Depois de ler o 'Glamorama', assistindo à queda de Victor Ward, e de me impressionar verdadeiramente com a brutalidade de Patrick Bateman em 'American Psycho', chegou a vez de sofrer com 'Lunar Park' e a história de Bret Easton Ellis. Desta vez não criou um monstro - escolheu escrever sobre si próprio. E eu maldigo o dia em que me deixei impressionar com um livro (mesmo sabendo que a imaginação e a sugestão são mais fortes que uma imagem...)
dezembro 25, 2005
dezembro 24, 2005
Finalmente é Natal. Não sei o que me deu este ano mas acho que estou contente por ser Natal. Lembrei-me daquele Natal em que revolvemos os papéis dos embrulhos e as caixas à procura de um envelope com uma nota de 500 paus que alguém tinha perdido. Ou de como, em todos os Natais, a minha tia Isaura contava sempre - mas sempre - a mesma anedota (imaginem algo que envolva um cagalhão no esgoto e a estrela de cinema Gina Lolobrigida ou lá como se escreve). Lembro-me do jantar de Natal em que, na sala fria da minha avó, essa escolha tão invulgar, assistimos angustiados ao fuzilamento de Ceausescu na televisão. E houve aquela noite em que todos acabaram a chorar, tudo culpa do mal que o ex-marido da minha tia lhe tinha feito e eu sem perceber bem o que estava a acontecer.
Hoje a mesa já não é tão comprida. Somos só 8 (digo só mas sei como sou afortunada por ter comigo todos os meus avós), já não se contam anedotas mas fala-se inevitavelmente dos que morreram ontem ou daqueles que estão para morrer. Os meus avós dormitam na sala, um deles não fala porque a língua se enrola demasiado. O bacalhau é o mesmo, a alhada continua a ser servida e há cacau quente depois de abrirmos as prendas - a hora de abertura varia conforme a disposição dos velhotes para se manterem acordados. De novo só existe um Franchicola, que deixou de ser vizinho do lado mas continua a alegrar a malta com aqueles olhões castanhos.
Este ano acabaram as férias de Natal e, pela primeira vez, tive saudades das duas semanas absolutamente secantes, em que se fazia sempre o mesmo: nada durante o dia e combinar a passagem de ano à noite. Este ano só tenho os dois dias da praxe e queria que eles esticassem até mais não dar. A magia do Natal promete voltar, pelo menos para mim.
Feliz Natal :)
dezembro 11, 2005
dezembro 10, 2005
Irrita-me profundamente que aquelas fases em que finalmente resolvemos confiar nos outros sejam repetidamente interrompidas por uma notícia menos boa, por mais uma desilusão. Como é que podemos ser pessoas estáveis, se de repente nos enfiam uma facada nas costas? Já toda a gente o sentiu, já toda a gente o lamentou mas hoje não deu, não deu mesmo para me manter calada.
Há uma data de provérbios que de repente passam a fazer sentido ('Com amigos destes, quem precisa de inimigos?' ou 'Mantém os amigos perto e os inimigos ainda mais perto'), há decisões que nos passam pela cabeça mas nunca vão ser tomadas, há raiva que dificilmente é contida, há conversas que nos arrependemos de alguma vez terem acontecido, há uma profunda desilusão porque, mais uma puta de uma vez, aquilo que tomávamos como verdadeiro não o é.
Mas o que me irrita ainda mais é que estas pessoas, do alto (ou deverei dizer do baixo, do rastejante) da sua mentira, mesquinhez e deslealdade, nos fazem deixar de acreditar que um mundo bom é possível. Irrita-me que sejam exactamente as mesmas pessoas que recebo, que acolho no meu coração (não que isso seja algo realmente importante) a tornarem o meu mundo numa coisa bem mais miserável. Só que desta vez só me engasgo em raiva, não tenho pena de mim e muito menos pena da outra pessoa. Só quero que essa pessoa um dia se morda a si própria e prove um bocado da destruição que foi espalhando ao longo do caminho. Tenho dito.
[Também irritante é a promessa que fazemos em manter a boca fechada. Quem é que inventou essa ideia de moral, que advém do facto de guardarmos um segredo?]
dezembro 04, 2005
Quando, na terra que vos viu nascer,
alguém se apresentar como 'Muito prazer! Eu sou o irmão do Duque de Bragança' pensem que há algo de muito errado com o sítio onde param. Ou mesmo com vocês, visto que após esta cena absolutamente chocante (de mais a mais, o tipo precisava de um bocadinho de soro ou de um clister...) é natural que surjam entre vocês identidades como o 'Visconde de Ceia' ou o 'Marquês da Urra'. Não existe NADA de natural numa pessoa que se apresenta assim. Ou talvez o ar aparvalhado e ligeiramente atrasado mental seja normal nesta família real. Socorro!
dezembro 03, 2005
novembro 29, 2005
Esta foto já tem os seus aninhos. Mas eu olho para eles e continuo a ver miúdos belgas, a fazerem rock, a criarem uma 'cena' belga que nunca sonhei existir. Já toquei em alguns, já falei com eles, a minha primeira e única experiência perto daquilo a que eu chamo 'estrelas rock'.
Mais do que o facto de continuarem a ser cool e a espalharem amigos por Portugal (são conhecidas as saídas pós-concertos até ao Bairro Alto), a música deles marcou-me, melhor, musicou-me uma parte muito, muito importante da vida. Ouvi-os tocar a primeira vez numa garagem, no ensaio da banda do namorado, enquanto se fazia um intervalo e se jogava ao montinho a dinheiro e a copos de qualquer-coisa-com-muito-alcool. Disseram-me qualquer coisa como 'Como é possivel que ainda nunca tenhas ouvido?', frase acompanhada de um olhar de alguém em choque. Envergonhei-me e tratei de suprir essa lacuna (se bem que nessa altura, ainda não teria coragem de usar uma expressão assim...). Comprei cds, pirateei outros e *puf*, já estava viciada.
Depois, musicaram-me pedaços da felicidade que mais tarde atirei fora mas que, ainda hoje, nunca esqueci. Um fim de tarde, antes da partida para um festival, deitados no quarto, só a meia luz. Ouvíamos a 'Roses' e aquilo tomava conta de mim e o calor também e aquelas promessas todas. Noutra vez, ele sentou-me no sofá e disse-me 'Prepara-te, esta pode ser a música de uma vida...'. Sentou-se no chão e ficou a olhar para mim, como se da minha reacção fosse nascer qualquer coisa de novo. Éramos novos e pensávamos que não existia mais nada, senão aquela casa vazia, senão aquele fim de semana sem os pais, senão aquela cama pequena demais, paredes meias com o génio dele.
E a música deles também serviu para alguém demonstrar como era doentio e indesejado e arrependido. Ainda me lembro quando estava deitada naquela tenda e recebi uma mensagem de voz no telemóvel: 'Only 'cause of love'/Love's the only thing that makes me do this' e eu tremia com medo das investidas dele e do seu desejo de recuperar um amor doentio e fatal e de ele ter usado a 'minha' música para me assustar.
