Cinco miúdos, com não mais que quinze anos, rodeiam um senhor barbudo e de muletas que soluça encostado a uma parede, como se estivesse perdido. Parecem tentar consolá-lo, ajudá-lo, mantê-lo calmo mas ele continua encolhido. Trabalhadores da construção civil descem a avenida aos três e quatro de cada vez, cheirando ao sabonete que deixaram para trás, trancado num cacifo. Têm pressa para voltar a casa, talvez porque querem ver futebol ou porque marcaram uma cerveja às sete e um quarto. Nas mãos, trazem as marmitas vazias que todas as manhãs passam para as mãos das mulheres e que despejam a meio do dia sem sequer pensar. Bandos de meninas do liceu Pedro Nunes espalham-se pelo passeio, divididas entre o cigarro furtivo e os auriculares que teimam em cair. São imagens decalcadas de um modelo primordial, cedendo à pressão de pertencerem a algum grupo, ansiosas por crescer em tempo recorde. A meio da avenida, uma galeria subsiste e com ela uma rapariga que parece ter sempre frio, rodeada por todos aqueles quadros e todos os dias vidrada no computador. Os meninos que saem do liceu sentam-se num café, dividem garrafas de cerveja, conspiram animadamente dentro das suas camisolas de rugby.
Passam vinte e dois minutos das seis e uma rapariga com o casaco abotoado até acima sobe apressadamente a avenida. Vai ouvindo uma bulería e tentando conter-se para não desatar a sapatear a cada dois segundos. É o segundo dia em que consegue sair do escritório de dia e o céu está limpo. Tem um texto para escrever mas já sabe há muito onde irá buscar a inspiração masculina. Os dias tocam-lhe apenas superficialmente, as noites servem-lhe (como deve ser) para sonhar.
Passam vinte e dois minutos das seis e uma rapariga com o casaco abotoado até acima sobe apressadamente a avenida. Vai ouvindo uma bulería e tentando conter-se para não desatar a sapatear a cada dois segundos. É o segundo dia em que consegue sair do escritório de dia e o céu está limpo. Tem um texto para escrever mas já sabe há muito onde irá buscar a inspiração masculina. Os dias tocam-lhe apenas superficialmente, as noites servem-lhe (como deve ser) para sonhar.
2 comentários:
Eu também tenho de me esforçar para não dançar ou gingar feita autista sempre que ando pela rua de phones nos ouvidos ... :)
Eu sou expert em fazer cenas tristes dessas...cantar com os phones, nao sonhar! :D
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