Não tenho dormido nada de jeito, ando a sufocar com excesso de emoções e a pensar que preciso mesmo de ajuda. Respostas às minhas últimas candidaturas: zero, nem sequer um não para fazer a contagem. Acabei de arrumar o material com que vou iniciar o novo ano escolar e acho que voltar a estudar me põe para lá de aterrorizada. Tem sido difícil concentrar-me no que realmente importa. Faltam três dias para as férias e eu sonho todos os dias com o silêncio cúmplice que aí vem.
setembro 29, 2009
setembro 27, 2009
Então e votou bem?
Gosto que me perguntem isto, como se houvesse apenas uma maneira certa de votar e todos soubéssemos exactamente o que quer dizer votar bem. Em todo o caso, o dever cívico está já cumprido.
Pela primeira vez, votei em Lisboa e fi-lo com um certo sentimento de nostalgia porque não iria encontrar na mesa de voto nenhuma cara conhecida. A partir de hoje, sou uma eleitora mais anónima, votando na minha freguesia de residência mas, de certa forma, longe de casa. É como se agora estivesse mais desamparada e esse sentimento apenas cresceu quando disseram o meu nome em voz alta na sétima secção de voto, depois de passar pelos meninos escuteiros que tentavam vender canetas à porta. E posso assegurar que, depois aí de Braga ou Bragança, devo ter votado na freguesia mais social democrata de que há memória: o desfile de carros de alta gama à porta, as senhoras que passeavam o seu cabelo bastante armado com laca, os maridos com o elegante lencinho na lapela do casaco, os miúdos com o cabelo sempre a tapar-lhes os olhos, as moças que têm ainda o mesmo bronzeado que no pico do Verão. as urnas tão perto da rua de Buenos Aires. E então eu, no meio daquela gente toda, senti-me deslocada porque não são aquelas as minhas raízes, não é dali que eu venho e tive saudades de sentir que a maior parte das pessoas que votavam ao mesmo tempo que eu são de esquerda.
Confesso que, como tantas outras pessoas, não gosto nem percebo a política. Tenho muitas vezes a tendência a pensar que não existem nenhumas diferenças entre os que estão no poder e os que se seguirão e acho que quem ingressa na política ao mais alto nível acaba sempre corrompido. Mas nestes dias de eleições sinto-me quase comovida por fazer parte de algo muito maior do que apenas um partido político: sempre que votei senti-me com o poder de mudar o futuro, mesmo correndo o risco de escolher mal. E hoje, impressionada com a afluência a algumas mesas de voto, fico contente por ver que ainda há quem se importe.
Pela primeira vez, votei em Lisboa e fi-lo com um certo sentimento de nostalgia porque não iria encontrar na mesa de voto nenhuma cara conhecida. A partir de hoje, sou uma eleitora mais anónima, votando na minha freguesia de residência mas, de certa forma, longe de casa. É como se agora estivesse mais desamparada e esse sentimento apenas cresceu quando disseram o meu nome em voz alta na sétima secção de voto, depois de passar pelos meninos escuteiros que tentavam vender canetas à porta. E posso assegurar que, depois aí de Braga ou Bragança, devo ter votado na freguesia mais social democrata de que há memória: o desfile de carros de alta gama à porta, as senhoras que passeavam o seu cabelo bastante armado com laca, os maridos com o elegante lencinho na lapela do casaco, os miúdos com o cabelo sempre a tapar-lhes os olhos, as moças que têm ainda o mesmo bronzeado que no pico do Verão. as urnas tão perto da rua de Buenos Aires. E então eu, no meio daquela gente toda, senti-me deslocada porque não são aquelas as minhas raízes, não é dali que eu venho e tive saudades de sentir que a maior parte das pessoas que votavam ao mesmo tempo que eu são de esquerda.