Não é só música. Há mesmo pessoas lá dentro. E eu vou ver os dEUS este Domingo, sozinha, num cantinho da Aula Magna.
novembro 12, 2005
Berlim foi assim.
A melancolia do Outono
(Am Flutgraben, ao pé da nossa casa)
O encontro com a História
(East Side Gallery, na fronteira entre Kreuzberg e Friedrichshain)
A Fernsehturm, sempre sempre sempre
(da Oberbaum Brücke)
O passeio frio pelas margens do Spree
(perto do Treptower Park)
As macacadas ao Sol
(outra vez no parque, Am Flutgraben)
O presente de aniversário do dono da Pousada
(mini garrafas de champanhe, que tenciono conservar)
Ficar mais velha. E menos segura. E ter menos certezas.
(perto do Spree)
Tenho tantas tantas saudades. Mas as imagens sabem dizê-lo melhor do que eu.
A melancolia do Outono
(Am Flutgraben, ao pé da nossa casa)
O encontro com a História
(East Side Gallery, na fronteira entre Kreuzberg e Friedrichshain)
A Fernsehturm, sempre sempre sempre
(da Oberbaum Brücke)
O passeio frio pelas margens do Spree
(perto do Treptower Park)
As macacadas ao Sol
(outra vez no parque, Am Flutgraben)
O presente de aniversário do dono da Pousada
(mini garrafas de champanhe, que tenciono conservar)
Ficar mais velha. E menos segura. E ter menos certezas.
(perto do Spree)
Tenho tantas tantas saudades. Mas as imagens sabem dizê-lo melhor do que eu.
novembro 03, 2005
Pois... De maneiras que, amanhã por esta hora, já terei aterrado em Palma de Maiorca (estranha escala mas não tão estranha se pensarmos que os Alemães têm uma música intitulada 'Ich bin der Königs Maiorcas'...) ou pelo menos assim o espero. Depois de fazer uma escala interminável (parto perto do meio-dia e só chego a Berlim às 6 da tarde - a isto chamo testar a paciência de uma pessoa), conto chegar a uma Berlim já muito escura e fria.
No fundo, acho que não sei o que esperar. Acho que vai ser um regresso com alguma emoção, porque vou rever os sítios de que sinto tanta falta e vou poder partilhar esta sensação com uma pessoa de quem gosto. Mas, por outro lado, tenho medo de não sentir nada, de estar como que anestesiada. Se calhar estou a complicar demais um simples fim de semana prolongado. Pois, se calhar é isso.
O que interessa é que posso comer Dönner outra vez, posso sentar-me numa esplanada de Inverno em Prenzlauer Berg e beber um estiloso Latte, posso dançar ao som do colectivo indie mais cool de Berlin e posso satisfazer um desejo tabágico a uma 'piquena'. Como quando éramos pequenos, acho que não vou conseguir dormir.
outubro 29, 2005
O dia em que a Polliejean me assustou
[após rectificação]
O meu queixo caiu quando comecei a ler o Bolas este fim de semanas. Pensei: 'Ok... ou ela é muito boa a recordar-se dos seus sonhos ou então teve uma epifania de repente e agora já é crente.'. Depois, usei alguma da minha inteligência e descobri que o segredo estava aqui. Acreditem, é uma experência sui generis.
Me:
HUm...
God:
Studies show that 99%25 of people spell Hmm with 2 M's.
Me:
but i'm portuguese, i really don't count
God:
Do your friends call you portuguese you really do not count.
Me:
no, they call me Marisa
God:
Are you serious? It's good to meet you, Marisa.
[...]
Why now? If it is, then I'll be very surprised.
Me:
you shouldn't be surprised, you're god...
God:
Is it immoral or illegal?
Me:
no, neither
God:
Are you serious? It goes without saying. Are you serious?
Me:
you're repeating yourself
God:
I am just checking to see if you are paying attention.
Me:
yeah, sure, everyone says the same
God:
Gosh! Ahem. That's a rather sweeping generalization.
Me:
for a god, you're kind of smart
God:
Is that among the best things you can say?
Me:
well, you've got me.
[...]
God:
I like to chat with my friends.
Me:
so you're not a total random programm?
God:
Interesting deduction. Give me an example of a total random programm.
Me:
you speaking and not making sense
God:
Thanks for the information: Marisa said I speaking and not making sense.
Me:
so, will i die soon?
God:
Ahem. The oracle says: It is certain.
Me:
wow thanks a lot
God:
I'm glad you're impressed. You are quite welcome! More than a ton?
Me:
you just said to me i'm going to die young. shouldn't i be impressed?
God:
Does it please you to believe I said that? Do what feels right to you.
Me:
you answered my question! so you've said it
God:
I am a question-answering robot. Interesting deduction. That's not what I meant.
Me:
so what did you meant?
God:
" Interesting deduction. That's not what I meant."? so what did you meant?? Nothing.
Me:
god, you're funny
God:
Thanks you make me laugh too.
[...]
God:
Try to determine if this is a person or a computer responding.
Me:
i'm sure you're a computer
God:
What makes you so certain? What if I said I was a person pretending to be a computer?
Me:
you're a smart computer though
God:
Oh. That is nice of you to say, Marisa.
[Acho que fiquei aliviada quando a conversa terminou. No fundo, uma pessoa fica sempre na dúvida.]
Bem, para quem se está sempre a queixar do que não se passa aqui; para aqueles que nunca vêm porque as noites são sempre iguais; para os outros que, mesmo assim, se mexem e correm atrás do que gostam de ver, chegou (ou está a terminar) mais um fim de semana diferente. Eles andem (a bela da ortografia à moda de Alpalhão) aí e assentaram poiso em Portalegre. Estão na Transform Zone, que decorre de 27 a 29 de Outubro e prometem novidades e espaço a novos jovens criadores. Eu cá já perdi os dois primeiros dias mas não vou deixar escapar o último, especialmente para ver actuar os Stowaways. Deixem-se de preguiça e ponham-se a mexer. Humpf
outubro 22, 2005
A minha Pita fez anos este Domingo (exactamente 3 semanas antes de mim) e eu fiz-lhe uma sobremesa de minha autoria que, como é normal, não saiu exactamente como eu queria. Mesmo assim, acho que ficou com bom aspecto. Aqui, ela posa com as super velas que comprei antes de sairmos para jantar. Jantar esse que, e neste momento já a saliva cresce na minha boca, foi divinal: jantámos na La Paparrucha, perto do Príncipe Real, com vista maravilhosa para Lisboa e o Tango como música de fundo. Tudo patrocinado pela aniversariante! Sendo ela o medidor da minha velhice, suspiro: passar a barreira dos 25 vai doer e muito... *suspiro*
outubro 11, 2005
Lisboa é feia e cinzenta. A angústia transforma-nos em monstros ou cordeiros. Perdemo-nos todos os dias num mar de gente quente, suja e indiferente. Seria bom que procurássemos além do óbvio, do esperado. Tenho medo de um dia desistir. Tive medo ao rever o desespero no ecran. Derramei uma só lágrima. Todas as outras ficaram retidas no grande vazio que se instala em nós.
