Tinha adormecido cedo, culpa da semana de trabalho que só hoje terminava. Por uma vez, tinha adormecido de forma pacífica e rápida, sem grandes voltas na cama, sem nada em que pensar. Não que o sono me tenha faltado nos últimos tempos - mas mesmo assim, tinha sido um adormecer indolor. A noite não quis ser assim: quando o sono ia já em estádios avançados, chovem as mensagens, pingam os telefonemas. Não interessa que eu esteja a dormir, nem sequer importa que trabalhasse de manhã. Eu tento explicar, lutando contra o ruído imenso do outro lado da linha, que estou a dormir. Ou antes, que estava. Mas não consigo fazer-me entender, o telefone toca outra e mais uma vez. Até que o desligo. Ponto final.
A manhã começou quase radiosa. Pelo menos metaforicamente. Enfio-me no carro, encolhida com o frio. Subo até ao carro com a garrafa Pluma na mão, qual anúncio do gás. Mas em versão morena. E pernas muito mais curtas. E.. enfim. Ligo a rádio para me acompanhar, a viagem não é longa. De uma assentada só, o DJ da Radar oferece-me os Postal Service, os Beirut e os Eels. A viagem é curta mas suficiente para recordar. Quando chego ao topo do parque Eduardo VII maravilho-me pela enésima vez com o amanhecer em Lisboa: a neblina que sobe do rio, os tons rosa e azul pastel mesmo por cima da avenida da Liberdade, as ruas vazias e aparentemente limpas. Chegada à garagem do emprego, consigo o último lugar vago. Pensei '...não pode ser. alguma coisa está para acontecer.'
O dia é o mais calmo que me lembro. A única perturbação é a colega psicopata a arrotar de 10 em 1o segundos, depois de beber a segunda garrafa de litro de água com gás. Alguém põe a tocar uma colectânea do George Michael e eu abano-me na cadeira - aquilo é muito boa música pop. Depois há um cd inteirinho de salsa, outro da Nelly Furtado. O trabalho rende mais do dobro em dias assim mas parece que nunca é suficiente. Deixo aquilo para trás às quatro da tarde e cheira-me finalmente a fim de semana. Debato-me entre as decisões difíceis a tomar: concerto no Fórum Lisboa ou reabertura do Incrível Almadense. Há uma garrafa e meia de gin no armário e água tónica no frigorífico. O passado continua a bater-me à porta. É nestes dias que franzo o sobrolho e penso '... que raio estará a vida a preparar-me agora?'.
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