Confesso que, como tantas outras pessoas, não gosto nem percebo a política. Tenho muitas vezes a tendência a pensar que não existem nenhumas diferenças entre os que estão no poder e os que se seguirão e acho que quem ingressa na política ao mais alto nível acaba sempre corrompido. Mas nestes dias de eleições sinto-me quase comovida por fazer parte de algo muito maior do que apenas um partido político: sempre que votei senti-me com o poder de mudar o futuro, mesmo correndo o risco de escolher mal. E hoje, impressionada com a afluência a algumas mesas de voto, fico contente por ver que ainda há quem se importe.
setembro 23, 2009
As coisas boas (também) nunca vêm só
Vou lembrar o ano de 2009 como o melhor e o pior da última década, posso já afirmá-lo. Nunca estive tão em baixo, tão desamparada e perdida como neste ano. Mas, simultaneamente, nunca me senti tão empenhada, desejada, empolgada por estar a fazer coisas. Basta pensar que há seis meses atrás, a minha vida era um pouco vazia e estava completamente estagnada e tudo o que aconteceu a partir daí teve exactamente os mesmos efeitos de um tornado.
Entre mortes, doenças mais ou menos graves, internamentos e estados de saúde desconhecidos, aconteceu-me um pouco de tudo. Descobri que vou perder o emprego, que não gosto de parte daquilo que faço, que sou comunista de coração, que nunca mas nunca devo misturar amizade com trabalho, que o mundo é um imenso mar de classificados de emprego. Aprendi a relativizar, a respirar fundo, a dosear as quantidades de stress e indignação e aprendi também que, apesar de tudo, ainda me consigo enervar com facilidade. Fui convidada para projectos empolgantes, que abracei sem sequer hesitar, ultrapassei os meus próprios limites, criei os meus próprios espaços. E encontrei a mais preciosa e rara dádiva da minha vida, capaz de me elevar e surpreender sempre cada vez mais.
Devia estar a escrever este post em Dezembro, quando o ano estivesse prestes a acabar. Mas agora tenho tanta coisa a acontecer ao mesmo tempo, que dei por mim perdida neste balanço. O que eu aprendi verdadeiramente é que vai ficar tudo bem, a vida vai continuar, a sorte vai virar. E então hoje soube que fui aceite naquilo que quero, ele está a fazer progressos muito pequeninos, a minha vida está (lentamente) a chegar exactamente onde sonhei. E, mesmo que amanhã esta esperança toda venha por aí abaixo, eu hei-de voltar a este post e reler tudo o que escrevi para me lembrar que sim, a gente vai continuar.
Entre mortes, doenças mais ou menos graves, internamentos e estados de saúde desconhecidos, aconteceu-me um pouco de tudo. Descobri que vou perder o emprego, que não gosto de parte daquilo que faço, que sou comunista de coração, que nunca mas nunca devo misturar amizade com trabalho, que o mundo é um imenso mar de classificados de emprego. Aprendi a relativizar, a respirar fundo, a dosear as quantidades de stress e indignação e aprendi também que, apesar de tudo, ainda me consigo enervar com facilidade. Fui convidada para projectos empolgantes, que abracei sem sequer hesitar, ultrapassei os meus próprios limites, criei os meus próprios espaços. E encontrei a mais preciosa e rara dádiva da minha vida, capaz de me elevar e surpreender sempre cada vez mais.
Devia estar a escrever este post em Dezembro, quando o ano estivesse prestes a acabar. Mas agora tenho tanta coisa a acontecer ao mesmo tempo, que dei por mim perdida neste balanço. O que eu aprendi verdadeiramente é que vai ficar tudo bem, a vida vai continuar, a sorte vai virar. E então hoje soube que fui aceite naquilo que quero, ele está a fazer progressos muito pequeninos, a minha vida está (lentamente) a chegar exactamente onde sonhei. E, mesmo que amanhã esta esperança toda venha por aí abaixo, eu hei-de voltar a este post e reler tudo o que escrevi para me lembrar que sim, a gente vai continuar.
*
(Às vezes tenho medo. Medo não, às vezes entro em pânico quando penso que, como todas as outras pessoas, não conseguimos sempre aquilo que desejamos. É que também eu mudo como mudam os dias nas estações e, se se levanta uma brisa inesperada antes do anoitecer, também posso esperar acordar para uma manhã radiosa e fresca. Mas basta-me a tua mão, trazendo-me de volta à terra e lembrando-me que as estações ainda se sucedem harmoniosamente.)