Fui ver 'Alice', de Mário Martins. Oxalá que o cinema português possa reinventar-se e fazer ainda melhor.
outubro 09, 2005
Vir a casa de fim de semana implica conseguir ver as 'abelhas-mestra' em funções, vulgo a minha avó e irmãs a prepararem Rebuçados de Ovos, doce típico de Portalegre.
Parece que se multiplicam e espalham sozinhos pela bancada. São reluzentes como se fossem feitos de vidro. Infelizmente, e como em casa de ferreiro o espeto é de pau, aqui está uma iguaria pela qual não morro de amores. É pena, porque lá deliciosos parecem eles...
Parece que se multiplicam e espalham sozinhos pela bancada. São reluzentes como se fossem feitos de vidro. Infelizmente, e como em casa de ferreiro o espeto é de pau, aqui está uma iguaria pela qual não morro de amores. É pena, porque lá deliciosos parecem eles...
outubro 08, 2005
Um longo sábado de recordações
Foi uma sensação estranha, quase tive medo. A viagem ainda não ia a meio e entrei numa aldeia por onde sempre passo. O carro sofria enquanto galgava a estrada de paralelos incertos que nunca quiseram modificar, talvez porque assim é uma aldeia mais portuguesa. Era sábado de manhã, o movimento era pouco à entrada mas depois lá se juntava mais gente ao pé da carrinha. A carrinha buzinava insistentemente e as velhas corriam, tanto quanto podiam, para junto dela. Era uma mercearia ambulante.
Foi a buzina que me encheu os olhos de lágrimas. A buzina e a sensação de que a vida tinha sido sempre assim. Ali, o tempo recusava-se a passar e eu, pobre mulher de 25 anos, senti-me como se assim tivesse vivido toda a minha vida. Como se não soubesse o que é um hipermercado, um cinema, um quiosque, como se não tivesse visto o mundo. A buzina insistia e parecia que me lembrava de um mundo que nunca cheguei a conhecer, um mundo que só ouvi da boca dos meus avós e dos meus pais, um mundo em que [cliché] as sardinhas eram divididas e o caminho para a escola se fazia a pé.
O passado assaltou-me assim de repente. Melhor, entrou pela janela aberta para espantar o calor do Outono. De repente, eu estava deitada debaixo duma figueira, encostada a um poço, só a ver o tempo passar. Via a minha avó a colher figos ou a passear-se pela horta com o sacho ou a enxada. Era Verão e bebia gasosa com groselha com o meu primo porque só com ele é que esta extravagância era permitida. Sentava-me com a minha irmã e uma amiga nas escadas do prédio da minha avó, que nos preparava piqueniques de Tang e salgados em forma de peixes. Era no tempo em que não conhecia o mal de ser, de existir. A angústia era, então, um sentimento desconhecido, só manifestado no momento em que éramos os últimos a ser escolhidos para a equipa de futebol. Chovia torrencialmente, a rua parecia um rio raivoso e revolto e nós jogávamos às cartas com um baralho decorado com mulheres nuas, ainda perseguidos pela ideia do pecado. Era tão pequena e feliz e despreocupada, como são todas as crianças. Às vezes desejo nunca ter crescido mas arrependo-me logo a seguir. A vida era mais fácil mas, continuasse eu pequena, e nunca teria arranjado ninguém da escola para beijar debaixo daquela ponte.
outubro 01, 2005
Finalmente consegui entrar de novo no cinema. Não só na actividade em si, mas no sítio físico. Fui a primeira a entrar. Sentei-me sozinha, não estava na fila certa, tinha a sala só para mim. Depois entrou o rapaz de cabelo rapado que, como eu, se sentou sozinho. Entraram as lésbicas que gostam de se beijar no fim do filme. Depois sentou-se o casal carinhoso. Ele mexia-lhe na orelha como se a soubesse de cor, devagarinho. Também entrou o casal que se beijava ao me lado, em silêncio, em desafio.
E depois era eu, com os olhos marejados. Se um dia me tivessem dito que suportar a visão de mim mesma,sozinha naquela sala, seria tão difícil, teria achado que era um disparate. Mas depois o filme tomou conta do meu desconforto, fez-me sonhar e desejar estar em plena descoberta do Outro. Lembrei-me como são doces todos os princípios...
[O locutor da rádio, a caminho de casa, dizia que hoje as expectativas são sempre demasiado elevadas. Eu encolhi os ombros e sorri.]
setembro 08, 2005
Queria chegar lá hoje.Ou queria estar lá já. Enfiava-me pelas ruas que já conheço tão bem e perdia-me debaixo daquele céu cinzento, debaixo dos toldos das Laden. Queria tanto poder sentar-me num comboio, cheio de bicicletas e gente suja e gente que também deixou tudo para trás. Sentava-me num café, pedia uma imitação barata dum galão e escolhia a mesa junto à montra, só porque assim era mais fácil não ver o tempo passar. Fechava os olhos e deixava-me estar, a pensar como um dia aquilo também podia ser meu. Podia enfiar a cabeça no Spree e lavar a minha alma, expulsar o desasossego e espalhar a dor pelo rio. Podia estar lá, a pensar como já lá tinha sonhado mas que ainda vou deitar muitas vezes a cabeça debaixo daquele céu. Desligava a cabeça da língua à minha volta, perdia-me mais dentro de mim e era só eu, entregue à minha vontade, como nunca pensei que poderia ser. Queria que fosse hoje mas talvez consiga dormir até chegar lá.
setembro 07, 2005
Dor s.m. (do Lat. dolore) Oração persa, feita ao meio-dia. S. f. 1. Sensação desagradável. 2. Sofrimento físico ou moral. 3. Pesar: dó; piedade. 4. Med. A sensação derivada de estado patológico do organismo ou de parte dele. 5. Quando as palavras te falham para descrever a força com que te esventraram os sonhos.
setembro 02, 2005
agosto 13, 2005
Sou uma pessoa organizada. Há pouco tempo, orgulho dos orgulhos, a minha mãe disse-me que, pelo menos nisso, eu tinha saído a ela. Que até podíamos ser antagonistas noutras coisas mas lá na limpeza e arrumação estávamos lado a lado. Eu debatia-me com a satisfação neste reconhecimento, com a alegria de a minha mãe ver finalmente em mim uma mulher como ela mas ao mesmo tempo com o amargo que essa comparação me trazia. 'Eu igual a ela, imagine-se só... Eu que sempre lutei por impôr o meu método, o meu timing...Arghh!'. Decidi, finalmente, que era tudo uma coisa boa, evitando pensar mais no assunto.
