Sentei-me no hall de entrada porque não conseguia suportar o ambiente abafado que se respirava na sala de espera. Mas sentei-me de maneira a poder controlar o monitor onde se lia '3 em triagem' e '15 por observar'. Os doentes entravam a uma média lenta: bebés que choravam muito, velhos em cadeira de rodas já com a cor da morte, a rapariga constipada - a todos unia uma grande vontade de estar noutro lugar. Conhecia o segurança da minha adolescência: um jogador de futebol tão promissor que acabara a fazer bonito entre as paredes doentes de um hospital. Não conhecia mais ninguém: a cidade que um dia eu julguei conhecer não passa hoje de um conjunto de caras e corpos que me são estranhos, que não carregam em si recordações minhas.
Ela demorava mas o pior era não saber porque demorava: teria desmaiado, estaria já a ser atendida ou estaria esquecida em alguma maca ou cadeira no corredor. A minha cabeça ontem só fabricava perguntas. Pensei de repente 'Então e quando eu tiver que fazer o mesmo mas pelos meus pais? O que vai ser de mim quando tiver que os empurrar numa cadeira de rodas ou quando tiver que ser eu a relatar o que sentem porque já não conseguem falar?'. Fechei os olhos, também de repente, e concentrei-me nos bombeiros que, perante a hipótese de levarem consigo um cadáver, escolhem desanuviar a cabeça enquanto bebem um chocolate quente.
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