* a luz nas manhãs da Estrela.
setembro 22, 2009
Correr na Estrela #3
Assim que cruzamos os portões do jardim, ouvimos a agitação ao longe. São maioritariamente vozes femininas que se perdem entre gritos e cantorias. Quando estamos prestes a começar a corrida, percebemos que tudo se resume a um grupo de veteranas e caloiras da escola da minha rua. Portanto, como se não bastasse a histeria inerente às praxes, tudo piora por serem apenas raparigas. À segunda volta ao jardim, o grupo já mudou de sítio e está agora perto de um repuxo, naquilo que penso ser o baptismo. É quase noite e as luzes do jardim ainda não se acenderam; as caloiras, lembro-me enquanto corremos, devem estar exaustas, depois de se espojarem no chão, gritarem algumas inanidades e serem humilhadas publicamente durante várias horas seguidas. Não sou a favor das praxes, acho que há outras formas de integrar as pessoas: correndo, por exemplo, ou simplesmente aproveitando a benévola sombra das árvores da Estrela. Para acalmarmos os pulmões dela, paramos aos vinte e oito minutos. Os candeeiros iluminam já o caminho e os sinos da Estrela marcam a oito horas da noite.
(Dos vinte, passamos hoje aos vinte e seis graus. É aquela altura do ano em que vamos ainda alternar entre o Verão que já terminou e o Outono que já apareceu por aqui. Já se corre ao anoitecer, da mesma maneira que quando acordo ainda é noite.)
(Dos vinte, passamos hoje aos vinte e seis graus. É aquela altura do ano em que vamos ainda alternar entre o Verão que já terminou e o Outono que já apareceu por aqui. Já se corre ao anoitecer, da mesma maneira que quando acordo ainda é noite.)
setembro 21, 2009
Prometo que é o último post sobre casamentos!
Este foi (finalmente) o último casamento do ano. A não ser, é claro, que haja aí alguém com planos maquiavélicos para me lixar o que me resta de ordenados até Dezembro. Ou haja alguma moça grávida que ache que deve casar antes do rebento chegar cá fora.
Desta vez, e para encerrar em beleza, fomos a um casamento muito do it yourself. A ideia era que cada convidado levasse algo consigo - comida ou bebida - para compor a mesa do copo de água, sendo que a cerimónia já tinha acontecido há um ano e os noivos não queriam ainda renovar os votos. Depois, assinalou-se o que cada um tinha levado numa espécie de piquenique em plena paisagem campestre e numa noite já de Outono. Outra das enormes vantagens foi o código de vestuário: casual mais casual não dava. Portanto, a ideia era reunir os convidados (em número diminuto, apenas o essencial) com comida caseira, sangria caseira, um cenário bucólico para partilhar a felicidade que já dura há uns bons anos.
Sinceramente, acho que é uma ideia a reter, mesmo para quem quer incluir a parte da cerimónia. O que se poupa em espaços, caterings e músicos contratados ganha-se em intimidade e proximidade com os convidados. Podemos escolher a nossa música, evitam-se os cardápios gastos e aborrecidos, os convidados podem participar mais dos festejos e prestar um muito esmerado serviço de bar. Compreendo perfeitamente quem deseja e sonha com outro tipo de dia para o seu próprio casamento mas já tenho visto tantas cerimónias alternativas e tantas soluções originais que me sinto cada vez mais longe das escolhas convencionais. Mas com ou sem arroz de marisco, com a presença do Mana ou de uma orquestra de cordas, aquilo que conta no final é com quem nos vamos deitar todos os dias a partir dali. E é inspirador ver que há tanta gente com certezas.
Desta vez, e para encerrar em beleza, fomos a um casamento muito do it yourself. A ideia era que cada convidado levasse algo consigo - comida ou bebida - para compor a mesa do copo de água, sendo que a cerimónia já tinha acontecido há um ano e os noivos não queriam ainda renovar os votos. Depois, assinalou-se o que cada um tinha levado numa espécie de piquenique em plena paisagem campestre e numa noite já de Outono. Outra das enormes vantagens foi o código de vestuário: casual mais casual não dava. Portanto, a ideia era reunir os convidados (em número diminuto, apenas o essencial) com comida caseira, sangria caseira, um cenário bucólico para partilhar a felicidade que já dura há uns bons anos.