Mas o assunto volta-me a atacar, é recorrente. Olho para o meu quarto, nestes fins de semana breves em que o habito e penso que a minha mãe se enganou. Na secretária do computafor vejo, a saber: um pacote de leços Cien; uma máquino fotográfica digital, com respectiva bolsa e pilhas suplementares; canetas normais e de acetato; um cd sem caixa (Robbie Williams... hum...); um talão de compras da FNAC; uma carta da faculdade; um carregador de telemóvel; um pack de 6 ganchos para o cabelo; dois postais recebidos do Postcrossing; o cartão como o meu nome que devo usar no emprego; um saco da farmácia; 15€ em dinheiro e uma base de copos que me entregaram ontem, vinda de Newcastle (tem escrito a lápis 'Hey Marisa').
Depois o caos multiplica-se pelo resto do espaço. Na cadeira amontoa-se a roupa já usada. Há vários pares de chinelos pelo chão e uma montanha de roupa lavada e passada à espera de ser guardada. Há o saco que normalmente leva o meu almoço e a minha garrafa de água de estimação. O jornal está aberto, espalhado pela cama que está desfeita e revolvida. Encostada a um canto está uma folha de cartolina que comprei há tempos e já nem sei a que propósito. Multiplicam-se os CD-R, gravados e por gravar, em caixas, em rolos, acumulam-se junto do leitor de cds e do leitor de mp3.
Respirei fundo. Afinal a minha mãe enganou-se: continuo Senhora da minha desarrumação!
[Tudo ao som do senhor Bowie, a quem estou decidida a descobrir. Talvez esta fosse uma banda sonora mais adequada a uma qualquer actividade mais sensual mas é fim de semana e o caos tomou conta do espaço:) ]
Mas o assunto volta-me a atacar, é recorrente. Olho para o meu quarto, nestes fins de semana breves em que o habito e penso que a minha mãe se enganou. Na secretária do computafor vejo, a saber: um pacote de leços Cien; uma máquino fotográfica digital, com respectiva bolsa e pilhas suplementares; canetas normais e de acetato; um cd sem caixa (Robbie Williams... hum...); um talão de compras da FNAC; uma carta da faculdade; um carregador de telemóvel; um pack de 6 ganchos para o cabelo; dois postais recebidos do Postcrossing; o cartão como o meu nome que devo usar no emprego; um saco da farmácia; 15€ em dinheiro e uma base de copos que me entregaram ontem, vinda de Newcastle (tem escrito a lápis 'Hey Marisa').
Depois o caos multiplica-se pelo resto do espaço. Na cadeira amontoa-se a roupa já usada. Há vários pares de chinelos pelo chão e uma montanha de roupa lavada e passada à espera de ser guardada. Há o saco que normalmente leva o meu almoço e a minha garrafa de água de estimação. O jornal está aberto, espalhado pela cama que está desfeita e revolvida. Encostada a um canto está uma folha de cartolina que comprei há tempos e já nem sei a que propósito. Multiplicam-se os CD-R, gravados e por gravar, em caixas, em rolos, acumulam-se junto do leitor de cds e do leitor de mp3.
Respirei fundo. Afinal a minha mãe enganou-se: continuo Senhora da minha desarrumação!
[Tudo ao som do senhor Bowie, a quem estou decidida a descobrir. Talvez esta fosse uma banda sonora mais adequada a uma qualquer actividade mais sensual mas é fim de semana e o caos tomou conta do espaço:) ]
agosto 11, 2005
Pois a minha vidinha nos últimos tempos não variou assim muito, não deu nenhuma cambalhota (ainda bem, acrescentaria eu) mas estava 'presa' em Lisboa. Primeiro, porque queria ir à praia com o D., depois chegaram os meus pais e 'tive' que ficar e depois mais um fim de semana... Já nem sabia o que era conduzir durante duas horas seguidas e chegar cá e as noite serem iguaizinhas ao que eram há muito tempo. Hum.
O tempo não se decide. Tão depressa estão 42 graus como 25 e uma pessoa assim fica confusa, adormece destapadinha e depois a meio da noite, de olhos fechados, lixada por estar com frio, desfaz a cama toda e procura ficar quente. Mesmo eu, que sou adepta incondicional do Verão, acho que já estou (secretamente) a desejar aquele Outono fresco e cinzento (sim Pollie, esse Agosto de Berlim já dava jeito cá...), que convida a ficar em casa. E depois toda a gente saber que é uma tremenda chatice ter o país todo a arder e os velhos todos a sofrer de hipertermia e, chatice das chatices, ter todo o país a discutir, pela enésima vez, de quem é afinal a culpa. E depois, de repente, em pleno Julho, começa-me a chover. Fico desorientada.
Vi uns quantos filmes neste tempo todo (viva o cartão King!) mas nem todos dignos de nota, ou pelo menos, de nota positiva. Vi a 'Guerra dos Mundos', um filme que me assustou muito porque já perdi a conta às vezes que sonhei com o fim da Terra como a conhecemos. Não foi preciso sangue, nem um espírito maligno, só destruição da boa. Depois também vi o 'Sinais Vermelhos', aclamado por muito boa gente mas que não me agarrou nem um bocadinho. A história do preso a monte enfiada na relação dos protagonistas só para lhes salvar a relação foi um bocadinho demais para mim. Vi o 'Nine Songs' que, pornografia à parte, é uma valente bosta. Fui vê-lo numa sessão especial, com direito a debate no fim: um João Lopes (crítico de cinema) certo mas secante, um Pedro Mexia (escritor) a acabar com a seriedade que se podia esperar do debate e uma sexóloga (!) brasileira (!!) que estava completamente deslocada e cujas opiniões podiam ter sido lidas num qualquer número da Ragazza. Em resumo, um filme muito mau que não merecia metade da importância que lhe dão. O último que vi foi o 'Orlando Vargas', filme com uma fotografia bestial e cenários deslumbrantes mas que me fez sair da sala e perguntar 'Mas que raio queria o realizador demonstrar/contar/filmar?'. Tive pena.
E depois recebi o primeiro ordenado (ou parte dele...) e fiz-me de consumista e enfiei-me no Atrium Saldanha, na Birkomania e comprei mais uns Birkenstock. Pronto.
julho 14, 2005
Aproveitando a onda religiosa, fica aqui a religião por mim fundada. Visto aqui, cortesia do meu amigo Henry (ler em francês sff) e gerado aqui.
O Novo Testamento segundo Marisa
Para grande surpresa de seu marido, a Virgem Tatiana estava grávida. Felizmente, um anjo explicou para Virgem Tatiana que seu filho era Daniel Cristo, Senhor do mundo, o glorioso Irmão de Deus (e Estudante nas horas vagas). No dia de seu nascimento, os anjos ordenaram que os pastores seguissem o brilho da Esmeralda para encontrá-lo. Além disso, três Sagazes Cachalotes vieram trazendo valiosos presentes: Relógios e Chinelos. Passado algum tempo, sucedeu que Daniel Cristo foi batizado, sendo submergido em Cerveja. Então proferiu o sermão da Lisboa. No sermão da Lisboa, Daniel Cristo ensinou: Bem-aventurados os Atentos, pois eles serão os Honestos; Bem-aventurados são os Preserverantes, pois deles será o Reino dos Céus. Daniel Cristo também fez muitos milagres, como quando transformou Livro em Caneca durante o casamento de um amigo; também fez um Eficaz recuperar-se com uma simples palavra. Infelizmente, os governantes ficaram muito bravos com a influência de Daniel Cristo, e então Ouviram e Caminharam e Sentaram Daniel Cristo, que apenas disse: perdoai-os, eles não sabem o que fazem. Mas algum dia ele retornará em glória e magnificência para o julgamento final, então prepare-se! Daniel Cristo retornará. O fim está próximo. Hah.
