartão de cidadão dela diz que ela é cidadã portuguesa mas a verdade é que nasceu no Luxemburgo e esse laço nunca poderá ser eliminado. Sinto que esta cerimónia celebra o seu futuro, que é uma forma simbólica de inclusão e de reconhecimento. Indirectamente, estende-nos a nós, o resto da família, este reconhecimento e acolhe-nos quase oficialmente no seio de uma comunidade à qual chamamos nossa há quase cinco anos.
Bem sei que o Luxemburgo tem as suas maneiras de nos fazer sentir que, apesar de vivermos aqui, não fazemos parte desse conceito abstracto que é ser Luxemburguês. Bem sei que há demasiados portugueses a viverem aqui e que isso pode gerar algum atrito com as restantes comunidades locais. Mas, simultaneamente, este país é, no geral, um exemplo de tolerância, aceitação e justiça social. Eu sei que nem toda a gente partilha desta opinião, especialmente outros emigrantes portugueses que ainda aqui vivem com dificuldades. Mas eu, apesar de ter o coração e a cabeça em Lisboa, apesar de suspirar até pela moleza e inércia portalegrense, jamais esquecerei o pequeno Grão-Ducado que nos acolheu, passem os anos que passarem. E hei-de voltar, mesmo se um dia partir, para visitar a árvore que celebra a vida da minha filha.