Sinceramente, acho que é uma ideia a reter, mesmo para quem quer incluir a parte da cerimónia. O que se poupa em espaços, caterings e músicos contratados ganha-se em intimidade e proximidade com os convidados. Podemos escolher a nossa música, evitam-se os cardápios gastos e aborrecidos, os convidados podem participar mais dos festejos e prestar um muito esmerado serviço de bar. Compreendo perfeitamente quem deseja e sonha com outro tipo de dia para o seu próprio casamento mas já tenho visto tantas cerimónias alternativas e tantas soluções originais que me sinto cada vez mais longe das escolhas convencionais. Mas com ou sem arroz de marisco, com a presença do Mana ou de uma orquestra de cordas, aquilo que conta no final é com quem nos vamos deitar todos os dias a partir dali. E é inspirador ver que há tanta gente com certezas.
setembro 18, 2009
Cross-reference
Perto do canto inferior direito da fotografia, a mão dela, tremida, aberta, paira por cima da perna dele; a mão dele, semicerrada, está nem a um centímetro da dela. O que está nesta fotografia não é ela nem ele - é o plural.
(às vezes o mundo explode, o meu interior encolhe-se, fecha-se sobre si mesmo. às vezes sou toda agressão e as palavras falham-me. falha-me também a doçura no coração, escapam-se-me os vocábulos da ternura e é tudo amargo por dentro. tento imaginar até quando vou viver com o coração na boca, até quando serei onda de fúria irracional mas não consigo prever-lhe o fim. é uma experiência fora-de-corpo, a língua querendo furar a muralha de silêncio que também me imponho. mas, noutros dias, compreendo como tudo o que me foi dado é a maior das bençãos e que o que vejo de fora chama-se mesmo amor.)
(às vezes o mundo explode, o meu interior encolhe-se, fecha-se sobre si mesmo. às vezes sou toda agressão e as palavras falham-me. falha-me também a doçura no coração, escapam-se-me os vocábulos da ternura e é tudo amargo por dentro. tento imaginar até quando vou viver com o coração na boca, até quando serei onda de fúria irracional mas não consigo prever-lhe o fim. é uma experiência fora-de-corpo, a língua querendo furar a muralha de silêncio que também me imponho. mas, noutros dias, compreendo como tudo o que me foi dado é a maior das bençãos e que o que vejo de fora chama-se mesmo amor.)
setembro 17, 2009
Correr na Estrela #2
Ela voltou a vir comigo, depois de um intervalo de demasiados meses. Hoje não houve tempo para a bicicleta fixa mas em contrapartida os alongamentos foram bem melhores. O vento só não está demasiado frio porque estamos a fazer exercício - sente-se que o Outono está impaciente por chegar. Há dois rapazes brasileiros que não correm, apenas caminham pelo jardim, conversando calmamente. Um senhor com ancas de senhora ensaia os primeiros passos antes de atacar a corrida. Um ou dois casais de namorados resistem ainda à barreira das sete da tarde. As folhas prestes a sucumbirem à passagem das estações enchem o jardim de uma outonal melancolia.
setembro 16, 2009
All the people, so many people
A verdade é que, debaixo deste layout cor de rosa e destes sonhos todos, se esconde alguém que oscila cada vez mais nos sentimentos em relação às pessoas. Acho que nesta matéria chego a ser bipolar, tais são as variações entre os dois pólos das minhas relações com os outros.
Por um lado, ainda me consigo deslumbrar com a generosidade e princípios de algumas pessoas, com a genuína vontade de fazer bem sem esperar nada em troca. Mas por outro, e garanto que estes últimos dias não têm sido nada fáceis, há muito que sinto que a maioria das pessoas não merece a importância que me vejo obrigada a dar-lhes: as pessoas que não mexem uma palha para conseguirem o que lhes faz falta, as pessoas que cruzam os braços à menor dificuldade, as pessoas que desistem ao primeiro contratempo, as pessoas que arranjam subterfúgios e bodes expiatórios para fugirem às suas responsabilidades, as pessoas que nos descartam quando se fartam de nós ou quando já não lhes fazemos falta, as pessoas que usam outras e abusam da sua ingenuidade, as pessoas que nos tossem para cima no metro, as pessoas que não limpam os individuais depois do almoço.
Eu respiro fundo, juro que respiro, mas não tem sido fácil nestes últimos dias. Não é fácil impingir rectidão a quem não tem espinha e é impossível pedir a alguém que respeite os princípios em que não acredita. Felizmente, ainda não me conseguiram acabar com o optimismo e com a ideia de que há pessoas genuinamente boas, dificilmente corrompíveis, empenhadas em fazer deste um mundo melhor. Eu já VI estas pessoas. Falo com algumas todos os dias e sei que são muito mais do que apenas ingénuas. Mas estas pessoas são muitas vezes como as pedras naqueles jardins orientais: submersas, escondidas pelas águas paradas mas firmes na sua ligação ao outro lado. Eu batalho para estar também deste lado das trincheiras e tentar ser um exemplo de cidadania. Mesmo que me digam que o mundo é dos espertos.
