O cenário é este: estou sentada à porta do gabinete da médica que ajudou o Vicente a nascer para uma consulta de rotina. Este piso do hospital chama-se Centro da Mulher e está, por isso, cheio de mulheres jovens ( na sua maior parte) grávidas ou acabadas de parir. As memórias na minha cabeça estão em polvorosa, como se estivesse a reviver este mês no ano passado outra vez, com a diferença de que não tenho um bebé para carregar.
À mínima visão de um recém nascido quase preciso de me agarrar à cadeira para não chorar. É um misto de comoção com a inveja de saber que o bebé Vicente nunca mais será assim. É como se quisesse reviver estes momentos pré-parto ad nauseam e voltar ao momento em que vejo o meu filho pela primeira vez. Tenho uma vontade quase irracional de perpetuar estes primeiros meses e poder ter um bebé durante anos a fio e, ao mesmo tempo, o desejo natural de mãe de ver o seu filho a crescer, a desenvolver habilidades e fazer gracinhas. Mas é difícil resistir aos carrinhos de bebé e ao choro dos recém nascidos nos gabinetes médicos e à forma tão particular com as mães olham para as barrigas proeminentes.
Assim que entro na consulta, a médica pergunta-me (em tom de brincadeira) quando é que penso dar um irmão ao Vicente e eu rio-me com a pressa dessa ideia mas afinal é um riso nervoso de quem gostava de voltar a passar por isto tudo outra vez. E ao telefone conto a brincadeira e ainda há quem pense que arriscaria ter outro filho agora. Não é por falta de vontade: é por falta de metros quadrados em casa e de segundas prestações de creches e por aí fora. Gostava de ter vivido no tempo das nossas avós, em que se tinha aos doze ou catorze filhos porque era suposto ser assim e porque todos os filhos se criam. Mas não, logo calhei a nascer numa época em que se pensa demais, em que se está em crise e há tanta coisa que interfere no nosso bem estar, quanto mais no de uma criança.
Depois de alguns segundos no mundo dos vários filhos, regresso à terra com a doutora a dizer que sim, que está tudo bem, recuperei perfeitamente mas ainda é cedo. Aproveito o gabinete para saltar para cima da balança pela primeira vez em muitos, muitos meses e a sensação é agridoce: foi melhor do que eu pensava mas ainda francamente mau. Saio de lá com vontade de ter preenchido o boletim de grávida ou de me sentar outra vez no gabinete do CTG mas afinal só me falta pagar. Às vezes penso que tenho mesmo mesmo mesmo de mudar de vida mas ainda não consegui engendrar uma alternativa a ser mãe só de um Vicente. E saio do hospital a sonhar um dia fazer colecção de bonitas ecografias.