(A foto é confusa. Não, não é isso que quero dizer: não se percebe nada. Às vezes é o que vemos quando temos os sentidos concentrados noutras coisas.)
O local: Lisboa, véspera de feriado
As condições climatéricas: noite de vento, aguaceiros incómodos mas temperatura agradável.
Há muito que não saio. Fico boquiaberta quando descubro que o Largo Camões está relvado, pelo menos temporariamente mas não estranho as pessoas que esperam por alguém neste ponto de encontro. Já há quem nos espere, portanto consigo fugir à angústia inicial do sítio a escolher, de ouvir mais uma vez 'Vá lá, tu é que sabes. Sabes que eu nunca decoro nada...' - eu também não consigo. Na rua não há tanta gente como suspeitava, o que significa que ainda é relativamente fácil chegar à cerveja (o mesmo não acontece com as casas de banho imundas que nos ofereciam naquele lugar). Conversamos em mais do que um idioma e rimos que nem tontos quando falamos dos casamentos em Espanha e quando comentamos o jogo do nosso Benfica. Na rua passa um rapaz de pestanas enormes que tinha visto o jogo no mesmo café da Estrela: só lhe decorei as pestanas.
Quando tentamos mudar de pouso, está tudo tão cheio, há tanta gente à porta, não sei, se calhar já devíamos estar à espera. Começa a chover e não conseguimos abrigar-nos. 'Vamos dançar?', pergunto eu a medo, temendo que os outros corpos não desejassem movimento como o meu. Para meu espanto toda a gente concorda na hora. 'Estamos nas tuas mãos', diz alguém. Apressamos o passo e entramos no Incógnito completamente encharcados - não entrava lá há demasiado tempo. A pista está cheia, mal consigo mexer-me mas já tinha decidido que nada me ia privar de dançar. Nem mesmo rapazes demasiado grandes e desajeitados ou tias que por ali param porque querem ser da moda. Apetece-me mais uma cerveja mas não quero sair da pista. Não vou. Danço tudo e fecho os olhos muitas vezes: é como se estivesse num Karrera Klub. Um rapaz muito atraente e muito latino, de blaser escuro e cabelo puxado com gel dança à minha frente, vai dançando cada vez mais perto, até que preciso afastar-me para não dançarmos colados. Ele sabe que se está a colar a mim. Está de costas para mim e consigo cheirar-lhe o perfume. Ele sai e nós ficamos. A pista está finalmente mais descomposta e podemos fazer movimentos mais amplos. É a segunda vez que danço a Rebellion (Lies) fora de casa e ainda me custa a crer.
O rapaz moreno está à porta mas não me vê sair. Subimos as ruas com cuidado, tentando não escorregar na calçada molhada. Deito-me cansada e confusa, já sei que vou sonhar. Francamente, devia andar mais vezes na rua.
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