Por um lado, ainda me consigo deslumbrar com a generosidade e princípios de algumas pessoas, com a genuína vontade de fazer bem sem esperar nada em troca. Mas por outro, e garanto que estes últimos dias não têm sido nada fáceis, há muito que sinto que a maioria das pessoas não merece a importância que me vejo obrigada a dar-lhes: as pessoas que não mexem uma palha para conseguirem o que lhes faz falta, as pessoas que cruzam os braços à menor dificuldade, as pessoas que desistem ao primeiro contratempo, as pessoas que arranjam subterfúgios e bodes expiatórios para fugirem às suas responsabilidades, as pessoas que nos descartam quando se fartam de nós ou quando já não lhes fazemos falta, as pessoas que usam outras e abusam da sua ingenuidade, as pessoas que nos tossem para cima no metro, as pessoas que não limpam os individuais depois do almoço.
Eu respiro fundo, juro que respiro, mas não tem sido fácil nestes últimos dias. Não é fácil impingir rectidão a quem não tem espinha e é impossível pedir a alguém que respeite os princípios em que não acredita. Felizmente, ainda não me conseguiram acabar com o optimismo e com a ideia de que há pessoas genuinamente boas, dificilmente corrompíveis, empenhadas em fazer deste um mundo melhor. Eu já VI estas pessoas. Falo com algumas todos os dias e sei que são muito mais do que apenas ingénuas. Mas estas pessoas são muitas vezes como as pedras naqueles jardins orientais: submersas, escondidas pelas águas paradas mas firmes na sua ligação ao outro lado. Eu batalho para estar também deste lado das trincheiras e tentar ser um exemplo de cidadania. Mesmo que me digam que o mundo é dos espertos.
setembro 15, 2009
Correr na Estrela #1
O meu pólo hoje parece especialmente imaculado. A terminar já quase depois de anoitecer, sinto que agora começou a nova época. Voltam as caras conhecidas, partem os corpos que apenas queriam estar em forma até ao Verão. A última criança no parque infantil quer sair do baloiço e chama insistentemente pela mãe, uma emigrante de Leste que fuma compulsivamente e bebe vinho de pacote num banco com uma amiga. Penso em todas as mulheres estéreis e em como a vida não devia ser uma dádiva tão aleatória. A dona do Igor, o labrador velhinho e atleta, também regressou. Respiro fundo e a tensão abrandou.
(Já faz um ano desde que comecei a correr no jardim da Estrela. Para começar, precisei da ajuda da minha irmã porque me sentia desadequada, ali meio desamparada. Depois, consegui passar a correr sozinha: chegava a casa, enfiava o equipamento, punha o cronómetro a postos e atirava-me à corrida. Hoje, depois de falhar algumas oportunidades devido ao cansaço e às férias, sei que adquiri um hábito. Ainda travo algumas batalhas interiores nos piores dias, tentando manter o mínimo dos trinta e três minutos por sessão, lutando contra a minha vontade de parar a todo o momento. Mas o que eu sei é que consegui sempre superar-me a mim própria. E isso justifica todo o suor do Mundo).
(Já faz um ano desde que comecei a correr no jardim da Estrela. Para começar, precisei da ajuda da minha irmã porque me sentia desadequada, ali meio desamparada. Depois, consegui passar a correr sozinha: chegava a casa, enfiava o equipamento, punha o cronómetro a postos e atirava-me à corrida. Hoje, depois de falhar algumas oportunidades devido ao cansaço e às férias, sei que adquiri um hábito. Ainda travo algumas batalhas interiores nos piores dias, tentando manter o mínimo dos trinta e três minutos por sessão, lutando contra a minha vontade de parar a todo o momento. Mas o que eu sei é que consegui sempre superar-me a mim própria. E isso justifica todo o suor do Mundo).
setembro 14, 2009
Viagem à cidade dos casamentos
Todas as imagens são deste fotógrafo.