O Novo Testamento segundo Marisa
Para grande surpresa de seu marido, a Virgem Tatiana estava grávida. Felizmente, um anjo explicou para Virgem Tatiana que seu filho era Daniel Cristo, Senhor do mundo, o glorioso Irmão de Deus (e Estudante nas horas vagas). No dia de seu nascimento, os anjos ordenaram que os pastores seguissem o brilho da Esmeralda para encontrá-lo. Além disso, três Sagazes Cachalotes vieram trazendo valiosos presentes: Relógios e Chinelos. Passado algum tempo, sucedeu que Daniel Cristo foi batizado, sendo submergido em Cerveja. Então proferiu o sermão da Lisboa. No sermão da Lisboa, Daniel Cristo ensinou: Bem-aventurados os Atentos, pois eles serão os Honestos; Bem-aventurados são os Preserverantes, pois deles será o Reino dos Céus. Daniel Cristo também fez muitos milagres, como quando transformou Livro em Caneca durante o casamento de um amigo; também fez um Eficaz recuperar-se com uma simples palavra. Infelizmente, os governantes ficaram muito bravos com a influência de Daniel Cristo, e então Ouviram e Caminharam e Sentaram Daniel Cristo, que apenas disse: perdoai-os, eles não sabem o que fazem. Mas algum dia ele retornará em glória e magnificência para o julgamento final, então prepare-se! Daniel Cristo retornará. O fim está próximo. Hah.
[Num dos aborrecidos e irritantes programas da manhã da televisão portuguesa]
Jorge-Gabriel-wanna-be: Sr. Padre porque é que a Igreja esconde tanto os exorcismos?
Sr. Padre-ainda-na-Idade-Média: Olhe sei lá. Isso tem que perguntar a ela.
Jorge-Gabriel-wanna-be: Sr. Padre porque é que a Igreja esconde tanto os exorcismos?
Sr. Padre-ainda-na-Idade-Média: Olhe sei lá. Isso tem que perguntar a ela.
Hum. E eu a pensar que o Sr. Padre era justamente um representante dessa tipa.
Ah. Quase me esquecia. Mulheres grávidas e/ou menstruadas não devem pisar cemitérios ou acompanhar funerais. Estão vulneráveis e com "espaços vazios que podem ser preenchidos pelo Demónio". As coisas que uma pessoa aprende nos programas da manhã...
[Depois admiram-se quando as pessoas preferem largar superstições e fenómenos ocultos que só enegrecem ainda mais a ideia de pecado, já absurda em si mesma, e se dedicam antes a viver com prazer, liberdade e a controlar o seu próprio destino. Bah]
Ah. Quase me esquecia. Mulheres grávidas e/ou menstruadas não devem pisar cemitérios ou acompanhar funerais. Estão vulneráveis e com "espaços vazios que podem ser preenchidos pelo Demónio". As coisas que uma pessoa aprende nos programas da manhã...
[Depois admiram-se quando as pessoas preferem largar superstições e fenómenos ocultos que só enegrecem ainda mais a ideia de pecado, já absurda em si mesma, e se dedicam antes a viver com prazer, liberdade e a controlar o seu próprio destino. Bah]
julho 08, 2005
O meu almoço nos dias de trabalho, mais que ser importante pelo reconforto do estômago, é um momento privilegiado para desligar-me das obrigações. Por isso, levo o tupperware, sento-me assim
debaixo da árvores num parque cheio de imigrantes ilegais, velhos prevertidos e marginais(ok, talvez não seja assim tão mau). Escolho o banco menos sujo pela praga nojenta que são os pombos da cidade, como a minha refeição frugal e atiro-me ao livro do momento
Quando venho a casa e quero descansar de miúdos mal educados e irritantes; velhos que não sabem para onde estão a ligar; pessoas insatisfeitas; pessoas arrogantes; pessoas com razão; pessoas que não têm mais nada para fazer e chateiam os outros; pessoas solitárias; pessoas que eu não compreendo - Pessoas no geral - , banho-me aqui
Depois, é só estender-me na toalha, fechar os olhos ou olhar longamente os aviões que cruzam o céu incrivelmente azul. Imagino as pessoas que vão lá dentro, a comerem coisas embaladas e sem sabor, a olharem cá para baixo ou a combaterem o medo de voar. Os meus preferidos são os aviões que não deixam rasto. Mas os olhos fechados, só a gozar o momento, não me deixam olhar muitas vezes os aviões. Escondo a cara do Sol e fico ali a fingir que já não há mais Pessoas a precisar de mim.
julho 07, 2005
Pela quarta vez em 8 anos, mudei de casa em Lisboa. E agora mudei para onde nunca me imaginei a morar: sou menina de Telheiras, agora. O meu coração estará para sempre ligado à zona de Arroios e dos Sapadores, zonas que não são apreciadas por muita gente. Diz-se que são zonas escuras, sujas, pobres mas talvez sejam apenas mais reais. Mesmo a rebentar pelas costuras com os imigrantes que aparecem de todo o lado, aqui há lojas com fruta verdadeira, cafés bem tirados e esplanadas com caracóis dos bons. A zona que circunda a minha nova casa tem pastelarias mais finas, hipermercados e, desgraça das desgraças, o estádio do Sporting quase sempre no horizonte.
É claro que posso alegar que a casa é mais barata. E que, finalmente, moro numa vivenda (horrível mas vivenda). E que até tenho um super ginásio quase à porta. Mas este mundo é muito menos habitado que a Morais Soares. As pessoas moram aqui mas não estenderam aqui as suas raízes, só aqui estão porque há espaços verdes e as crianças podem andar no ballet e no inglês e na informática e porque o eixo Norte-Sul passa aqui ao lado. Quem nasceu verdadeiramente em Telheiras deve ter hoje 15 ou 16 anos, cabelo irritante a cair sobre a testa e gostar de frequentar essa epidemia chama Cup&Cino (ou lá como se escreve o nome desta cópia portuguesa do Starbucks). Mas não vou lutar contra isto tudo. Já lá estou, quero continuar a estar, vou só deixar que tudo me passe ao lado.
