A nossa filha faz quatro anos hoje. A esta hora, há quatro anos atrás, já a tinha há muito nos braços e estava entretida a estudar-lhe aquela carinha inchada que parecia já vir zangada com o mundo. Não imaginava quão agitada seria a nossa vida nos anos que se seguiriam mas também não imaginava como iria gostar desta miúda, mesmo nos dias em que a sua missão é apenas uma: tirar-nos do sério. E olhem que são muitos os dias assim...
Hoje, Amália celebra o seu quarto ano de vida. É valente e, apesar de falar com algum receio de fantasmas e monstros, a verdade é que não tem medo de nada. Corre para todos os cães e gatos que vê na rua, perde tempo a estudar formigas e outros insectos que tal, admira os animais mais selvagens. Salta, trepa, atira-se como se o mundo fosse todo dela e, se por um lado sei que é porque ela não tem ainda noção do perigo, por outro sei que é a natureza dela. Ela é aventureira, audaz, ela quer experimentar tudo, parece querer engolir o Mundo duma só vez. O mérito não é nosso: é claro que a encorajamos a ser destemida e independente mas só ela sabe arriscar como se não houvesse amanhã.
É a filha do meio e isso vê-se bem, todos os dias. Tão depressa quer ser uma menina crescida como quer ainda ser uma bebé. Admira tanto o irmão mais velho e inveja um bocadinho do irmão mais novo, não se sabe para que lado se inclinará hoje. É irascível e doce: tão depressa me elogia (Mãe, és tão bonita!), como me proscreve do seu círculo próximo (Já não sou tua amiga!) apenas em alguns segundos. Diz muitas vezes que quer dar maminha aos seus filhos e, se a deixasse, ainda procuraria as minhas para se confortar. Parece que tem uma vontade gigante de crescer (Mãe, quando é que vou ser uma senhora?) mas logo se comporta como a menina de quatro anos que ainda é.
Aprende as coisas à velocidade e vontade dela. Sabe contar até doze em Luxemburguês mas emperra no sete em Português. Aplica-se em tudo o que faz e é capaz de se concentrar. Infelizmente, isto significa que também se pode concentrar nas birras que faz, o que origina às vezes mais de uma hora de choro e às vezes de gritos até chegarmos ao ponto de já não sabermos porque tudo começou. Quer mandar e impôr-se na escola e por isso talvez não seja muito popular. Se por um lado isto me parte o coração, por outro alivia-me saber que tem esta personalidade forte e só me resta esperar que a utilize para o bem.
Se antes dormia muito mal e quase me levava ao esgotamento com a privação do sono, hoje é normalmente a primeira a adormecer e não são raros os dias em que volto a entrar no quarto depois de os deitar e ela já ressona mesmo. Largou fraldas e chupetas no ano que passou, as primeiras naturalmente, as segunda fruto da falta de chupetas em boas condições em casa. Em ambas as vezes, ela provou que eu estava errada quando pensava que ia ser difícil ou que ela ia resistir: à parte de um choradinho a querer usar fralda e uma noite a choramingar pela chupeta, ela surpreendeu-me com o seu poder de encaixe e com a sua força.
Ela nasceu sem me dar a hipótese de pensar ou mesmo de uma anestesia. Ela vinha determinada, pequenina mas cheia de vida e assim continuou pelos seus primeiros quatro anos de vida. Apesar de muitas vezes eu não conseguir apreciá-la como ela merece no meio dos seus gritos e exigências, amo-a com todas as minhas forças e apenas espero estar à altura da minha missão: mostrar-lhe o caminho atribulado duma mulher nos dias que correm e fazer com que ela não se demova com nenhum obstáculo. E a continuar assim, o céu é o seu limite.