Eu gosto muito de viajar mas lembrei-me nestes dias porque é que o avião se tornou num meio de transporte tão em voga. Passar dez horas (!) do meu dia dentro de um carro entre dois países que até me são queridos não é exactamente o tipo de viagem do qual gostaria de me recordar. Se a estas horas juntarmos a aridez de uma paisagem pouco atractiva (numa das raras excepções, hei-de voltar brevemente ao Monasterio de Piedra), os controlos sucessivos dos radares e a falta de música que nos apeteça ouvir, então a viagem torna-se ainda mais penosa.
Mas, mesmo tendo começado este relato com a única coisa realmente negativa ou pouco satisfatória destes dias, não posso dizer que não tenha adorado toda a sequência de eventos que se foram transformando em memórias muito rapidamente, tão rápido como as horas que voaram entre quinta-feira à tarde e domingo à noite. A logística de viajar com mais cinco pessoas revelou-se fácil de dominar em algumas alturas e menos boa de aturar noutras. Foi impressionante a velocidade com que se montou e desmontou um quarto em Madrid e agradável a articulação que permitiu que as refeições não se tornassem em momentos de ansiosa espera. Mas os banhos e as toilletes e as vontades de uns e de outros foram o mais difícil de conjugar.
O casamento foi bonito. Eu mal contive a emoção de ver a noiva entrar pelo braço do pai e de me aperceber dos nervos do noivo já no altar. É-me difícil explicar o que sinto quando vejo duas pessoas que realmente gostam uma da outra, mesmo com todas as teimosias e desentendimentos naturais a duas diferentes personalidades. Por isso, a emoção foi redobrada porque, além de enamorados, os noivos são bons amigos e merecem toda a felicidade do Mundo. Pela primeira vez, cheguei a um casamento pelo meu próprio pé, desfilando o meu modelito (ainda esperando fotografias à altura) pelas ruas abafadas e apinhadas de Zaragoza e à mercê das sandálias herdadas da minha mãe. Levados ao restaurante por um pequeno comboio, houve tempo para belíssimos copos de vinho branco, pão coberto com tomate e presunto, relva fresca e uma temperatura amena. Depois do jantar, foi dançar tanto quanto as sandálias permitiam, aproveitar a barra livre para pouco esmerados gins tónicos, recordar esta coreografia.
Zaragoza é uma cidade muito bonita mas eu sou suspeita porque também sou apaixonada pelas cidades espanholas. Fiquei impressionada com o cuidado com que estão tratados os marcos arquitectónicos da cidade (alguns pareciam acabados de construir!), com a imponente Plaza del Pilar e pelas várias pontes sobre o Ebro. É uma cidade muito viva, pulsante, com sessões de tango em pequenas praças e uma zona em requalificação depois da Expo do ano passado. E - confirma-o quem esteve lá comigo - é a cidade das noivas e dos casamentos. Havia noivas por todo o lado: cafés, encostadas a montras, a chegar à recepção dos hotéis, sobre as pontes e nos ancoradouros do Ebro. Com elas, os noivos, passeando a pé pela cidade e acompanhados pelos fotógrafos de serviço. É como se a vontade de casar ali fosse contagiosa. Voltei solteira, caso queiram saber.
Mas, mesmo tendo começado este relato com a única coisa realmente negativa ou pouco satisfatória destes dias, não posso dizer que não tenha adorado toda a sequência de eventos que se foram transformando em memórias muito rapidamente, tão rápido como as horas que voaram entre quinta-feira à tarde e domingo à noite. A logística de viajar com mais cinco pessoas revelou-se fácil de dominar em algumas alturas e menos boa de aturar noutras. Foi impressionante a velocidade com que se montou e desmontou um quarto em Madrid e agradável a articulação que permitiu que as refeições não se tornassem em momentos de ansiosa espera. Mas os banhos e as toilletes e as vontades de uns e de outros foram o mais difícil de conjugar.