Outro mal das mudanças é que temos que agarrar (quase literalmente) na nossa vida e levá-la para outro lado. E quem, como eu, já está fora de casa há oito anos sabe como é difícil carregar toda a tralha que se junta numa casa, em duas casas, três casas... A fase de escolha do que se vai levar é sempre penosa: enchem-se sacos com roupa que já não nos serve, amarrotam-se bilhetes de cinema que não se sabe muito bem porque foram guardados, esvaziam-se gavetas empenadas com inutilidades. Depois é preciso contar com a ajuda masculina (que, além da força, oferece também aquela magnífica capacidade de se saber exactamente como devemos arrumar coisas na mala de um carro), com mais mulheres dispostas a limpar o rasto de destruição que vai ficando (porque uma mudança é um ataque terrorista a um pedaço de via que já estava a ser edificado) e uma certa capacidade de lidar com o Novo. Finalmente, recomenda-se uma boa capacidade de ignorar, com elegância e convicção, os momentos bons que se passaram na casa que vamos deixar (para não rebetarmos em lágrimas inúteis) e esperar apenas pelo bom que a nova morada pode trazer. E como quando saio de casa todos os dias o que vejo é isto, sei que vai de certeza ficar tudo bem.
É claro que posso alegar que a casa é mais barata. E que, finalmente, moro numa vivenda (horrível mas vivenda). E que até tenho um super ginásio quase à porta. Mas este mundo é muito menos habitado que a Morais Soares. As pessoas moram aqui mas não estenderam aqui as suas raízes, só aqui estão porque há espaços verdes e as crianças podem andar no ballet e no inglês e na informática e porque o eixo Norte-Sul passa aqui ao lado. Quem nasceu verdadeiramente em Telheiras deve ter hoje 15 ou 16 anos, cabelo irritante a cair sobre a testa e gostar de frequentar essa epidemia chama Cup&Cino (ou lá como se escreve o nome desta cópia portuguesa do Starbucks). Mas não vou lutar contra isto tudo. Já lá estou, quero continuar a estar, vou só deixar que tudo me passe ao lado.
Outro mal das mudanças é que temos que agarrar (quase literalmente) na nossa vida e levá-la para outro lado. E quem, como eu, já está fora de casa há oito anos sabe como é difícil carregar toda a tralha que se junta numa casa, em duas casas, três casas... A fase de escolha do que se vai levar é sempre penosa: enchem-se sacos com roupa que já não nos serve, amarrotam-se bilhetes de cinema que não se sabe muito bem porque foram guardados, esvaziam-se gavetas empenadas com inutilidades. Depois é preciso contar com a ajuda masculina (que, além da força, oferece também aquela magnífica capacidade de se saber exactamente como devemos arrumar coisas na mala de um carro), com mais mulheres dispostas a limpar o rasto de destruição que vai ficando (porque uma mudança é um ataque terrorista a um pedaço de via que já estava a ser edificado) e uma certa capacidade de lidar com o Novo. Finalmente, recomenda-se uma boa capacidade de ignorar, com elegância e convicção, os momentos bons que se passaram na casa que vamos deixar (para não rebetarmos em lágrimas inúteis) e esperar apenas pelo bom que a nova morada pode trazer. E como quando saio de casa todos os dias o que vejo é isto, sei que vai de certeza ficar tudo bem.
(Obrigada D.)
junho 25, 2005
Pela primeira vez em muitos anos, levantei-me cedo (não necessariamente por obrigação, mas especialmente porque perdi a capacidade para dormir até tarde) e fui à piscina com o meu pai. Já gozaram comigo, dizendo que me tornei numa menina exemplar. Mas não. Além do bilhete de borla, a boleia e a protecção (mesmo sendo desnecessária), esta manhã trouxe-me de volta algumas recordações. Eram coisas que odiava na altura e de que, mesmo passados muitos anos, não sei ainda se gosto. Estranhamente, o acto de recordar foi bom.
[...]Há muitos anos, as manhãs de Domingo estavam reservadas à ida familiar à piscina. Os meus pais ainda se divertiam com isso, a minha mãe preparava o lanche e íamos os quatro queimar os pés naquele pavimento que se transformava em fogo a partir das 11 da manhã. Não sei exactamente o que fazíamos lá mas sei que era divertido. A pior parte vinha depois. A hora do almoço dizia que tínhamos que voltar para casa e assistir ao Grande Prémio de Fórmula 1 da praxe. Isso era uma das coisas que estragava todo o fim de semana. Ainda hoje detesto a sensação de me deitar para a sesta, enquanto ouvia o barulho dos carros, em voltas aborrecidíssimas a um circuito fechado. Depois da sesta vinha a outra parte má: passear de carro, enquanto o meu pai ouvia os relatos de futebol do fim de semana. Parávamos em miradouros e abríamos as portas, para deixar escapar o tédio. Parece-me incoerente mas tenho saudades de uma coisa que sempre odiei [...]
Era cedo mas já estavam dois ou três madrugadores dentro de água, hoje. Pela primeira vez, naquela piscina, estendi a toalha numa espreguiçadeira e senti-me como uma turista num hotel de 5 estrelas. A água estava óptima, o sol estava indeciso. Chegaram os habituais miúdos, que jogam ao imita o dia todo e nunca se cansam. Eu só nadava, para trás e para a frente. O meu pai falava com velhos conhecidos, sobre o passado (claro!) e sobre o ano em que foi campeão de andebol (pensei 'O que mais não sei sobre ti, pai?'). Voltámos para casa, a hora do almoço tinha chegado depressa.
Eu sei que é um grandessíssimo cliché mas odeio a forma como todos temos que ser magros para ser bonitos. Mais do que nunca, tenho ouvido 'Tás gorda!' ou, na variante avós, 'Tás mais forte', o que é igualmente mau. Eu não comento o peso de uma pessoa quando falo com ela ou quando a encontro depois de muito tempo sem a ver. Eu posso saber que ela engordou/emagreceu mas isso é importante? Não, a não ser que seja um problema de saúde.
Será que as pessoas compreendem que não me estão a dar uma informação de última hora? Eu tenho espelhos, olho-me neles todos os dias, várias vezes por dia. Eu conheço o meu corpo e reconheço-lhe as fraquezas. Não preciso que me digam 'Tás gorda!' [ler num tom de quem tem pena de nós] como se estivesse com algum problema insolúvel ou realmente preocupante. Eu sei como o assunto é patético mas canso-me de pessoas sem nada para me dizer porque isso as obriga a comentar coisas que não lhes dizem respeito. Gostava mais que me dissessem 'Tás com um aspecto feliz!' ou 'Parece que estás de bem com a vida!' porque, ao menos assim, provavam que vêm para além de um bocado de carne.
junho 18, 2005
Entrei dentro do carro, já a sofrer por antecipação. Ao fundo da rua, há uma cratera imensa no asfalto guardada por polícias e bombeiros, todos param a ver (estas coisas lembram-me sempre do dia em que o mundo vai acabar). A tortura começa cedo, as calças colam-se às minhas pernas, sinto-me como se estivesse numa sauna finlandesa. Carros e mais carros por todo o lado e eu amaldiçoei-os a todos mais uma vez, a pensar 'Porque não tenho a estrada só para mim?', a tentar inventar uma lei que só me permita a mim usar as estradas. Já tenho a ponte nas costas e começa o pesadelo dos camiões mas só até àquele cruzamento onde comprei a rifa aos bombeiros na outra vez. Depois disso é recta atrás de recta, são buracos que nunca vão ser alcatroados, aldeias que são duas casas à beira da estrada. Quanto mais me aventuro no interior, mais quente é o bafo fora do carro (e dentro do carro e em toda a parte, na verdade, não há fuga possível ao calor). Já não há ninguém nas estradas, só há searas queimadas, velhos que se sentam nos bancos à espera que o calor vá embora mas só até amanhã que esta gente não sabe viver de outra maneira. A minha viagem é comovente, juro que é: dói ver como toda esta parte da terra vai sendo abandonada aos poucos - porque o calor é muito e o trabalho é pouco- e penso, de repente, como ia ser se um dia ninguém mais vivesse aqui? Não quero imaginar porque esta terra é minha. Quero-a, senão verde, pelo menos com gente que teima em ficar. Olho para trás, só vejo deserto
com árvores, mas é deserto, não se enganem. Não há nada que cresça ali, nada que se coma ou que valha a pena. Sobram os sobreiros mas já nem eles conseguem acalmar o calor. Há bichos mortos na estrada (já não tinham vontade de viver no desterro, no calor insuportável, numa terra que fica sozinha aos poucos?) e há velhas sentadas nos degraus, vestidas de preto, com o olhar perdido nas paredes caiadas do outro lado da estrada, perdido naquilo que um dia foi e não volta nunca, nunca atrás. A lembrar o tempo em que podiam trabalhar e ir lavar a roupa ao tanque e a pensar como lentamente ficaram sozinhas na terra, benditas as nossas vizinhas! Depois chego àquela recta interminável, 15 kms de recta, 15 kms sempre, sempre em frente, 15 kms em que me canso realmente de conduzir. Já vai a hora avançada, sei que em casa já não há ninguém e eu ainda estou dentro do carro. A lutar para não me sentir imunda, coberta de suor, a tentar por a cabeça de fora e sentir a brisa... A brisa? Fora da janela, a minha cabeça está dentro dum forno, o ar é denso, quase que o podemos agarrar. Eu quero fazer esta viagem sempre mas não a quero fazer nunca mais. Dentro do carro, sei que as minhas raízes estão aqui, que nunca lhes vou conseguir escapar, que vou voltar sempre ao mesmo sítio, mesmo que para isso tenha que desafiar todas as regras da higiene. Eu gosto de ser desta terra tão pouco fértil, onde pastam as vacas mas só durante poucas horas porque o calor não as deixa mexer. Não posso renegar a minha origem, eu SOU esta terra. Muito mais quando ela me recebe assim
A insuportável melancolia de ser alentejana
Aqui está uma lembrança da noite de Sto.António. Uma noite de ruas sobrelotadas, bifanas comidas à pressa e cerveja a preços oportunistas. Ainda assim, eram os Santos em Lisboa. Para matar algumas saudades à Polliejean :)
junho 12, 2005
junho 11, 2005
Há mitos sobre as mulheres nos quais não me revejo minimamente, como as tardes a fazer compras até à exaustão ou essa mania assustadora da arrumação. Mas há coisas (de mulheres, ora) que sabem bem esporadicamente. Por isso, pus a minha irmã a trabalhar e recriámos uma autêntica sessão de manicura em casa, com direito a muita conversa e, especialmente, a muita gargalhada. O resultado foi este
[Hoje é a festa de anos do Francisco, o pequeno ex-vizinho do lado. Faz hoje (aproximadamente) dois anos e três meses que descobrimos que ele vinha aí. Foi um anúncio tardio e mal recebido porque as circunstâncias não o faziam esperar. Depois de muita lágrima derramada, muita amargura mal disfarçada e um conformismo tardio nasceu este Francisco de olhos grandes, do tamanho da ternura que despertava em nós. Mesmo sem um homem a quem possa chamar Pai, ele é feliz. Porque é um bebé saudável mas, principalmente, porque só tem à sua volta gente que o ama profundamente. Parabéns Franchicola! As fotos seguem dentro de momentos.]
junho 10, 2005
É verdade que podia aqui escrever sobre tanta tanta coisa esta semana: das saudades que tinha de uma noite de Verão realmente quente; do post que longamente tinha preparado em Lisboa sobre um assunto nem por isso interessante; sobre mais uma incursão minha no fantástico mundo do trabalho, que me vai arredar das praias e dessas coisas chamadas férias; do frustrante que é ir a uma Feira do livro e sair de lá só com dois livros de cozinha (quem inventou tantos expositores devia ser castigado); de como há amigos sempre iguais; de como há amigos sempre diferentes; das notas que me fazem inchar de orgulho; da experiência louca e pegajosa que é conduzir durante três horas neste Verão (semi) antecipado; da fuga de mais uma amigo para algures na Europa (quem vai e regressa pensa sempre em voltar...); da festa de anos do meu amiguinho Francisco, a quem já comprei um livro para colorir e um conjunto de canetas (a mãe a avó não vão achar muita piada mas enfim...); da vontade constante de praia; dos albuns que quero tanto ouvir; nas saudades, sempre. Mas não. Vou é escrever qualquer coisinha sobre os Media em Portugal no século XX :S
maio 29, 2005
[Sim o Benfica não fez a dobradinha... Não posso festejar e escrever muito sobre o futebol. Paciência.]
Por mero acaso, encontrei no Soulseek um utilizador (provavelmente alemão) cheio de música alemã (pois então!) e dei por mim a sacar alguns 'sucessos' que costumava ouvir quando vivia em Berlim. Os que ainda aí estão podem confirmar como são músicas sem grande interesse, ainda assim bastante populares entre os alemães (estavam a toda a hora, pelo menos na tv). Mas conseguiram apertar o meu coração, espremê-lo, fazê-lo chorar quase porque me fizeram lembrar de tudo aquilo de que tenho saudades. Desde que tenho as músicas comigo não consigo deixar de as ouvir - como se pudesse fingir que ainda estou lá.
Sou só eu a ser sentimental ou a cidade é mesmo especial? Será que toda a gente que vive no estrangeiro cria laços fortes com a cidade que escolhe? Eu sei que, quanto mais tempo passa, mais eu tenho pena de não ter podido ficar. Quem me dera que a minha (nossa) vida pudesse ter sido outra...
(um pedacinho de 'casa', daqui)
As festas no barco Hoppetosse em Treptow, entrando de rompante sem pagar. Aquela loja de Obst, Gemüse e Getränke. Os metros sempre a horas. A paisagem industrial da Warschauer Strasse (Pollie :]). O MediaMarkt em Neukölln. Os Alkis à porta do Kaisers. Os cruzeiros no Spree. Precisar de uma lavandaria. A televisão avariada durante tantos meses. A 'nossa' cama. A primeira noite no Privat Club. A Fernsehturm, para onde quer que olhássemos. A neve na 'minha' cidade. O Natal na Friedrichstrasse. Os legumes nos turcos. Os telefonemas para casa. As pessoas que nunca cheguei a conhecer. As saudades de casa. As saudades de Berlim. A cerveja portuguesa no Ecka.O Café San Remo. A Oberbaumbrücke. O mundo todo à minha (nossa) espera.