O casamento foi bonito. Eu mal contive a emoção de ver a noiva entrar pelo braço do pai e de me aperceber dos nervos do noivo já no altar. É-me difícil explicar o que sinto quando vejo duas pessoas que realmente gostam uma da outra, mesmo com todas as teimosias e desentendimentos naturais a duas diferentes personalidades. Por isso, a emoção foi redobrada porque, além de enamorados, os noivos são bons amigos e merecem toda a felicidade do Mundo. Pela primeira vez, cheguei a um casamento pelo meu próprio pé, desfilando o meu modelito (ainda esperando fotografias à altura) pelas ruas abafadas e apinhadas de Zaragoza e à mercê das sandálias herdadas da minha mãe. Levados ao restaurante por um pequeno comboio, houve tempo para belíssimos copos de vinho branco, pão coberto com tomate e presunto, relva fresca e uma temperatura amena. Depois do jantar, foi dançar tanto quanto as sandálias permitiam, aproveitar a barra livre para pouco esmerados gins tónicos, recordar esta coreografia.
Zaragoza é uma cidade muito bonita mas eu sou suspeita porque também sou apaixonada pelas cidades espanholas. Fiquei impressionada com o cuidado com que estão tratados os marcos arquitectónicos da cidade (alguns pareciam acabados de construir!), com a imponente Plaza del Pilar e pelas várias pontes sobre o Ebro. É uma cidade muito viva, pulsante, com sessões de tango em pequenas praças e uma zona em requalificação depois da Expo do ano passado. E - confirma-o quem esteve lá comigo - é a cidade das noivas e dos casamentos. Havia noivas por todo o lado: cafés, encostadas a montras, a chegar à recepção dos hotéis, sobre as pontes e nos ancoradouros do Ebro. Com elas, os noivos, passeando a pé pela cidade e acompanhados pelos fotógrafos de serviço. É como se a vontade de casar ali fosse contagiosa. Voltei solteira, caso queiram saber.
setembro 10, 2009
Mini Vacaciones
Não tenho ainda a mala feita mas parto para Madrid dentro de algumas horas. E amanhã, por estas horas, estarei em Zaragoza para celebrar mais um casamento daqueles amigos de sempre. Posso desde já confirmar-vos que aquele ditado De Espanha nem bom vento, nem bom casamento é uma grandessíssima treta. E além de estar felicíssima pelos noivos, estou encantada por conhecer outra cidade espanhola e, quem sabe, ainda ir a tempo de beber um tinto de Verano.
Hoje relembrei como gosto da minha cidade durante as manhãs. Gosto de senti-la a acordar, ver como timidamente as pessoas se atrevem a enfrentar o calor que já faz às nove da manhã, tomar o pequeno-almoço numa esplanada pouco abrigada do Sol. É como se, estando longe, não pudesse imaginar como pulsam estas ruas, como se formam as filas a chegar ao Rossio, como se descobrem hábitos sem esforço. E depois entrar em casa das minhas avós (cada vez mais só mulheres, não quero lembrar-me mais disto) e ver como evitam o calor e lembrar também que o único barulho que vem da rua são as vozes das vizinhas que se demoram a conversar por ali. E também tive mais uma prova de que não devemos perder a fé na humanidade e humildade dos outros, na capacidade de aceitar uma vocação mas disto também não queria lembrar-me mais. Tudo depois de dar uns 400ml de sangue, depois de alguns anos de pausa e continuando com a tradição do meu avô. Talvez ele se sinta orgulhoso de mim noutro sítio qualquer.
E escrevo agora noutro sítio, mais precisamente aqui. É um trabalho feito a dois, em plena construção, recém-nascido de tantas tardes de Verão. Espalho a minha verborreia por todo o lado. Por falar nisso, vou agora tratar de a acomodar na mala. Madrid e a paella deste menino já me esperam. Hasta luego!
Hoje relembrei como gosto da minha cidade durante as manhãs. Gosto de senti-la a acordar, ver como timidamente as pessoas se atrevem a enfrentar o calor que já faz às nove da manhã, tomar o pequeno-almoço numa esplanada pouco abrigada do Sol. É como se, estando longe, não pudesse imaginar como pulsam estas ruas, como se formam as filas a chegar ao Rossio, como se descobrem hábitos sem esforço. E depois entrar em casa das minhas avós (cada vez mais só mulheres, não quero lembrar-me mais disto) e ver como evitam o calor e lembrar também que o único barulho que vem da rua são as vozes das vizinhas que se demoram a conversar por ali. E também tive mais uma prova de que não devemos perder a fé na humanidade e humildade dos outros, na capacidade de aceitar uma vocação mas disto também não queria lembrar-me mais. Tudo depois de dar uns 400ml de sangue, depois de alguns anos de pausa e continuando com a tradição do meu avô. Talvez ele se sinta orgulhoso de mim noutro sítio qualquer.