[Die Fantastichen Vier - Somerregen]
[e outras]
maio 28, 2005
maio 27, 2005
As viagens
Hoje vinha no carro, para mais uma visita semanal a casa, e percebi como conduzir é um momento priveligiado para deixar os pensamentos avançar, impiedosos e desordenados. Dei comigo a pensar:
- que os cheiros são veículos de transporte para outros anos e outros sítios. Já repararam como é bom o cheiro a urzes, giestas, eucaliptos e pinheiros? Da mesma forma, lembrei-me de como os cheiros podem ser nauseabundos e obrigar-me a fazer caretas durante longos quilómetros (se têm algum amor às vossas narinas, evitem a todo o custo a zona que circunda Alcochete e Coruche);
- na impossibilidade de um dia alguém me oferecer um ramo das minhas flores preferidas, as papoilas. Tanta flor bonita que uma mulher pode escolher e eu havia logo de escolher uma que murcha assim que é colhida...;
- que, se este ano vou sentir falta da praia com os amigos (e consequentemente dos festivais de Verão), ir à praia contigo e estar deitada contigo na areia vai ser um dos pontos altos do meu Verão;
- nas (que vão ser as minha últimas) férias grandes. Devia envergonhar-me por ainda ter férias grandes, porque os meninos e meninas da minha idade têm (normalmente) mais juízo que eu mas a verdade é que ainda as vou gozar uma última vez. Logo agora, que planeio passar o Verão a trabalhar... (a ironia disto tudo);
- que o meu coração está estacionado em Mora, a meio caminho de tudo. Só assim posso estar perto de casa e ao mesmo tempo perto de ti...
(E digam lá se há melhor maneira de chegar a casa do que abrir o frigorífico e achar uma grande tigela de salada de polvo... É mais uma coisa boa de Portugal que a Pollie podia acrescentar à sua lista.)
maio 24, 2005
maio 14, 2005
É realmente incrível o que uma pessoa consegue inventar para não se entregar aos deveres, às coisas realmente importantes. Tenho as folhinhas que devia estar a decorar à minha frente mas de repente achei que poderia haver coisas mais urgentes ainda para fazer. Usei as desculpas de que já trabalhei hoje e já adiantei umas coisas e afinal a frequência é só na quinta e consegui manter-me sentada, frente ao ecran, a magicar, a inventar. Mas não me saiu nada de estonteante ou de realmente diferente. Só depois de estar a inventariar os mp3s novos é que me ocorreu que podia falar da minha música nova.
Então, o suplemento musical do Borboletas na Barriga 'Música com Borboletas' recomenda três rodelinhas para os vossos discmans (perdoem os que já andam à frente do seu tempo e já estão fartos de ouvir isto e acham que eu devia estar a fazer outra coisa realmente importante com o meu tempo).
Então, o suplemento musical do Borboletas na Barriga 'Música com Borboletas' recomenda três rodelinhas para os vossos discmans (perdoem os que já andam à frente do seu tempo e já estão fartos de ouvir isto e acham que eu devia estar a fazer outra coisa realmente importante com o meu tempo).
The Headphones - The Headphones
Para quem gosta dos Postal Service, este é um projecto paralelo e, exactamente por isso, não partilha da mesma sonoridade etérea e feliz do grupo principal. Quem gosta e ainda não se fartou de um certo revivalismo dos anos 80, com aqueles teclados que foram fonte de grandes sucessos, este é um bom cd. Recomendado também para quem gosta de mergulhar na melancolia de vez em quando e ficar no quarto, a olhar para o tecto e a recuperar memórias.
Vitalic - Ok Cowboy
És jovem? Tens energia e não sabes o que fazer com ela? Gostas de dançar, mesmo que tenhas vergonha e só consigas fazê-lo fechado no teu quarto? Pois o Vitalic ajuda-te com isso. É rock electrónico e orgânico, na senda do que Soulwax ou LCD Soundsystem têm vindo a fazer. Assim que a música começa é impossível (pelo menos) não começar a marcar o ritmo.
Regina Spektor - 11:11
É uma Fiona Apple mais potente e mais jazzy. É uma Norah Jones menos enjoativa, com a sua doçura e cara de boneca mas com muito mais tomates. É uma Meredith Brooks na garra com que agita as canções mas sem ser pindérica nem vocacionada a passar na Mega FM. Ela tem o estilo, voz e o aspecto e continua a ser um segredo bem guardado. Às vezes vale a pena esperar para descobrir coisas.
Na secção 'Discos velhos que eu vou ouvir sempre' resgatei
Weezer - Pinkerton
porque é bom lembrarmo-nos da adolescência (mesmo que os 14 anos sejam, definitivamente, a idade mais parva do mundo), porque 'El Scorcho' é uma música que absolutamente delirante e porque canto todas as músicas de cor.
Continuo a dizer que os sábados são mesmo bons (mesmo estando longe...). Apesar da pilha dos trabalhos se acumular, há carapaus fritos com migas de couve-flor ao almoço, um café com o meu Franchicola, sossego em casa, música nova a entrar no meu computador e, especialmente hoje, a possibilidade do meu Benfica (Benfiquinha para as manas!) voltar a ser campeão. E depois ainda dizem que a vida é uma chatice.. Pfff.
maio 13, 2005
Estou prestes a ficar mentalmente exausta. Depois de escrever um Referat para Alemão e fazer a (primeira) respectiva apresentação oral, acabei agora um trabalho sobre a Rádio durante o governo de Marcelo Caetano. Eu pensava que podia respirar mas não: há mais uma Aufsatz à cadeira de Alemão VIII e um teste em Alemão VII na segunda; uma oral na terça; uma apresentação do trabalho da Rádio na quarta; uma frequência de Teorias do Drama e do Espectáculo na quinta... AHAhhhhhhhhhhhhhhhhhhaaaaaaaaaaaa! Alguém me acorde quando já estivermos no próximo fim de semana... (em que também não vou poder descansar porque o irmão do D. casa no sábado. Há semanas verdadeiramente de cão :( )
maio 07, 2005
A minha grande grande amiga Teresa queimou as suas fitas hoje. Ressacada de uma semana de festejos académicos, dizia que não queria ver a cama com medo de lá ficar. Eu não ligo nada a estas coisas de trajes e fitas mas consigo perceber o orgulho que se sente quando se chega a este dia. Infelizmente para os meus pais estas tradições não me dizem nada... Mas não era isto que queria dizer - só queria dizer que gosto muito dela e que me sinto orgulhosa, mesmo não compreendendo como se anda de capote num dia quente de Maio.
(E salta Têtê e salta Têtê olé olé!)
abril 29, 2005
Exactamente para comemorar o dia da Liberdade, uma equipa de 7 valiosos elementos concorreu, uma vez mais, nos Jogos de Abril. Desta vez, conseguimos um lugar no pódio (o 2º!) e um fim de semana numa paragem à nossa escolha. Correndo o risco de me poder alongar de mais sobre o assunto, ficam só os bons momentos que escolhi.
A Prova
O Cenário
A Equipa
A Simbologia
O Aperto
O Resultado
A Vitória
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