E escrevo agora noutro sítio, mais precisamente aqui. É um trabalho feito a dois, em plena construção, recém-nascido de tantas tardes de Verão. Espalho a minha verborreia por todo o lado. Por falar nisso, vou agora tratar de a acomodar na mala. Madrid e a paella deste menino já me esperam. Hasta luego!
setembro 07, 2009
Este não é um post sobre moda.
Portanto, ainda não sou aquilo que se pode chamar de "senhora". Acabei de me sentar no sofá vinda da casa de banho e posso assegurar-vos de que isto não correu nada bem: confundi sombra dos olhos com baton... Portanto, tinha baton nas pálpebras, um risco preto completamente desregrado, só as pestanas é que se safaram. Mais do que não ter jeito, acho que não tenho gosto. Não faço a menor ideia do que me fica bem e acho, no geral, que acabo sempre parecida com uma estrela de filmes de qualidade duvidosa de cada vez que me tento maquilhar. Sempre que me vejo numa fotografia maquilhada, sou como um pequeno peixe dourado, que constantemente renova as suas memórias e pergunta Quem é esta?
A minha falta de habilidade não se fica por aqui: há os saltos, por exemplo. Já usei saltos altos (aí no meu primeiro ano de faculdade, há... [tosse] doze anos) mas foi uma escolha passageira. Tenho tentado arriscar mas só eu sei como me sinto desadequada em cima das cunhas, do salto mais moderado ou dum agulha mais atrevido. O mundo das entrevistas de emprego vive das aparências dos candidatos, que muitas vezes não são avaliados pelo currículo ou experiência profissional, mas sim pelo que aparentam ser. Não é necessário dizer como me senti fora da minha zona de conforto ao ser conduzida por corredores estranhos e sentada em escritórios pouco familiares sem estar confortável. Eu gosto da simplicidade e chinelos Birkenstock para poder palmilhar as ruas de Lisboa. Aliás, se pudesse andava sempre descalça.
Tenho um casamento na sexta. Tenho tudo pronto a usar, a vestir, a estrear. Na minha cabeça, começam a fervilhar as ideias de desconforto, de estranheza em frente ao espelho. Quase a chegar aos trinta, devia também chegar a essa idade adulta?
A minha falta de habilidade não se fica por aqui: há os saltos, por exemplo. Já usei saltos altos (aí no meu primeiro ano de faculdade, há... [tosse] doze anos) mas foi uma escolha passageira. Tenho tentado arriscar mas só eu sei como me sinto desadequada em cima das cunhas, do salto mais moderado ou dum agulha mais atrevido. O mundo das entrevistas de emprego vive das aparências dos candidatos, que muitas vezes não são avaliados pelo currículo ou experiência profissional, mas sim pelo que aparentam ser. Não é necessário dizer como me senti fora da minha zona de conforto ao ser conduzida por corredores estranhos e sentada em escritórios pouco familiares sem estar confortável. Eu gosto da simplicidade e chinelos Birkenstock para poder palmilhar as ruas de Lisboa. Aliás, se pudesse andava sempre descalça.
Tenho um casamento na sexta. Tenho tudo pronto a usar, a vestir, a estrear. Na minha cabeça, começam a fervilhar as ideias de desconforto, de estranheza em frente ao espelho. Quase a chegar aos trinta, devia também chegar a essa idade adulta?
setembro 03, 2009
Como rebolar a rua Domingos Sequeira numa noite (quase de fim) de Verão
(Se um dia me dissessem o que havia de gostar de sushi, provavelmente não iria acreditar e iria falar do prazer que é comer um bife grelhado na pedra, mal passado, ainda escorrendo um pouco de sangue. Já pensei algumas vezes em ser vegetariana mas nada de muito sério e acabo sempre por voltar à cena omnívora sem grandes contemplações. E também já pensei em deixar só de comer carne vermelha mas desisti, comer é bom demais para fazer escolhas dessas. Hoje foi noite de muito camarão e rebentos de soja, salmão e abacate, lulas e ananás e uma pequena garrafa de saké quente para ajudar a fazer a digestão. Resultado? As minhas capacidades de locomoção ficaram severamente afectadas mas em contrapartida o fresco da noite soube-me pela vida.)
setembro 02, 2009
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